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"PÚBLICO"
Finanças
Auditoria ao IDP revela 5,3 milhões
de euros de dívidas por liquidar
A auditoria às facturas por liquidar encontradas no Instituto do Desporto de Portugal (ex-IDP e actual Instituto do Desporto e Juventude de Portugal) e denunciadas em Agosto do ano passado por Miguel Relvas, na Assembleia da República, concluiu que os ex-responsáveis deste organismo assumiram encargos “não pagos” e não contabilizados, no valor de 5,3 milhões de euros. No relatório final, a que o PÚBLICO teve acesso, são confirmados os indícios de “violação das normas de execução orçamental”, que podem levar à responsabilização civil e/ou criminal de Luís Sardinha, ex-presidente do instituto público.
O caso das “687 facturas” encontradas numa “sala fechada” do IDP e não pagas ganhou dimensão pública a 23 de Agosto de 2011, quando o ministro-adjunto e dos Assuntos Parlamentares surpreendeu a Comissão Parlamentar da Educação, Ciência e Cultura, da Assembleia da República, exibindo vários dossiers nos quais garantiu estarem guardados os comprovativos de despesas efectuadas e não contabilizadas, no valor total de 6,7 milhões de euros. O caso motivou um inquérito interno e uma auditoria contabilístico-financeira e os novos responsáveis pelo antigo IDP prometeram divulgar publicamente as conclusões.
O inquérito ficou concluído em 9 de Setembro de 2011 e a auditoria dez dias depois, a 19 de Setembro, mas os resultados acabaram por não transparecer para a opinião pública. As conclusões da auditoria motivaram uma inspecção do Tribunal de Contas (TC), que teve início no final do ano passado e ainda decorre, segundo o PÚBLICO apurou.
De âmbito menos abrangente (mas com conclusões distintas da auditoria), o inquérito limitou-se ao apuramento das circunstâncias em que foram encontradas determinadas facturas no gabinete de uma técnica superior do Departamento dos Recursos Financeiros e Patrimoniais. Concluiu que as mesmas não estavam “escondidas ou dissimuladas” naquele local, nem eram “cerca de 700 facturas, mas apenas 50”, ao contrário do que fora sugerido em Agosto por Miguel Relvas.
O inquiridor ilibou a funcionária em causa de “qualquer infracção disciplinar”, já que a mesma “se limitou a cumprir diligentemente o que tinham sido as instruções que anteriormente recebera”. No final, o inquérito propôs “o arquivamento” do processo.
Bem distintas foram as conclusões da auditoria em relação ao desempenho da técnica superior do IDP, considerando que as suas alegações no processo de inquérito “configuram más práticas de organização, gestão e de contabilidade”.
Mais ampla, esta auditoria interna centrou-se no “universo de facturas localizadas no IDP”. Ou seja, às “687 facturas localizadas em salas da Divisão de Gestão de Recursos Financeiros” (correspondentes a 178 fornecedores e “diversas tipologias de bens e serviços e empreitadas de obras públicas”), procurando apurar se as mesmas “estavam ou não processadas no sistema contabilístico Gespública [programa de orçamentação, contabilização e pagamentos utilizado, entre outros sistemas, pelos serviços com autonomia administrativa e financeira] e eventualmente pagas”.
6,1 milhões em facturas
No final, o auditor concluiu que a grande maioria das facturas em causa (635), correspondentes a aproximadamente 6,1 milhões de euros, não tinha sido processada no sistema contabilístico até à data de 9 de Agosto de 2011. E outras 47 encontravam-se processadas, mas não liquidadas, perfazendo uma dívida de 663,6 mil euros. As restantes cinco tinham sido indevidamente consideradas no universo das 687 inicialmente apuradas pelos novos responsáveis do IDP (nomeados no início de Agosto do ano passado) e referidas por Miguel Relvas no Parlamento.
Dos 6,1 milhões de euros apurados, apenas 775 mil euros tinham sido reportados à Direcção-Geral do Orçamento, como “o montante referente aos encargos assumidos e não pagos”, até 31 de Julho de 2011. Não foi dado conhecimento ao Ministério das Finanças dos valores efectivamente em dívida e não processados, num total de aproximadamente 5,3 milhões de euros.
A auditoria destaca “a adopção de más práticas de organização, gestão e de contabilidade” dos anteriores responsáveis do IDP, sugerindo a sua alteração e correcção. Em relação à “violação das normas de execução orçamental” verificadas, é proposta a aplicação do Artigo 271.º da Constituição, que determina a responsabilidade civil, criminal e disciplinar dos funcionários e agentes do Estado e das demais entidades públicas “pelas suas acções e omissões de que resulte violação dos direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos”.
O auditor propunha ainda ao secretário de Estado do Desporto e Juventude o encaminhamento deste relatório para o Tribunal de Contas (que avançou com a já referida auditoria), Inspecção-Geral de Finanças, Direcção-Geral do Orçamento e, “eventualmente”, para a Procuradoria-Geral da República.
O anterior presidente do IDP, Luís Sardinha, caso sejam confirmadas pelo Tribunal de Contas as conclusões da auditoria interna, pode vir a ser responsabilizado financeira e/ou criminalmente, dependendo da natureza e amplitude do ilícito. Para tal, será necessário apurar se os encargos assumidos e não pagos estavam ou não autorizados. Ou seja, se estas despesas, para além de não terem sido reportadas à Direcção-Geral do Orçamento, foram contraídas sem autorização (não estando cabimentadas). A verificar-se esta última situação, o problema terá uma gravidade acrescida.
O PÚBLICO tentou contactar com o ex-presidente do IDP, mas o mesmo demonstrou-se indisponível para falar sobre este assunto.
* Só os tribunais é que julgam, mas nos governos de Socrates o despesismo incontrolado era "moeda corrente".
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