Conhecidos os resultados da prova dos professores, a
PACC, melhor do que esbracejar à volta dos erros ortográficos,
dever-se-ia olhar para a escola que temos e pensar, face a um futuro de
incertezas, que professores queremos, que saberes importam nesta era
digital. Em relação à escrita, lance-se a questão: quem não comete
erros? Quem não tem dúvidas sobre a colocação dos clíticos e a grafia
dos conjuntivos? Graças a Deus, há dicionários, prontuários e sítios na
rede electrónica para os colmatar! Mais importante será o conteúdo das
ideias, a expressão do pensamento, a criatividade imaginativa, tudo
sobre uma convicta postura cidadã … E, para além de um sólido
conhecimento das matérias a ensinar, ser capaz de reflectir sobre as
suas práticas e aprender, porque nunca se saberá o bastante sobre o que
quer que seja…
O exame ministerial a que foram sujeitos os jovens professores pode
servir para levantar a questão sobre uma variedade de factores
subjacentes à formação de professores, hoje vulnerabilizados pelo
espectro do desemprego e da instabilidade profissional, sem vínculos
contratuais, saltitando de escola em escola, sem tempo para criar laços,
raízes que peguem fundo, como as árvores nobres em solos férteis.
Porque o que está a dar é uma sociedade em mobilidade, para baixo, de
preferência.
Assim, há um conjunto de aprendizagens formativas que lhes estão
vedadas: falo da aprendizagem inter-geracional com os colegas mais
velhos, exemplos com que construir posturas na docência, na profissão,
na vida, valores, princípios, atitudes, referência ética, força motriz
do brio em aprender a superar-se, a temperar o carácter e a
personalidade no desafio da melhoria de si próprio, na vontade cidadã de
participar, saberes partilhados indispensáveis à construção de qualquer
padrão de identidade e memória, a alma das instituições.
Como numa corrida de estafetas, vamos tentando alcançar, como agora soi
dizer-se no jargão político educativo institucional, metas! Que já foram
objectivos, e competências e que todos sabemos basearem-se em conteúdos
programáticos, mas que no cômputo global do papel e missão da escola,
significam educar e construir cidadania, feita de aprendizagens
significativas, sentido de pertença a uma comunidade, a uma sociedade.
Confesso que tive curiosidade em ver a prova e fiquei preocupada com o
tipo de perguntas, especialmente aquela do seleccionador de futebol, que
não percebi… Vozes mais abalizadas respaldam este sentir que é comum a
muitos, professores e não só, a quem tais questões colocam dificuldades
ao nível da interpretação. Enfim destinar-se-ão a faculdades
intelectuais de superior frequência e intensidade, que não são para
qualquer um, lógicas das superiores fórmulas matemáticas ministeriais,
cujos algoritmos aplicados ao último concurso de professores deram os
resultados que todos sabemos.
A necessidade de rigor e qualidade na Educação não tem nada a ver com
esta prova e esta reflexão não comporta qualquer concordância com a sua
realização, inútil e absurda. E se pretendemos rigor e qualidade,
importa referir outros dados que também afectam o sistema educativo. E
há números que nos devem fazer pensar. A redução do número de
professores no sistema (mais 15 foram colocados na requalificação,
quando fazem falta!); a dimensão dos cortes orçamentais; as supressões
curriculares e disciplinares nos diversos anos de escolaridade; o
aumento do número de alunos por turma; a negligência do Ensino
Artístico; as restrições introduzidas na Educação Especial; os cortes
nos apoios sociais à pobreza; etc.
Ninguém duvida ser a mestria da Língua Portuguesa com algum rigor,
condição desejável a qualquer professor, independentemente da área
disciplinar ou nível de escolaridade onde leccione, desde a Educação
Pré-Escolar. Cada professor português deve ser professor de Língua
Portuguesa. Os professores são um pivot central na qualidade do sistema
educativo. São os operacionais no terreno, os primeiros a dar o peito às
balas na batalha da educação, da promoção do desenvolvimento da
sociedade, junto das jovens gerações. Mas do seu perfil deve também
fazer parte, para além da rigorosa competência científica, uma forte
resistência física, psicológica e emocional, face às exigências sociais
com que se debatem no dia-a-dia e uma consciente implicação cidadã na
sociedade. Essas serão as provas que contam!
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS DA MADEIRA"
04/02/15
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