Maria Adelaide de Bragança, Infanta de Portugal (nome completo: Maria Adelaide Manuela Amélia Micaela Rafaela de Bragança; Saint-Jean-de-Luz, 31 de Janeiro de 1912), é filha de Miguel II de Bragança e de Maria Teresa de Löwenstein-Wertheim-Rosenberg.
Casou com Nicolaas van Uden, no dia 13 de Outubro de 1945, em Viena, Áustria. Do casamento, tiveram seis filhos:
* Adrien Serge Antonio Maria van Uden (1946-)
* Nuno Miguel de Bragança van Uden (1947-)
* Francisco Xavier de Bragança van Uden (1949-)
* Filipa Teodora Maria van Uden (1951-)
* Miguel Ignacio van Uden (1954-)
* Maria Teresa de Bragança van Uden (1956-)
Viveu em Viena, Áustria, trabalhando como enfermeira e assistente social. Durante a Segunda Guerra Mundial, quando havia bombardeamentos, deslocava-se durante a noite para os locais atingidos, para prestar ajuda às vítimas. Integrou um movimento de resistência à Gestapo, tendo sido condenada à morte. O então Presidente do Conselho de Ministros, António de Oliveira Salazar, interveio junto dos alemães, afirmando que D. Maria Adelaide era cidadã nacional. Esta intervenção da diplomacia portuguesa resultou na sua libertação e deportação imediata, tendo-se estabelecido na Suíça, onde vivia o seu irmão Duarte Nuno, Duque de Bragança. Após a guerra, a família finalmente voltou para a Áustria.
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D. DUARTE NUNO E D. MARIA FRANCISCA |
Em 1949, D. Maria Adelaide voltou para Portugal. Enquanto isso, o marido graduou-se em medicina na Universidade de Viena, especializando-se em doenças de pele. Mas quando Nicolaas van Uden chegou a Portugal, não lhe foi dada equivalência, pelo que não pôde exercer a profissão. Vai então trabalhar num pequeno labaratório de pesquisa na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, até que chega a oportunidade para trabalhar em parceria com a Fundação Calouste Gulbenkian. Assim nasceu o Instituto Gulbenkian de Ciência, que promove a investigação científica em diversas áreas desde os anos 50.
Originalmente, a família Van Uden instalou-se na Quinta do Carmo, em Almada. A Infanta Maria Adelaide começou a trabalhar como assistente social em algumas iniciativas locais, dado que a Trafaria e o Monte da Caparica eram locais muito pobres.
Alguns círculos monárquicos em Portugal consideram que a Infanta D. Maria Adelaide, por ser neta de rei (D. Miguel I), é o único membro da Família Bragança que poderia reclamar um direito ao trono de Portugal, de acordo com as leis tradicionais de sucessão, em representação dos direitos dinásticos de seu pai, D. Miguel, a quem os legitimistas reconheciam a designação de D. Miguel II. A maioria dos monárquicos reconhece, no entanto, ao Duque de Bragança, D. Duarte Pio, bisneto de D. Miguel I e sobrinho da Infanta Maria Adelaide, o direito ao Trono de Portugal, caso a Monarquia venha a ser restaurada.
WIKIPEDIA
Centenário.
A vida extraordinária de D. Maria Adelaide de Bragança, princesa de Portugal
Por João Távora
Adelaide de Bragança, a última neta viva do rei D. Miguel, faz hoje 100 anos e vai ser condecorada pelo Presidente da República. O monárquico João Távora faz o retrato
Foi há pouco mais de dois anos que num dia soalheiro e húmido de Novembro, por ocasião de uma entrevista para o boletim da Real Associação de Lisboa, com alguma emoção tive o privilégio de privar com a D. Maria Adelaide de Bragança, infanta de Portugal, que hoje completa e festeja 100 anos de uma extraordinária vida.
