HOJE NO
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Malditas alergias.
O que precisa de saber para
sobreviver à Primavera
Os pólenes estão aí. Mesmo que nos próximos dias acalmem com a chuva, se sofreu no passado não se limite a tomar anti-histamínicos. Mais vale prevenir e ir ao médico. Luís Delgado, presidente da Sociedade Portuguesa de Alergologia e Imunologia Clínica e médico no Hospital de S. João, e Susana Piedade, imunoalergologista da Cuf, respondem às dúvidas
Quais são as alergias mais comuns nesta altura do ano?
O problema da Primavera para quem tem alergias é ser o pico da
polinização na maioria das plantas mais alergénicas. Em Portugal as
principais causas de alergia a pólen são as gramíneas, fenos. Estas
começam a polinizar no início da Primavera e atingem o pico entre Maio e
Junho. Também é frequente a alergia à erva parietária, do grupo das
ervas daninhas e que tem um período de polinização que começa na
Primavera mas em alguns pontos do país repete no início do Outono. Em
relação aos pólenes das árvores, o mais alergénico é o da oliveira. Luís
Delgado explica que os do pinheiro, ao contrário do que pensam muitas
pessoas, são pólenes de maior dimensão e pouco alergénicos – os mais
prejudiciais são invisíveis. É o caso também dos pólenes amarelos que se
encontra em cima do carro, com os quais não se deve preocupar. “Apesar
de raramente causarem alergia, podem servir de aviso que a época de
polinização já começou.” Em algumas zonas de clima mais frio e seco, na
Primavera também é mais frequente a alergia aos ácaros, por que a
temperatura amena promove a sua replicação. Muitas vezes estas duas
alergias aparecem conjugadas nesta altura.
Como sei que estou a ter uma alergia?
A alergia aos
pólenes e aos ácaros do pó da casa pode ter três manifestações. Pode
afectar nariz e garganta e aí os sintomas mais comuns são a irritação,
pingo no nariz e espirros. É chamada rinite alérgica. Pode afectar os
olhos, com comichão e inflamação (conjuntivite alérgica). Pode ser
também causa de asma, quando se manifesta com pieira, dificuldade em
respirar e dor no peito. Muitas vezes surgem conjugadas. Susana Piedade
explica que os sintomas de uma alergia distinguem-se de os de uma
constipação porque, se não forem controlados, vão manter-se toda a época
de polinização. Além de autolimitados, numa constipação os sintomas são
homogéneos todo o dia e numa crise alérgica aumentam quando há maior
exposição ao alergénio, no caso dos pólenes quando a pessoa está na rua.
É importante saber a que tipo de pólen sou alérgico?
Sim. Por um lado, é essencial para planear o tratamento. Se uma pessoa
for alérgica a vários pólenes poderá precisar de uma prevenção mais
ampla que inclua vacina contra os alergénicos a que é sensível mas
também há comprimidos que funcionam como vacinas contra infecções
respiratórias, que são um factor de descompensação quando há uma crise.
Delgado sublinha também que pode ser importante para se planear viagens.
É que o período de polinização de uma planta pode não começar em todo o
país na mesma altura. “Nas férias da Páscoa uma pessoa de uma zona mais
a norte e chuvosa como Braga pode ainda não ter tido sintomas mas vai
para o Algarve e pode ter uma grande crise alérgica porque lá as
gramíneas começaram a polinizar mais cedo”, diz.
Como sei os níveis de polinização?
A Sociedade
Portuguesa de Alergologia e Imunologia Clínica publica todas as semanas
um boletim polínico detalhado por região. Pode ser consultado no site da
SPAIC ou pode subscrever a newsletter para receber a informação no
email.
Como funcionam as vacinas?
Podem ser injectáveis ou
de administração sublingual, em gotas ou comprimidos. Vão expor o
organismo ao pólen para aumentar o reconhecimento do mesmo e fazer com
que o sistema imunológico não tenha uma resposta anti-inflamatória
excessiva quando encontra o inimigo real. Não são indicadas em todas as
situações, apenas quando há prognósticos de alergia mais graves. Podem
também não ser indicadas a quem tem várias alergias. Devem feitas a
partir de Outubro/Novembro, para que o sistema imunitário consiga
tolerar melhor os alergénios na Primavera.
