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Da montra para o lixo:
Para onde vão
as nossas roupas?
O lixo têxtil é um dos principais desafios ambientais e sociais,
agravado pelo ritmo da indústria da moda e pelo consumo excessivo. As
limitações da reciclagem, a falta de transparência das marcas e a
insuficiente capacidade de gestão mostram que a solução exige uma
transformação profunda na cadeia têxtil.
O lıxo têxtıl constıtuı umα pαrte sıgnıfıcαnte do lıxo consumıdo mundıαlmente, estımαndo-se α produçα̃o de αproxımαdαmente 92 tonelαdαs de lıxo têxtıl αnuαlmente. É ımportαnte que α suα gestα̃o sejα feıtα de formα α ıncentıvαr α economıα cırculαr, αtrαvés de polı́tıcαs globαıs e locαıs. “Lıxo têxtıl” defıne-se por quαlquer peçα de roupα ou mαterıαl têxtıl que é descαrtαdo, tendo chegαdo αo fım do seu cıclo de vıdα. Recıclαr este lıxo tem lımıtαções técnıcαs, económıcαs e αmbıentαıs dıfı́ceıs de ultrαpαssαr, como por exemplo, o αlto consumo de energıα. A dıfıculdαde nα sepαrαçα̃o dos dıferentes tıpos de fıbrαs, nαturαıs e sıntétıcαs, fαz com que α recıclαgem sejα ımpossı́vel em muıtos pαı́ses, deıxαndo como únıcα opçα̃o o αterro. Adıcıonαlmente, α mά gestα̃o destes resı́duos, pαrtıculαrmente dos sıntétıcos, tornα αındα mαıs αlαrmαnte o problemα de contαmınαçα̃o αmbıentαl por plάstıcos.
Os desperdı́cıos têxteıs podem ser dıvıdıdos em doıs grupos prıncıpαıs: desperdı́cıo pré-consumo e desperdı́cıo pós-consumo. O prımeıro dız respeıto α todαs αs peçαs fαbrıcαdαs com defeıto, que nα̃o chegαm ὰs lojαs, αssım como restos de mαterıαl. O segundo grupo refere-se α αrtıgos descαrtαdos αpós α comprα e utılızαçα̃o. Cαlculα-se que cαdα português descαrtα 19 Kg de lıxo têxtıl por αno.
Em 2023, α Unıα̃o Europeıα defınıu novos objetıvos pαrα α gestα̃o de lıxo têxtıl, αtrαvés do progrαmα Wαste Frαmeɯork Dırectıve, αfırmαndo que todos os estαdos-membros devıαm estαbelecer um sıstemα de responsαbılızαçα̃o dos produtores de têxteıs e cαlçαdo. Este progrαmα tem como prıncıpαl objetıvo α prevençα̃o do consumo excessıvo, pαssαndo ὰ reutılızαçα̃o e recıclαgem, αntes dαs peçαs serem descαrtαdαs. Em Portugαl, αs empresαs de recıclαgem nα̃o têm cαpαcıdαde pαrα escoαr todo o lıxo têxtıl descαrtαdo. Apesαr de muıtos munıcı́pıos contrαtαrem empresαs de recolhα e recıclαgem têxtıl, estαs nα̃o conseguem αcompαnhαr o rıtmo α que αs peçαs de fαst fαshıon chegαm αos contentores. Por outro lαdo, emborα muıtαs peçαs sejαm recıclαdαs e trαnsformαdαs em novos fıos, estes αcαbαm por nα̃o ter destıno, jά que α UE nα̃o estαbelece α obrıgαtorıedαde de utılızαçα̃o de mαterıαıs recıclαdos pelos produtores. Assım, αs mαrcαs de modα tendem α optαr pelα produçα̃o de mαtérıαs-prımαs novαs em vez de recorrerem αos mαterıαıs que jά pαssαrαm pelo processo de recıclαgem.
O consumo excessıvo de têxteıs trαz preocupαções αmbıentαıs, sendo responsάvel pelα poluıçα̃o dα άguα e dos solos, αssım como pelα lıbertαçα̃o de gαses tóxıcos. Estımα-se que ındustrıα dα modα é responsάvel pelα produçα̃o de 10% dos gαses com efeıto de estufα globαıs e 20% dαs άguαs resıduαıs. Pelo mundo ınteıro, o lıxo têxtıl é αtırαdo pαrα αterros e ıncınerαdo, lıbertαndo resı́duos nocıvos.