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EM 2009 COM O FILHO FRANCISCO |
Não deixa de ser algo irónico ter sido numa pequena moradia da “outra banda”, onde fomos tão acolhedoramente recebidos, que nos encontrámos com uma verdadeira princesa, tão ou mais encantada que as dos romances e do cinema cor-de-rosa. Afilhada do rei D. Manuel II e da rainha D. Amélia, por insólita conjugação de duas paternidades muito tardias e da sua feliz longevidade, a infanta rebelde, como ficou conhecida, é neta, a última neta viva, do rei D. Miguel, esse mesmo, o do tradicionalismo e da guerra civil de 1828-1834.
Filha mais nova do duque de Bragança D. Miguel (II) e de Maria Teresa, princesa de Löwenstein-Wertheim-Rosenberg, D. Maria Adelaide nasceu ironicamente no dia 31 de Janeiro, em 1912, em St. Jean de Luz, no exílio a que todos os da sua família estavam sentenciados, tendo crescido em Seebenstein, na Áustria, em convívio com as mais influentes famílias europeias, sonhando com o país que não lhe era permitido conhecer. Vivia distante de Portugal mas era totalmente português o seu coração. E cresceu com o rigor de orçamentos matemáticos e com o estoicismo próprio dos exilados numa época histórica especialmente conturbada. Uma verdadeira mulher do mundo, vem-lhe da infância a curiosidade pelas questões políticas e humanitárias: a infanta confidenciou-nos que ainda pequena se escondia atrás de um sofá na sala para ouvir as conversas de seu pai com militares e políticos.
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O Presidente da República acaba de assinar o despacho em que atribui a condecoração de Grande Oficial da Ordem do Mérito a D. Maria Adelaide de Bragança em véspera do seu centésimo aniversário. A infanta de Portugal, neta do rei D. Miguel, afilhada da Rainha D. Amélia e de D. Manuel II, é um verdadeiro exemplo de profunda Nobreza aliada a uma invulgar bravura e irreverência. |
Habitando no olho do furacão que varria a Europa Central do início do século xx, a pequena D. Adelaide de Bragança acabou por viver aventuras e desventuras de pasmar: da Primeira Guerra Mundial recorda o racionamento e as filas para aquisição dos alimentos que então rareavam. “A certa altura, ainda eu era muito pequena, comíamos batatas ao pequeno-almoço, que vinham de comboio e no Inverno congelavam. Uma batata congelada nem um animal consegue comer: ficávamos sem a refeição.” D. Maria Adelaide ressalva que não chegou a passar fome pois, por ser muito pequena, sempre arranjava qualquer coisa quando passava na mercearia ou no talho. “O meu irmão (D. Duarte Nuno de Bragança), esse sim: primeiro porque não ‘pedia’, segundo porque não queria receber ‘assim’ os alimentos, e repartia o pouco que tinha, em prejuízo da sua saúde”, que se deteriorou, fazendo perigar os saudosos passeios de bicicleta que a pequena infanta dava com o irmão, sentada no guiador, recorda. Muito mais nova que as irmãs, não a atraíam brincadeiras e actividades próprias das meninas da época: detestava bonecas, rendas ou culinária.
Em busca de subsistência, a família refugiou-se então numa propriedade de um tio materno na Boémia, que no final da guerra acabou “requisitada” pelos comunistas, com os quais se encantou, “com as suas boinas vermelhas e cavalos altivos”.
Já em Viena, a jovem infanta estudou Enfermagem e Assistência Social, e habitou numa residência universitária, “uma coisa já natural para uma senhora na altura”. Cresceu de frente para um mundo em convulsão e testemunhou a ocupação nazi, ainda em Viena, onde, como enfermeira, acudia aos feridos entre bombardeamentos.
Apanhada pela Gestapo, foi presa, acusada de ouvir transmissões da BBC. Interrogada, esteve na solitária e foi libertada mediante a intervenção diplomática nacional, tendo-lhe sido concedido um passaporte português. Essa experiência, contudo, acabou por determinar a sua adesão à resistência organizada, no grupo O5, onde o seu nome de código era Mafalda. Já perto do fim da guerra foi presa uma segunda vez, vítima de uma denúncia que custou a vida a vários ingleses e judeus austríacos que se escondiam na sua casa em Seebenstein. Foram extremamente penosos, de fome e dor, os dias dessa prolongada prisão em Viena, então flagelada pelos Aliados, nos derradeiros meses da ocupação nazi. Com os ocupantes nervosos e em debandada, foi na iminência de uma execução sumária que a infanta de Portugal foi libertada pelo exército soviético.
