18/12/2015

FILIPE LUÍS

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Conto (político) de Natal


I
Nas palhinhas deitado, o Menino Costa era velado pela Virgem Catarina e por São José Jerónimo. Guiados pela estrela fraturante e defensora dos direitos das minorias do Bloco de Esquerda, os três Gays Magos aproximavam-se do estábulo de São Bento...

O caminho tinha sido longo. A 4 de outubro, os eleitores tinham fechado a porta ao PS e a esquerda ficara sem local para poder dar à luz o seu pequeno primeiro-ministro. Perseguida pelos exércitos do Império da Direita, comandados pelo centurião Passus Coelhus e pelo decurião Paulus Portus, a Sagrada Família de esquerda não teve outro remédio senão acoitar-se no estábulo parlamentar, onde, abrigada das tempestades desencadeadas pelas legiões de Coelhus e Portus, podia, finalmente, descansar e velar o Salvador.

A certidão de nascimento do Menino Costa, lavrada em diferentes posições conjuntas, atestava que o filho gerado pela Virgem Catarina não era de São José Jerónimo - que apenas perfilhava a criança. Afinal, eles mal se falavam e nunca tinham vivido como marido e mulher. O Menino Costa era filho de Deus.

Em Roma, o imperador Tibério Cavacus espumava de raiva. Ou talvez os pequenos pontos de saliva acumulados aos cantos da sua boca fossem originados pela ingestão compulsiva de bolo rei. Ele tinha espalhado os seus exércitos, mas o seu consulado estava a chegar ao fim e o Império da Direita corria o risco de desintegração. As hordas de bárbaros anti-Europa e anti-NATO marchavam sobre as suas muralhas e o Messias Costa era a semente da desordem e da anarquia.

Avisados por um sonho contra o Rei Socrates Herodes, que ameaçava cortar a cabeça a todos os primogénitos socialistas que tivessem dito "à política o que é da política, à justiça o que é da Justiça", os socialistas encetaram a fuga para o deserto das presidenciais, sem apoiarem ninguém. E foram sobrevivendo.

Mas não por muito tempo. Meses depois, as mesmas multidões que celebraram o nascimento do Messias, reivindicariam a sua crucificação. Os pretores de Bruxelas cobravam implacavelmente o imposto, reprimindo a pregação anti-austeridade do Messias. E os discípulos comunistas e bloquistas três vezes o negaram. No seu lugar de representante do Império da Direita, Marcelo Pilatos lavava as mãos. Levando a cruz ao seu Calvário, o Messias Costa suava, suava...

II
Neste ponto, António Costa, encharcado em suor, acordou do pesadelo. Num impulso, telefonou para o seu ministro das Finanças, Mário Centeno e perguntou-lhe: "Está tudo bem?". Do outro lado, uma voz ensonada respondia-lhe: «Ó António, desculpa lá, mas porque é que me acordas às três da manhã para me perguntar isso? Estive há bocado na consoada, deitei-me tarde e estava no primeiro sono..."

Em décimos de segundo, o primeiro-ministro reviveu todo o filme, numa sequência de planos fechados: o fim da austeridade, as exigências do Tratado Orçamental, a rutura com os parceiros à esquerda... as eleições antecipadas. Sim, era isso! Eleições antecipadas podia ser a ressurreição ao terceiro dia! Só tinha que garantir que 2016 fosse um ano dedicado a medidas populares, folgando as costas do povo antes da volta do pau!

António Costa voltou a adormecer e, dessa vez, teve sonhos da cor da sua área política. Tudo o que precisava era de fazer alguns milagres. Afinal, há dois mil anos, o outro Messias também recorrera ao mesmo truque. E ainda hoje é venerado.

IN "VISÃO"
17/12/15

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