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Cansados de blogs bem comportados feitos por gente simples, amante da natureza e blá,blá,blá, decidimos parir este blog do non sense.Excluíremos sempre a grosseria e a calúnia, o calão a preceito, o picante serão ingredientes da criatividade. O resto... é um regalo
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Durante uma conferência virtual na semana passada, o CEO da Apple, Tim Cook desferiu um golpe pronunciado sobre o modelo de negócio das redes sociais.
"Quais são as consequências de não apenas tolerar mas recompensar conteúdo que enfraquece a confiança pública nas vacinas que salvam vidas?", questionou. "Quais são as consequências de ver milhares de utilizadores a juntarem-se a grupos extremistas e depois perpetuar um algoritmo que recomenda mais?"
Cook referiu o brilhante documentário "O dilema social", que a Netflix estreou em setembro do ano passado, referindo que não podemos deixar que este dilema se torne numa catástrofe social. Referiu a violência e polarização que têm sido directamente associadas à radicalização nas redes sociais e os perigos que representam.
O evento, International Conference on Computers, Privacy & Data Protection, aconteceu no Dia Internacional da Privacidade, pelo que as observações de Tim Cook tinham um enquadramento específico. E ainda que ele não tenha nomeado o Facebook, tornou-se óbvio que este era o seu maior alvo. Isto porque a Apple e a empresa de Mark Zuckerberg estão em guerra aberta pela privacidade dos utilizadores.
Tal ficou claro um dia antes, quando o Facebook apresentou os seus resultados trimestrais e disse que as mudanças que a Apple vai introduzir no iOS 14 poderão prejudicar as suas receitas futuras. Numa das próximas actualizações do sistema operativo dos iPhones, será introduzida a funcionalidade "App Tracking Transparency", que vai obrigar as aplicações a pedirem consentimento aos utilizadores para partilharem os seus dados com terceiros. Isto será especialmente penoso para o Facebook, que monitoriza o que os utilizadores fazem mesmo quando desligam a rede social.
Zuckerberg e a sua número dois Sheryl Sandberg argumentaram que as mudanças vão prejudicar as pequenas empresas e que a intenção da Apple não é proteger os utilizadores mas sim beneficiar o iMessage. "A Apple tem todos os incentivos para usar a sua posição de plataforma dominante para interferir com a forma como as nossas apps e outras apps funcionam, o que fazem regularmente para dar preferência às suas."
Poderia ser um argumento convincente se viesse de outro lado, mas vindo do Facebook não cola. A empresa não tem um bom histórico de protecção dos dados dos utilizadores, pelo contrário, e não há qualquer justificação para permitir que tenha acesso a dados de comportamento fora dos seus sites. Nem eles, nem ninguém. A recolha, troca e partilha de dados de utilizadores, mesmo anonimizados, tem consequências profundas - "O dilema social" explica bem como e porquê. É certo que muita gente não se importa de trocar privacidade por serviços gratuitos, mas então isso tem que ser uma escolha consciente.
Não é que a Apple seja a grande heroína desta história, apesar de ter um percurso que cai mais para o lado da protecção da privacidade que o contrário. A empresa que popularizou os smartphones e criou o mercado das aplicações tem responsabilidade neste estado de coisas e podia ter agido muito mais cedo. Mas aqui estamos, em 2021, à mercê de uma máquina de recolha de dados pessoais que não percebemos nem conseguimos controlar, tentando avaliar qual destes Golias é menos mau.
Aquilo em que Cook tem toda a razão é na génese do problema. Os perfis dos utilizadores são agregados, refinados e monitorizados para que a publicidade seja mais eficaz. Que conversa é esta? Não havia publicidade antes das apps e das redes sociais? Não havia bons marketers antes dos algoritmos? Havia, pois. Cook colocou-o desta forma: "A tecnologia não precisa de enormes quantidades de dados pessoais, agrupados em dezenas de sites e aplicações, para ter sucesso", afirmou. "A publicidade existiu e prosperou durante décadas sem isso."
Os Golias de silício vão querer convencer-nos de que manter a nossa própria privacidade é mau ou inútil, e que se não há almoços grátis temos de ceder nalguma coisa. Não o façamos. Porque mesmo os serviços pagos participam neste ecossistema opaco de monitorização e personalização. Se uma funcionalidade for boa o suficiente, os utilizadores vão querer tê-la. Qualquer empresa que queira impedir a escolha terá, ou parecerá ter, alguma coisa a esconder.
IN "DINHEIRO VIVO" - 02/02/21
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𝒬𝒰𝒜ℛ𝒜𝒩𝒯ℐ𝒩𝒜
* Que maravilha TÉTÉ
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