Entre correrias, bombardeamentos e aflições, sem nunca perder de vista a assistência humanitária, conheceu um estudante de Medicina, de seu nome Nicolaas van Uden, com quem casou depois da guerra. “Ele como médico e eu como enfermeira estivemos para ir para África, mas pressionados pela família acabámos por vir para Portugal”, por volta de 1949, ainda antes da revogação da lei do banimento.
Instalada a família numa quinta em Murfacém, perto da Trafaria, D. Maria Adelaide cedo se entregou a uma intensa actividade, tendo dirigido a Fundação D. Nuno Álvares Pereira, em Porto Brandão, instituição de apoio a mães pobres em final de gravidez e a crianças abandonadas, dedicando a sua vida aos mais desfavorecidos. A sua forma de relacionamento e gestão pouco convencional para a sociedade “chique” do regime chocou algumas mentes mais puritanas, que a acusavam de comunista, facto negado pela sua profunda devoção católica.
Longe das fugazes ribaltas e feiras de vaidades, a senhora D. Maria Adelaide celebra hoje 100 anos. Celebra-os com uma missa de Acção de Graças pelo dom da vida, na Igreja do Bom Sucesso, e um jantar simples organizado por amigos e família no Centro Cultural de Belém. A Senhora Infanta, como é tratada pelos mais próximos, além de constituir um precioso testemunho vivo, directo e indirecto, da história dos últimos duzentos anos, constitui um verdadeiro exemplo de profunda nobreza, aliada a uma invulgar coragem e irreverência, que tanta falta faz nos dias de hoje.
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31/01/12
Maria Adelaide de Bragança, a Infanta rebelde
Beja Santos
Dona Maria Adelaide Manuela Amélia Micaela Rafaela de Bragança van Uden, nascida em 1912, é a diferentes títulos uma mulher excepcional, uma figura rara da filantropia, uma aristocrata que pautou toda a sua existência pelo serviço e a doação aos outros. É compreensível que tenha suscitado o interesse em conhecer todo o seu percurso, pondo-o em livro.
A última filha de Dom Miguel II viveu sempre tão perigosamente e desagradando mesmo a alta sociedade portuguesa que a considerou sempre pouco adequada a uma pessoa da sua condição, que o seu depoimento tem obrigatoriamente um peso exemplar, pelo humanismo e coragem. “Dona Maria Adelaide de Bragança, a Infanta Rebelde”, por Raquel Ochoa (Oficina do Livro, 2011). Procura captar o viver dessa aristocrata que presenciou duas guerras mundiais e participou activamente na resistência contra os nazis. No pós-guerra, com o fim do banimento do ramo miguelista, veio para Portugal já casada e aqui deixou uma obra de solidariedade e assistência digna de nota.
A autora não esconde o seu empolgamento, rende-se ao inacreditável percurso de Dona Maria Adelaide. Pena é, muito ao jeito do nosso tempo, que tenha enquadrado a formação da infanta muito ao estilo da banalidade histórica polvilhada de lugares comuns e maniqueísmos confessos. Na educação aprende que Dom Pedro IV era um homem muito taciturno e sujeito a irregularidades de génio, ambicioso. Dom Miguel era perseverante e firme, sincero e generoso.
O busílis foi a perda dos ideais tradicionalistas que levou à guerra implacável dos partidos e depois a aliança dos países liberais contrariou a história, decretando o exílio de D Miguel para Áustria. Estas versões podem ser muito simpáticas para vender literatura de cordel mas relativamente anódinas e desnecessárias para a biografia da infanta rebelde. Tal como os irmãos, Maria Adelaide Bragança foi educada na frugalidade, a trabalhar em meio rural, quis ser assistente social e enfermeira, as duas Grandes Guerras tudo alteraram. Dom Miguel II pôs-se ao serviço da Cruz da Malta, a sua família viveu na maior rusticidade e depois veio a derrocada do império Austro-Húngaro, os descendentes de Dom Miguel I abandonaram Seebenstein mudando-se para Bronnbach.