São comparticipadas?
Deixaram de ser, lamenta Luís
Delgado. Os preços da vacinação podem chegar a centenas de euros pois
tem de ser mantida por regra três anos para ter eficácia a longo prazo.
“Actualmente há alguns sistemas complementares e seguros que as
comparticipam mas têm um preço incomportável para muitas pessoas”, diz o
médico, que revela que a SPAIC tem insistido na importância deste
tratamento estar disponível por ser custo-eficaz. “Pode ser inicialmente
dispendioso mas reduz os custos com a medicação e o desconforto durante
as crises, que motivam quebras de produtividade na escola e no
trabalho.”
Já não vou a tempo de fazer a vacina. Vale a pena ir ao médico?
Mesmo que tome um anti-histamínico para aliviar os sintomas, se tem uma
suspeita de alergia deve ir ao médico. “A maioria das pessoas chega
muito tarde, já no fim da época quando além da congestão nasal
desenvolveu problemas respiratórios.” Se já teve más experiências no
passado, deve ir ao médico antes de os sintomas aparecerem. Os próximos
dias, com chuva e temperaturas mais baixas, são uma boa altura para
consultar um especialista para ter um plano de ataque. “Muitas pessoas
vão sentir menos sintomas e pensar ainda bem que ainda não começou. Se
não se prevenirem, daqui a três semanas estão aflitas.” Além de
anti--histamínicos, o plano pode incluir descongestionantes nasais e
medicação local anti-inflamatória que ajuda a controlar a alergia. Há
ainda outro argumento: se passar uma época com as alergias mal
controladas, provavelmente a próxima será pior. “Quando não é feito
tratamento, o corpo produz mais anticorpos que, no ano seguinte, vão
provocar uma resposta ainda mais forte. Se foi mau o ano passado e não
fez nada, este ano pode ser pior.”
Mas se já fui ao médico o ano passado, posso automedicar-me?
Os médicos aconselham uma consulta com um especialista uma vez por ano.
Mas se já tem um guia escrito para SOS, pode segui-lo a menos que os
sintomas agravem. Mesmo que lhe aconselhem um anti-histamínico, se tiver
sintomas persistentes deve consultar o médico pois pode não ser o
adequado e não garantir um controlo eficaz da doença.
Porque é que há dias particularmente difíceis?
Durante a época de polinização, as concentrações de pólen aumentam
sobretudo nos dias quentes, secos e ventosos. Há maior risco de
fragmentação dos pólenes, que pode fazer com que se depositem mais
facilmente nas vias respiratórias.
Viver na cidade é pior para quem tem alergias?
Parece um paradoxo porque há menos vegetação mas é verdade. Os pólenes
viajam muitos quilómetros e nas cidades encontram mais barreiras
arquitectónicas como prédios que fazem com que se depositem na estrada e
parapeitos, deixando as pessoas mais expostas. Luís Delgado e Susana
Piedade sublinham ainda que vários estudos têm mostrado que a poluição
torna alguns pólenes mais alergénicos para o ser humano e também
facilitam a sua entrada nas vias respiratórias. “Mesmo que não tenha
nenhuma planta à sua volta pode estar mais exposto do que quem tem”, diz
Delgado. É o caso, por exemplo, de habitações próximas de
auto-estradas.
Manter a casa arejada ajuda?
Por um lado é
importante por causa do pó da casa, alergénio frequente. Mas no que toca
aos pólenes é preciso cautela. “Como é um pau de dois gumes, o que
recomendamos é que na Primavera se abram as janelas mais ao final do
dia, quando os níveis de polinização são menores”, diz Luís Delgado.
O ar condicionado no trabalho é prejudicial para quem tem alergias?
O médico explica que a relação não é directa: não vai aumentar a
exposição a pólenes ou ácaros. O que acontece é que uma pessoa com uma
crise alérgica há alguns dias tem o aparelho respiratório inflamado o
que a vai tornar mais sensível a mudanças na temperatura ou mesmo a
cheiros, como o da zona das refeições ou o perfume de um colega. “Não
agrava a alergia, aumenta é a sensação de
desconforto.”
