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HOJE NO
"JORNAL DE NEGÓCIOS"
Vítor Gaspar:
“Não tenho qualquer vocação para resolver problemas de pura política”
Em entrevista a Maria João Avillez, o antigo
ministro das Finanças garante que todas as decisões foram sempre
consensualizadas no Governo e cola a vaga de desconfiança dos mercados à
demissão de Paulo Portas e à vontade deste de “mudar de rumo”. Sobre o
que se terá passado entre os dois, responde: “Pode-me fazer a pergunta
500 vezes, que não vai ter uma resposta”.
Vítor Gaspar assegura que todas as
decisões sobre as medidas concretas destinadas a dar corpo aos
compromissos de reforma e de redução do défice orçamental assumidos por
Portugal no âmbito do programa de ajustamento negociado a troco da
assistência financeira da troika foram sempre consensualizadas com os
outros ministérios e em colaboração com os grupos parlamentares do PSD e
do CDS. A ideia de que o ministro das Finanças actuava sozinho e,
eventualmente, à revelia de Paulo Portas
é desmentida pelo antigo ministro das Finanças no livro "Vítor Gaspar",
escrito por Maria João Avillez na sequência de uma série de entrevistas
concedidas à jornalista, e que a partir desta terça-feira estará nas
livrarias.
“Não houve um minuto em que o ministério das Finanças e o seu
ministro não tenham colaborado com os outros ministérios na procura de
soluções. As escolhas políticas concretas transcendem em muito a
capacidade e a responsabilidade do ministro das Finanças”.
Sobre o que o levou a demitir-se, em 2 de Julho de 2013, o antigo ministro recorda as decisões do Tribunal Constitucional que obrigaram a uma revisão profunda da
estratégia de redução do défice e diz que tinha de assumir a
responsabilidade política
pelos resultados que escolhera salientar – as metas défice e a dívida
públicos fixados no memorado original negociado pelo PS, antes das
eleições de 2011 – e que não foram cumpridos. “A escolha de destacar
politicamente a relevância desses limites foi minha”. “Consequentemente,
no momento em que se torna claro que não vão ser cumpridos é importante
assumir a responsabilidade”, acrescenta, frisando que isso não
significa fracasso do programa. “O programa de ajustamento português, de
modo geral, foi, em meu entender, muito bem-sucedido”.
Vítor Gaspar reconhece porém que “o motivo mais decisivo, o
catalisador para a necessidade de sair foi a impossibilidade de concluir
atempadamente o sétimo exame regular” da troika porque não dispunha de
“mandato político”. E porque não o tinha? Essa pergunta é feita na
página 34 do livro, com Vítor Gaspar a remeter a resposta para o
comunicado do dia seguinte, no qual Paulo Portas anunciava a sua
demissão irrevogável.
“Está claríssimo nesse comunicado que existe a vontade de promover
uma alteração de rumo e que – digamos – o motivo usado no comunicado
para justificar a demissão do ministro de Estado e dos Negócios
Estrangeiros é que a minha saída não terá sido usada, dada a identidade
da pessoa escolhida para me suceder – a Dr.ª Maria Luís Albuquerque - ,
para fazer uma inflexão política. O que claramente mostra que há uma
diferença de concepção sobre esta fase do programa de ajustamento e a
orientação política adequada nesse contexto”.
Não satisfeita, Maria João Avillez vai insistindo na pergunta: porque é que não houve consenso na coligação em tempo útil para fechar a sétima avaliação da troika -
que, recorde-se, começou no fim de Fevereiro e só foi fechada em Maio,
levando então Cavaco Silva a comentar que se trataria de uma “inspiração
da nossa Senhora de Fátima, do 13 de Maio”.
Vítor Gaspar não responde. Insiste que a “capacidade de julgamento do
negociador português e a sua autoridade foram claramente postos em
dúvida” com esse atraso, pelo que “não podia continuar nesse papel”. E
destaca os méritos da sua saída, afirmando que “existia vantagem numa
alteração dos protagonistas” e que “neste momento há claramente uma
coesão renovada dos partidos que apoiam o Governo, e uma forma de
funcionamento que conduzirá naturalmente à manifestação desse consenso”.
Mas quais eram os problemas políticos entre Gaspar e Portas? –
insiste a jornalista, ao referir a recusa do líder centrista em aceitar o
que ficou conhecido como a "TSU dos pensionistas" e que está de volta,
depois do chumbo do Constitucional à lei de convergência dos regimes
pensionistas. “Esse episódio traduz as dificuldades políticas associadas
à redução da despesas em circunstâncias de grande exigência”, comenta.
Mas porque não houve consenso, questiona pela enésima vez Maria João Avillez? A resposta definitiva surge na página 339 do livro editado pela D. Quixote. “Não
tenho qualquer vocação para resolver problemas de pura política”.
“Pode-me fazer a pergunta 500 vezes que não vai ter uma resposta. Estive
plenamente dedicado à esta tarefa durante dois anos. Foi para mim muito
difícil. A minha única motivação foi o interesse de Portugal. Estou
convencido de que responder à sua pergunta seria contraproducente”.
O antigo ministro refere ainda que a data precisa da sua saída do
Governo foi “decidida relativamente tarde”, mas preparada com tempo e
com o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, sobre quem tece rasgados e múltiplos elogios
Vítor Gaspar chama ainda a atenção para o facto de a sua saída não
ter tido impacto nos mercados, ao contrário da do então MNE e hoje
vice-primeiro-ministro que, tendo sido acompanhada da manifestação
pública de desejo de mudança de rumo, fez disparar os juros da dívida
pública. “A saída de Paulo Portas e o impacto que teve nos mercados
mostra a força e a relevância da política. A centralidade da política é
patente naquele momento”.
* Quem não quer ser político não vai para ministro! Não é falta de vocação, é incompetência!
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