ESTA SEMANA NO
"DINHEIRO VIVO"
Expansão monetária. BCE prepara
as máquinas para imprimir moeda
Existe uma convicção crescente no interior do Banco Central
Europeu (BCE) de que a instituição tem hoje, mais que nunca na sua
história, razões e margem de manobra suficientes para avançar com a
bomba atómica.
Um programa de expansão monetária (quantitative
easing ou QE), como teve e ainda tem a Reserva Federal (Fed) dos
Estados Unidos, um programa de compras de portefólios de dívida e ativos
que possam estar a empatar os balanços dos bancos privados.
Objetivo:
desbloquear o fluxo normal de crédito na Europa, reativando o
financiamento às empresas mais pequenas, as que mais dependem dos canais
bancários. As grandes têm tido mais facilidade em fugir a estes
constrangimentos.
Foi o presidente do BCE, Mario Draghi, depois da reunião das taxas de juro deste mês
em Frankfurt, quem abordou frontalmente a questão. “No mês passado nós
[governadores] não discutimos explicitamente a expansão monetária”.
Mas
este mês, sim. “É algo sobre o qual teremos de refletir e pensar
arduamente. Sobre como desenhar a QE, considerando que o nosso quadro
institucional e financeiro é consideravelmente diferente do dos Estados
Unidos, por exemplo”.
De facto, nos EUA, o mercado de capitais
(bolsas, capitais de risco, autofinanciamento) funciona relativamente
bem; qualquer ação do banco central (Fed) tem impacto quase imediato e
certo nos preços dos ativos, nas taxas de juro de mercado.
Na Europa, região em que a atividade está amplamente assente no financiamento por crédito bancário, a questão é mais complexa.
Medidas
bombásticas como a QE arriscam a ser pouco eficazes, já que a
omnipresente banca pode apropriar-se do dinheiro barato para outros fins
(como reestruturar capital) e não fazer o que é suposto: emprestar na
devida proporção às empresas.
“O programa tem de ser
cuidadosamente desenhado de modo a ter este elemento [economia baseada
em bancos] em conta”, admitiu Draghi.
Nos EUA, as três rondas de
QE conseguiram ajudar a reanimar a economia, deixada de rastos pelo
colapso financeiro e bancário de 2007/2008 que se propagou rapidamente
às empresas e às famílias.
Basicamente, a Fed avançou com um
programa de compras de ativos avaliado, em média, em 61 mil milhões de
euros por mês durante estes anos. Só no início de 2014 começou a retirar
este estímulo.
Como funciona a QE? O banco central compra aos
bancos grandes quantidades de ativos (obrigações do Tesouro, obrigações
privadas, carteiras de hipotecas e dívidas de empresas aos bancos),
tendencialmente os de maturidades mais longas de maneira a libertar
durante “anos” os balanços bancários.
Esses fundos entram na banca
(o banco central não esteriliza, ou seja, não seca esse dinheiro em
excesso através de outros instrumentos), esperando-se que passem depois
para a economia real através dos canais de crédito.
É por isso que se fala em máquina de imprimir dinheiro. É o que faz um banco central, no fundo.
E
quanto mais dinheiro estiver a circular, menor o seu custo. A taxa de
juro de referência do BCE está em 0,25%; a QE é uma forma de baixar as
taxas de mercado sem mexer naquele referencial. É uma medida
não-convencional.
O problema ou dilema com o qual se defronta hoje
o BCE é que terá de desenhar um programa que esteja de acordo com o seu
mandato.
Não pode financiar governos, não pode privilegiar uma
economia em detrimento de outra. Tem de ser uma medida transversal,
universal, desenhada de tal forma que atinja o objetivo: oxigenar os
balanços dos bancos em nome do financiamento da atividade real, não dos
acionistas. Para estes existem os programas de recapitalização ou outras
facilidades.
Atualmente, os países que mais precisarão da QE são
Itália, Espanha, França e Portugal. Mas quando a QE nascer, tem de ser
para todos.
As informações recolhidas pelo Dinheiro Vivo junto do
BCE indicam que hoje há margem de manobra e vontade de medidas audazes. A
QE gera inflação, mas isso não é um problema (pelo contrário).
Os
preços da zona euro estão praticamente estagnados, a inflação foi de
0,5% em Março, a deflação é o maior medo. A meta do BCE implica manter a
inflação “próxima, mas abaixo de 2%”.
Para além disso, os
governadores têm dados convincentes de que o balanço do Eurosistema (BCE
mais bancos centrais do euro) pode engordar. Entre os quatro maiores
bancos centrais do mundo, o Eurosistema foi o que menos inflacionou o
balanço desde o início de 2007 – apenas duplicou. A Reserva Federal está
cinco vezes maior, por exemplo.
Mais: esse balanço, que engordou
muito até meados de 2012 com várias medidas não convencionais lançadas
pelo BCE (empréstimos especiais aos bancos e compras de ativos), tem
vindo a esvaziar-se já que os bancos estão a devolver o dinheiro das
medidas especiais.
* Bomba atómica é a notícia, o efeito é duma bomba de neutrões.
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