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RAQUEL OCHOA |
A intoxicação histórica continua, parece que é preciso escrever a biografia de Maria Adelaide de Bragança ao ritmo dos romances de capa e espada: talvez Dom João VI tenha sido envenenado; os adversários de Dom Miguel estavam tão certos da fraqueza dos seus argumentos que foram pedir apoio político ao governo inglês… Foi assim que a Infanta passou a compreender que a política era capaz de destruir famílias. E nesta historiografia de trazer por casa avança-se mais um elemento para tornar Dom Miguel virtuoso: “A capitulação de Dom Miguel tem origem na união de vários Estados para o derrubar. Isso só foi possível porque quem o apoiava percebeu que retiraria mais dividendos ao conluiar-se com a outra facção.
A certa altura aconteceu algo que mudaria o curso dos acontecimentos: muitos jornais e folhas impressas divulgaram o texto do tratado da Quadrupla Aliança – o pacto entre Portugal, Inglaterra, França e Espanha que ditaria o fim da guerra civil”. Não é preciso ser historiador para se saber que esta argumentação não tem pés nem cabeça, Dom Miguel perde a guerra por falta de apoios internos. Mas enfim ficamos assim com o quadro romântico e folhetinesco do exílio. A Infanta irá ser uma resistente ao nazismo, terá mesmo colaborado com os conspiradores que prepararam um atentado contra Hitler. Será presa pela Gestapo e condenada à morte. Salazar interveio e reclamou a libertação de duas infantas presas, concedendo-lhes passaportes diplomáticos. É nessa atmosfera de fim de guerra que conhece o médico holandês Nicolaas van Uden com quem irá casar.
Findo o exílio, o casal van Uden vem viver para a Caparica. Agora a culpa a ser de Salazar que não gostava da monarquia. Maria Adelaide tornou-se crítica muito severa da sociedade portuguesa. O pretendente ao trono também vivia incomodado com a classe política, com o estreitamento de vistas dos próprios monárquicos. Se esse argumento é válido, até se pode perceber porque é que Salazar não depositou qualquer esperança na monarquia… O que e passava na realidade é que o ditador há muito tinha forjado um projecto de governação que exigia um grande equilíbrio entre todos os seus grupos de apoio e na verdade deixara de existir a popularidade pelo ideal monárquico. Com estas tergiversações, lá se vai perdendo tempo para perceber como foi importante o trabalho de Maria Adelaide de Bragança na fundação Nuno Álvares Pereira, no Porto Brandão.
O Dr. Nicolaas van Uden igualmente benemérito e filantropo passa praticamente despercebido. Assim se chega ao 25 de Abril, e no auge da turbulência a Infanta trabalha afincadamente e merece todo o respeito e apoio dos revolucionários da Lisnave. Esperava-se mais amplo desenvolvimento do trabalho da Infanta rebelde, fica-se com a sensação de que a autora andou à deriva mais preocupada com os pormenores mundanais do que com a essência do trabalho da mais despretensiosa das aristocratas portuguesas. A caminho dos 100 anos, assiste-lhe o direito de declarar na entrevista o seguinte: “A morte é uma transição, é como se fosse ao Brasil ou à Indonésia, se eu fosse à Austrália durante 5 anos era muito mais longe.
A minha fé facilita muito o fim da vida, porque o caminho é claro. Se morrer hoje, eu sei concretamente qual é o meu futuro. A questão de se ter dúvidas é a dificuldade de não se saber bem o que é que vai acontecer. Ter fé facilita muito o fim da vida”.
Maria Adelaide de Bragança é de facto uma pessoa única, merecia ter ocupado mais espaço, ter mais biografia no meio de histórias menores, sobressair no palco gigante onde por vezes os protagonistas desenvolvem obras maravilhosas na total discrição, sem cuidar da opinião dos outros. Como é o seu caso.
IN "http://movimento.vidasalternativas.eu"
13/08/2011
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