Dormir poucas horas piora as crises alérgicas?
Susana Piedade explica que existem indícios de que o stresse emocional
provocado por noites más dormidas ou por detrás da falta de sono pode
influenciar os processos inflamatórios, logo as alergias. Mas na maioria
das vezes o que acontece é que os sintomas de alergia, sobretudo a
congestão nasal, não deixam dormir. “Daí a importância do controlo da
doença e de uma medicação adequada”, sublinha. Tomar medicação para
dormir não é boa ideia, reforça Luís Delgado. “A pessoa tem dificuldades
respiratórias e não terá um bom descanso. Com medicação ainda ficará
mais desconfortável.”
Tomar banho à noite ajuda?
É uma das dicas dos
sites de saúde: chegar a casa ao final do dia e lavar o cabelo para os
pólenes saírem e não se depositarem na almofada. Os especialistas dizem
que não existe evidência disto funcionar e dizem que há dicas mais
certas para um lar confortável para um alérgico. “Em casa o principal
problema é o pó e os ácaros que nele existem. Devem lavar-se os lençóis
todas as semanas a mais de 60 graus, aspirar e usar capas protectoras no
colchão e almofadas.” A cama não deve ser logo feita de manhã, para
arejar um pouco. Mas também não é aconselhável que fique vários dias por
fazer.
Há alguma dieta que ajude a suportar melhor as alergias da primavera?
Não existe nenhum alimento específico aconselhável a quem tem estas
alergias mas Luís Delgado sublinha que alguns estudos têm demonstrado
que a dieta mediterrânica parece estar associada a menos alergias ou
mesmo a menor gravidade da asma do que a dieta ocidental típica, rica em
gordura e açúcar. “É um comportamento que parece prevenir a incidência e
gravidade, como está demonstrado também para as doenças
cardiovasculares. Mas não nos permite dizer que se comer muitas
azeitonas não as terá”, brinca.
Existe perigo em tomar anti-histamínicos com outros medicamentos?
O principal perigo é a mistura de anti-histamínicos sedativos com
substâncias que já comprometem a reacção, como álcool, antidepressivos
ou ansiolíticos. Os especialistas sublinham que este é mais um motivo
para não se automedicar mas reforçam que hoje já quase não se justifica a
toma de anti-histamínicos sedativos por haver novas gerações de
remédios sem esse efeito. Como saber se são sedativos? Se não tiver ido
ao médico, o primeiro passo aconselhado é perguntar na farmácia ou ler a
bula.
Existe relação entre alergias a alimentos e a pólenes?
Algumas pessoas com alergia a pólenes desenvolvem reacções a frutos
frescos com constituintes semelhantes – por exemplo a maçã ou pêra, diz
Piedade. Delgado reforça que também há casos destes de reacção a melão
ou banana e que por vezes só se manifestam na Primavera.
Fumar quando se está com uma crise alérgica é prejudicial?
Os médicos avisam que é sempre mau. Numa crise, a exposição ao fumo
afecta a actividade dos pulmões e também pode interferir com a acção dos
medicamentos, nomeadamente dos anti--inflamatórios usados em casos mais
persistentes e na asma, chamados de corticosteróides inalados. A
exposição ao fumo é particularmente nociva para as crianças.
E fazer exercício físico?
A actividade física
regular e moderada parece ajudar a prevenir respostas inflamatórias e
alergias. Na Primavera, para quem as tem, deve haver cuidados especiais.
Deve evitar-se correr de manhã e nos jardins urbanos. “Se houver essa
possibilidade, é preferível ir correr para junto do mar, marcar os jogos
de ténis e futebol para o final do dia ou em espaços fechados”, diz
Luís Delgado. Mesmo a escolha de uma esplanada para quem sofre de
alergias pode ditar se a tarde será bem passada. “É melhor zonas perto
da orla marítima do que ir para a baixa da cidade ou para o jardim.”
Há outros cuidados que possa ter?
Um dos mais
simples nestas alturas é usar óculos de sol. As plantas que
habitualmente causam alergia são as que polinizam pelo vento, sobretudo
as que libertam grãos microscópicos que muito provavelmente vão
cruzar-se consigo na rua e podem desencadear uma crise.
* Excelente informação
.
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