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Proibido poupar
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Uma sociedade que oprima a poupança e reduza o indivíduo a uma máquina de consumo será, indubitavelmente, opressora.
De tempos a tempos, surgem nos motores
de busca notícias acerca de testes feitos pela China num novo yuan
digital e destaca-se a possibilidade de que essa e outras moedas
digitais dos bancos centrais (CBDC), possam ser programáveis para terem
características diferentes do dinheiro como o conhecemos.
Para além da rastreabilidade que a tecnologia blockchain permitiria, a
China estará, segundo as notícias, a testar uma moeda com prazo de
validade.
O objetivo principal será o de incentivar a economia, obrigando a que
se gaste o dinheiro em vez de poder ser guardado ou investido, sendo
que as moedas também podem ser configuradas de forma a só terem validade
em determinadas atividades.
Onde termina a realidade e começa o rumor é difícil saber, embora
estas notícias já tenham aparecido em jornais de referência como o “Wall
Street Journal”. Mas é consensual entre os especialistas que a
programação e rastreabilidade de uma moeda digital é possível e
plausível, o que levanta questões seríssimas sobre democracia e
liberdade.
Decisores e público em geral poderão ser seduzidos por novas
ferramentas de política monetária (e económica), mas também arriscam
abrir uma caixa de Pandora.
Por um lado, o detentor de moeda poderá ver o seu ativo invalidado ou
rastreado a qualquer momento pela autoridade monetária e, por outro,
devemos notar que a escolha de poupar é um ato reflexivo de liberdade.
Poupo porque quero e posso e por ter poupado tenho mais graus de
liberdade sobre o futuro.
Uma sociedade que oprima a poupança e reduza o indivíduo a uma máquina de consumo será, indubitavelmente, opressora.
Não pensemos que este conceito das moedas com validade é exclusivo de
regimes mais obscuros. Há menos de um ano, o Banco Central do Canadá
publicou o documento de trabalho “Best Before? Expiring Central Bank
Digital Currency and Loss Recovery”, de acesso público, no qual se
enaltecem as vantagens de uma moeda com data de validade. É assim que as
coisas começam.
IN "O JORNAL ECONÓMICO" - 25/11/22
Uma emergência climática
Portugal não é um país frio, comparando com o resto da Europa, mas é um país pobre, mal gerido e de prioridades trocadas.
A descida das temperaturas já se nota,
afetando sobretudo os mais carenciados e idosos. Este ano, devido à
subida dos preços da energia, as dificuldades serão maiores e os efeitos
poderão ser – escrevo sem medo das palavras – fatais.
O frio faz lembrar a inflação. É verdade que quem terá maior aumento
absoluto nos custos com o aquecimento serão os que têm mais
possibilidades, já que irão manter o seu conforto nas suas [maiores]
habitações à custa de contas de gás e eletricidade bem mais altas. Mas
serão os mais carenciados a sofrer mais porque terão de escolher entre
frio, fome, medicação ou outras necessidades básicas.
Há um problema de falta de atenção e de justiça social no que toca ao
planeamento energético das habitações. Acostumamo-nos a ouvir que as
casas são mal isoladas e muito suscetíveis aos rigores do inverno.
Portugal não é um país frio, comparando com o resto da Europa, mas é um
país pobre, mal gerido e de prioridades trocadas.
Décadas de incentivos fiscais e de regulamentação continuam a não
responder a este problema básico: as casas têm fraco isolamento térmico e
não defendem os idosos e as crianças que, invariavelmente, entopem as
urgências no inverno devido a doenças respiratórias, quando o desfecho
não é pior.
Um artigo desta semana no “The Economist”
demonstra que a mortalidade no inverno é substancialmente mais alta do
que no verão, mas que, paradoxalmente, esse diferencial de mortalidade é
maior nos países onde as temperaturas são mais altas do que naquelas
onde até há mais frio.
“Os dados confirmam que o frio mata” e, em Portugal, morrem mais 36%
de pessoas por semana no inverno, face a mais 13% na Finlândia, por
exemplo. Por outro lado, por cada inverno que seja 1º C mais frio que o
normal, morrem mais 1,2% pessoas, o que é potencialmente exacerbado
quando os custos de energia sobem.
IN "O JORNAL ECONÓMICO" - 02/11/22
* Economista da IMF - Informação de Mercados Financeiros.