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Crónica de uma ilha
(pouco) anunciada
Porto Santo tem
muitos encantos e, por via de regra, quem os estraga são os de fora, as
mais das vezes em Lisboa, mesmo quando afirmam “estar atentos”.
Imagine-se se não estivessem.
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Desde
que me lembro de mim mesma que venho para Porto Santo, essa ilha do
arquipélago da Madeira que é anunciada como uma espécie de caraíbas
portuguesas. Ainda antes de conhecer as praias algarvias, percorria,
como hoje percorro, os mais de seis quilómetros de areal e entrava no
mar que, quando o tempo ajuda, deve ser dos mais quentes de Portugal. A
paisagem é, de facto, lindíssima mas esconde um conjunto de dificuldades
de que a maior parte dos turistas só se apercebe quando se trata das
idas e vindas. O postal retrata a praia mas omite as agruras de um povo
que resiste, quando não com uma aceitação que me enerva, pelo menos com
uma resiliência notável.
Para os que não sabem, as
pessoas que moram em Porto Santo dependem (e em muito!) do barco e da
ligação aérea para o Funchal, já que, por erros do passado, esta ilha
vive fundamentalmente do turismo de Verão, quase nada sendo produzido
aqui. Não nascem crianças aqui porque apenas existe um centro de saúde,
pelo que quem aqui adoeça (depois de passar pelo crivo de uma certa
médica e conseguindo sobreviver-lhe…) é evacuado para o Funchal. Uma
extrema dependência da ilha maior que, ao invés de diminuir nos meses
frios, se acentua.
Por outro lado e como os habituais sabem, um
Verão mais fraco significa necessariamente fome no inverno, porque aqui
as fichas foram todas jogadas nos três meses de férias e na construção
civil desenfreada, com bastantes imóveis deixados ao abandono assim que
estalou a crise. Não discuto as opções que foram tomadas porque sempre
me pareceram erradas e, aliás, fazer depender a economia quase
exclusivamente do turismo parece ser um fenómeno a alastrar para todo o
terreno.
Daqui
resulta, também e à semelhança do que sucede com o país, que Porto Santo
precisa de turistas e, em larga medida, eles chegam de avião. Sucede
que, tendo a TAP deixado de assegurar a designada “ponte” entre as duas
ilhas e após dois concursos públicos (com a SATA e a Aerovip,
sucessivamente, a encarregarem-se de tal), houve um manifesto atraso no
lançamento daquele que deveria estar agora a satisfazer as necessidades
de transporte, já que em Lisboa, pelos vistos, se esqueceram deste
pedaço de Portugal.
Pela primeira vez, ganhou uma companhia das
Canárias, sem que alguém tivesse questionado as suas motivações,
capacidade ou (porque não?) consciência do serviço público que se
propuseram realizar.
O resultado do dito concurso foi anunciado com
pompa e circunstância, já que a Binter prometia uma qualidade de serviço
superior – o que, diga-se, tendo presente a que existia, não era algo
difícil de conseguir…
Contudo, o que é certo é que, em pleno mês
de Agosto, tais ligações começaram a falhar clamorosamente, num primeiro
momento justificadas com inexistentes questões climatéricas e, depois,
anunciadas sem qualquer motivo. Se uns passageiros não conseguem sair de
Porto Santo, muitos outros não chegam, sendo que a imagem deixada
representa um dano irreparável para uma ilha que não o merece e que
precisa de toda a boa publicidade que possa ter.
Dito de outra
forma, Porto Santo tem muitos encantos e, por via de regra, quem os
estraga são os de fora, as mais das vezes em Lisboa, mesmo quando
afirmam “estar atentos”. Imagine-se se não estivessem.
IN "O JORNAL ECONÓMICO"
17/08/18
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