17/04/2015

ANA RITA GUERRA

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A experiência única 
de ir ao Coachella. 
Mas sem selfie stick

Nenhum Rock in Park, Beatpatrol ou NOS Alive pode preparar para o que é a experiência do Coachella, o mais importante festival de música - e arte - dos Estados Unidos.

É uma daquelas coisas que consta na lista de bolso de qualquer músico e fã de música. A reputação é merecida, porque o Coachella tem realmente um ambiente diferente, forjado pela geografia, preço e origem. A arte abunda, as mil cores encantam e encontra-se oficialmente a zona de refeições mais limpa e bonita do mundo dos festivais de música.

O Coachella é assim porque acontece no deserto, em Indio, sul da Califórnia. Fica em nenhures, portanto, não dá para apanhar o metro e dar lá um salto; é preciso planear com tempo e com dinheiro. Faz um calor infernal em Abril, o que explica a moda "sem t-shirt" nos homens e "calção-cinto" nas mulheres. Está a duas horas de carro de Los Angeles, o que justifica a aparição de tantas celebridades. Acontece num clube de polo, o que explica que seja tão verde e arrumadinho. Surgiu de um concerto dos Pearl Jam em 1993 e mantém essa vibração de rock, algo indie, apesar de o ecletismo permitir que toquem AC/DC, Cédric Gervais e Drake a uns metros uns dos outros. Cada bilhete custa qualquer coisa como 400 euros, o que ajuda a explicar tudo o resto.

É um festival entre o hipster e o hiper-moderno, cheio de celebridades, homens vestidos de néon, miúdas giras com flores na cabeça e universitários musculados apenas com a bandeira da fraternidade ao pescoço. Só se pode beber álcool em certas zonas, o que evita o cruzamento com bêbedos cambaleantes com uma mini na mão à procura da tenda electrónica. É também o único festival com uma lagarta colorida gigante a passear pelo recinto, uma instalação que no último dia se transforma em borboleta. E é o sítio onde os festivaleiros tiram mais fotos a si próprios que aos artistas e instalações de arte, porque de que é que serve ir ao Coachella se não houver provas substanciais da presença?

"Desliguem a m**da dos telemóveis", gritou Jack White, o irreverente cabeça de cartaz de Sábado, no início do seu concerto. Já tínhamos recebido essa informação na sala de imprensa -absolutamente nenhuma fotografia do ex-White Stripes. No dia seguinte, último da primeira parte do festival, St.Vincent fez o mesmo, menos o palavrão, pedindo aos festivaleiros que não cedessem à tentação de passar o concerto todo a tirar fotos.

A ideia é viver mais e fotografar menos, mas será mesmo esse o problema? Percorri largos quilómetros no recinto, onde couberam 92 mil pessoas por dia neste fim-de-semana, e vi mais processos de tiragem de selfie que qualquer praia portuguesa em Julho. O Instagram e o Twitter rebentaram com fotos e updates do festival, claro, porque é isso que se faz quando se vai ao Coachella. Mas não me pareceu que a obsessão digital alienasse os festivaleiros. Sim, em qualquer direcção era possível ver jovens adultos a bater nos ecrãs tácteis, a carregarem fotos e a falarem em chats do Facebook (desculpem, pessoas, mas o preço a pagar por usarem ecrãs gigantes é que qualquer um vê o que estão a fazer).

No entanto, faziam-no de forma integrada com a vivência física do festival. Esta geração sabe como cruzar a sua dependência tecnológica com as experiências do mundo real. Este fenómeno de que se fala de as redes sociais nos estarem a isolar é absolutamente discutível, pensei, ainda que exista um problema quando a reacção dos outros às "selfies" se torna mais importante que as ligações reais com pessoas próximas.

Dito isto, achei maravilhoso que a organização do festival tenha proibido os "selfie sticks", porque já basta a mania dos chapéus elaborados a tapar a vista ao pessoal nos concertos. Só que quando cheguei a casa e fui sincronizar o telemóvel, descobri que tinha tirado muito menos fotografias do que pensava."Selfies", praticamente, nem vê-las, mas sempre tenho algumas fotos para provar que estive lá.

IN "DINHEIRO VIVO"
14/04/15

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