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Oportunismo na Saúde
Começam hoje as audições no Parlamento sobre um dos casos mais polémicos, e
graves, dos últimos meses: os ganhos absurdos e imorais auferidos por um
dermatologista do Santa Maria à custa de um problema que afeta milhares
de doentes, os atrasos para cirurgia. Entre 2021 e 2024, Miguel
Alpalhão faturou 700 mil euros em produção adicional (feita fora do
horário de trabalho normal para reduzir as listas de espera, através do
Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia, SIGIC), sendo
que só num sábado ganhou 51 mil euros, com a conivência, ativa ou por
omissão, dos responsáveis do hospital e da tutela. Além dos valores
obscenos, as auditorias internas detetaram outras irregularidades, como a
codificação indevida (pequenas cirurgias registadas como sendo em
ambulatório, o que faz aumentar o valor final) e atos clínicos inscritos
em SIGIC como tendo sido praticados por uma médica quando ela estava
fora do país e que auferiu, em sete sábados, 113 mil euros.
A teia de cumplicidades está agora a ser destapada e pode ser mais
vasta. Paulo Filipe era diretor de dermatologia (demitiu-se perante os
resultados das auditorias) e contestou que se limitasse a produção
adicional a 25% da atividade total. Luís Pinheiro autorizou, quando era
diretor clínico, o aumento da produção e é visado também no caso das
gémeas luso-brasileiras que receberam, no mesmo hospital, um tratamento
que custou quatro milhões de euros ao Estado. Hoje, o primeiro a ser
inquirido pelos deputados é o presidente da Administração do Santa
Maria, Carlos Martins, ex-secretário de Estado da Saúde que sucedeu, em
dezembro de 2023, a Ana Paula Martins, a atual ministra que também vai
ser ouvida por causa deste caso, bem como o diretor-executivo do SNS,
Álvaro Almeida.
Além da mera deteção das falhas, o que realmente importa é imputar
responsabilidades, o que passa por obrigar Alpalhão a devolver os
balúrdios que tenha recebido indevidamente, demitir e punir os culpados e
reformar e moralizar o SIGIC. Para que não haja meia dúzia de
oportunistas a enriquecer à custa dos atrasos do SNS.
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS" - 08/07/25 .

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