HOJE NO
"PÚBLICO"
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Desperdício de comida no campo
e na fábrica dá para encher todos
os caixotes do lixo do país
Um terço dos alimentos produzidos para consumo
humano perde-se ou desperdiça-se em todo o mundo. Em 2013, o total
desperdiçado (300 quilos por habitante, em média, de acordo com a FAO)
equivalia a 30% da superfície agrícola mundial. Na Europa, entre 30 e
40% da comida perde-se até chegar ao consumidor: são 179 quilos por
habitante, 42% dos quais em casa.
A maçã Fuji que Joaquim
Cabral Menezes segura na mão tem carepa. Uma mancha castanha que destoa
no tom vermelho e lhe dá uma aparência meio tosca. “É sinónimo de
doçura, torna a maçã melhor, mas não entra nos supermercados. Tal como
estas”, diz, enquanto aponta para uma enorme caixa cheia de maçãs com os
mais variados defeitos. Pintas a mais, tamanho a menos, longe da
perfeição. É uma espécie de selecção natural. Nesta central fruteira da
Quinta de Vilar, em Cabril, uma pequena aldeia do concelho de Viseu, de
um lado estão as frutas perfeitas, que conquistaram o direito à
prateleira. Do outro as rejeitadas pela aparência.
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Nem
sempre foi assim. O engenheiro civil que toma conta de um negócio
familiar que começou no século XIX ainda se lembra do tempo em que
defeitos como a carepa não eram motivo de rejeição por parte dos
clientes. Mas hoje o consumidor manda. Manda fruta e legumes perfeitos,
com bom ar, viçosos, gostosos, que toca, cheira, selecciona até à
exaustão na zona de frescos dos supermercados. Dos pomares da Quinta de
Vilar — 40 hectares de macieiras impecavelmente alinhadas —, o grosso da
produção é vendido nas cadeias de distribuição. A mais recente campanha
rendeu cerca de 1200 toneladas de fruta, mas entre 20 e 30% não vão
chegar, no seu estado natural, à casa dos portugueses porque, numa
sociedade cada vez mais exigente com a alimentação, os olhos também
comem.
“A lei descreve as condições em que a maçã deve chegar ao
consumidor, diz o tipo de defeitos e distingue os calibres mínimos. E os
supermercados vão além dessas exigências, seguem as melhores práticas
da União Europeia”, afirma Joaquim Cabral Menezes, acrescentando que as
perdas no transporte das maçãs, do campo para as lojas, “são poucas”.
“Há mais desperdício com a devolução. Os clientes chegam a devolver
paletes inteiras só porque há duas ou três maçãs que não cumprem os
critérios”, lamenta.
Aos 20% de fruta que não chega a casa dos
consumidores, junta-se entre 1 e 2% de maçã que apodreceu no campo ou
durante o curto percurso entre a árvore e a central fruteira, o local
onde máquinas e homens seleccionam o produto de acordo com o seu tamanho
(calibre). Sem condições para poderem ser consumidas, são consideradas
lixo. Regressam ao campo para enriquecer o solo ou são utilizadas na
alimentação animal.
* Um ministro da Agricultura com vergonha na cara não permitiria esta situação em Portugal, um país onde mais de dois milhões de pessoas passam fome.
** Quanto à Europa não são estranhos o descaramento e desumanidade da Comissão.
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