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Ultrapassar à má fila
Se ainda ninguém tinha reparado nos
números, podem ver agora. São oficialmente preocupantes. Nesta semana
estivemos nas freguesias com a habitação mais cara de Lisboa e Porto.
Estão as duas a perder moradores a um ritmo acelerado, porque, na
freguesia de Santo António, em Lisboa, o metro quadrado já chegou aos
4000 euros e na freguesia do centro histórico do Porto vai nos 1600
euros.
Uma valorização de 40% num ano em Lisboa e de 45,2% no Porto.
Há meses que o Banco de Portugal alertou oficialmente para os riscos de
uma bolha imobiliária no mercado nacional, mas esta parece continuar a
encher. E se os preços de casas, que deviam ser acessíveis à maioria da
classe média, não assustam, talvez outros sejam mais preocupantes: no
Porto, o centro histórico perdeu quase 1600 residentes em dois anos.
Santo António, em Lisboa, lida diariamente com cerca de 200 mil pessoas,
mas tem menos de 12 mil eleitores e o autarca Vasco Morgado admite ao
Dinheiro Vivo que possa cair abaixo dos dez mil. E que a população de
Lisboa, a capital, baixe para menos de 500 mil. Vasco Morgado fala mesmo
no conceito de uma “cidade-cenário” e não tem problemas em dizer que
quem compra casas com os preços atuais são estrangeiros, que estão nas
cidades uns dias por ano e que deixam as casas vazias. Os sinais são
mais do que evidentes, as medidas para regular o mercado ainda não.
É certo que o problema não é exclusivamente
português. Nos nossos antípodas passa-se algo semelhante, mas as
medidas foram bem mais radicais. A primeira-ministra neozelandesa
prometeu durante a campanha e cumpriu. Depois de os preços médios das
casas na Nova Zelândia terem disparado 57% desde 2010, e 5% só em 2018,
Jacinda Ardern levou a votos a proposta de limitar a venda de casas a
estrangeiros, porque “o governo acredita que os neozelandeses não devem
ser ultrapassados por compradores estrangeiros com mais poder de
compra”.
Por cá, essa ultrapassagem acontece diariamente, num país ainda a sair
de uma crise e sem o nível de vida da Nova Zelândia. Dificilmente
Portugal tomaria uma medida como esta, mas a urgência de uma regulação
eficaz do mercado imobiliário não podia ser mais clara.
IN "DINHEIRO VIVO"
19/08/18
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