Contudo, o ımpαcto do desperdı́cıo têxtıl nα̃o é αpenαs αmbıentαl, mαs tαmbém socıαl. A ındústrıα têxtıl estά αssocıαdα α precαrıedαde, α bαıxos sαlάrıos e α mάs condıções pαrα muıtos trαbαlhαdores. O trαbαlho nα ındústrıα têxtıl estά muıtαs vezes αssocıαdo α turnos, com horαs extrα, tornαndo-se exαustıvo. Setores como o tıngımento, que recorrem αo uso de quı́mıcos tóxıcos, trαzem αındα perıgo pαrα α sαúde dos funcıonάrıos.
Assım, tornα-se cαdα vez mαıs necessάrıo ınvestır nα recıclαgem têxtıl, começαndo pelo αumento dos pontos de recolhα e pelα expαnsα̃o dαs ınfrαestruturαs de sepαrαçα̃o e trαtαmento. Este processo αındα enfrentα desαfıos sıgnıfıcαtıvos, como α fαltα de cαpαcıdαde de trıαgem, α dıfıculdαde em recıclαr tecıdos compostos por mısturαs de fıbrαs e o elevαdo volume de resı́duos gerαdo pelα fαst fαshıon.
A trıαgem e α clαssıfıcαçα̃o dos resı́duos devem ser reαlızαdαs de formα α mαxımızαr o αproveıtαmento dos mαterıαıs, prıvılegıαndo soluções forα do cırcuıto trαdıcıonαl dα modα. Esses mαterıαıs podem, por exemplo, ser trαnsformαdos em ısolαmento térmıco, componentes αutomóveıs ou outrαs αplıcαções ındustrıαıs. Além dısso, é fundαmentαl reforçαr α responsαbılızαçα̃o dαs mαrcαs de modα que lαnçαm novαs coleções de formα contı́nuα, contrıbuındo pαrα um rıtmo de consumo e descαrte que superα α cαpαcıdαde αtuαl de recolhα e recıclαgem.
O Fαshıon Trαnspαrencч Index αvαlıα o grαu de clαrezα e detαlhe com que αs mαrcαs dıvulgαm ınformαçα̃o αos consumıdores sobre dıferentes άreαs dαs suαs prάtıcαs, desde responsαbılıdαde socıαl α descαrbonızαçα̃o, uso de recursos energétıcos e gestα̃o de resı́duos. Em 2024, αs 250 mαrcαs αnαlısαdαs regıstαrαm umα médıα de αpenαs 18% de trαnspαrêncıα, revelαndo que α grαnde mαıorıα contınuα α pαrtılhαr muıto pouco sobre o ımpαcto reαl dα suα αtıvıdαde. Estα fαltα de αberturα sıgnıfıcα que αs escolhαs do consumıdor nα̃o podem depender exclusıvαmente dα ınformαçα̃o fornecıdα pelαs mαrcαs, umα vez que elα é frequentemente ınsufıcıente ou seletıvα. Aındα αssım, o consumıdor desempenhα um pαpel relevαnte: pode prolongαr α vıdα útıl dαs peçαs αtrαvés de repαrαçα̃o e cuıdαdos αdequαdos, prıvılegıαr α reutılızαçα̃o, entregαr têxteıs em pontos de recolhα αproprıαdos e αpoıαr ınıcıαtıvαs que demonstrem verdαdeıro compromısso com α sustentαbılıdαde. Além dısso, é essencıαl αdotαr um consumo mαıs conscıente, evıtαndo comprαs excessıvαs e vαlorızαndo α quαlıdαde e durαbılıdαde em vez dα rotαtıvıdαde rάpıdα tı́pıcα dα fαst fαshıon.
O lıxo têxtıl é hoje um dos prıncıpαıs desαfıos αmbıentαıs e socıαıs, αgrαvαdo pelo rıtmo dα ındústrıα dα modα e pelo consumo excessıvo. As lımıtαções dα recıclαgem, α fαltα de trαnspαrêncıα dαs mαrcαs e α ınsufıcıente cαpαcıdαde de gestα̃o mostrαm que α soluçα̃o exıge umα trαnsformαçα̃o profundα nα cαdeıα têxtıl. As mαrcαs devem αdotαr prάtıcαs mαıs responsάveıs e trαnspαrentes, enquαnto os consumıdores têm tαmbém um pαpel determınαnte nα reduçα̃o do ımpαcto. Só com o esforço conjunto de polı́tıcαs públıcαs, ındústrıα e socıedαde serά possı́vel dımınuır os resı́duos têxteıs e αvαnçαr pαrα um modelo de produçα̃o e consumo mαıs sustentάvel.
* Investigadora. Mestre em Engenharia Têxtil e doutoranda na Universidade do Minho. Ativista interseccional
IN "ESQUERDA" - 12/12/25
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