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Conto (político) de Natal
I
Nas
palhinhas deitado, o Menino Costa era velado pela Virgem Catarina e por
São José Jerónimo. Guiados pela estrela fraturante e defensora dos
direitos das minorias do Bloco de Esquerda, os três Gays Magos
aproximavam-se do estábulo de São Bento...
O caminho tinha sido
longo. A 4 de outubro, os eleitores tinham fechado a porta ao PS e a
esquerda ficara sem local para poder dar à luz o seu pequeno
primeiro-ministro. Perseguida pelos exércitos do Império da Direita,
comandados pelo centurião Passus Coelhus e pelo decurião Paulus Portus, a
Sagrada Família de esquerda não teve outro remédio senão acoitar-se no
estábulo parlamentar, onde, abrigada das tempestades desencadeadas pelas
legiões de Coelhus e Portus, podia, finalmente, descansar e velar o
Salvador.
A certidão de nascimento do Menino Costa, lavrada em
diferentes posições conjuntas, atestava que o filho gerado pela Virgem
Catarina não era de São José Jerónimo - que apenas perfilhava a criança.
Afinal, eles mal se falavam e nunca tinham vivido como marido e mulher.
O Menino Costa era filho de Deus.
Em Roma, o imperador Tibério
Cavacus espumava de raiva. Ou talvez os pequenos pontos de saliva
acumulados aos cantos da sua boca fossem originados pela ingestão
compulsiva de bolo rei. Ele tinha espalhado os seus exércitos, mas o seu
consulado estava a chegar ao fim e o Império da Direita corria o risco
de desintegração. As hordas de bárbaros anti-Europa e anti-NATO
marchavam sobre as suas muralhas e o Messias Costa era a semente da
desordem e da anarquia.
Avisados por um sonho contra o Rei
Socrates Herodes, que ameaçava cortar a cabeça a todos os primogénitos
socialistas que tivessem dito "à política o que é da política, à justiça
o que é da Justiça", os socialistas encetaram a fuga para o deserto das
presidenciais, sem apoiarem ninguém. E foram sobrevivendo.
Mas
não por muito tempo. Meses depois, as mesmas multidões que celebraram o
nascimento do Messias, reivindicariam a sua crucificação. Os pretores de
Bruxelas cobravam implacavelmente o imposto, reprimindo a pregação
anti-austeridade do Messias. E os discípulos comunistas e bloquistas
três vezes o negaram. No seu lugar de representante do Império da
Direita, Marcelo Pilatos lavava as mãos. Levando a cruz ao seu Calvário,
o Messias Costa suava, suava...
II
Neste ponto, António
Costa, encharcado em suor, acordou do pesadelo. Num impulso, telefonou
para o seu ministro das Finanças, Mário Centeno e perguntou-lhe: "Está
tudo bem?". Do outro lado, uma voz ensonada respondia-lhe: «Ó António,
desculpa lá, mas porque é que me acordas às três da manhã para me
perguntar isso? Estive há bocado na consoada, deitei-me tarde e estava
no primeiro sono..."
Em décimos de segundo, o primeiro-ministro
reviveu todo o filme, numa sequência de planos fechados: o fim da
austeridade, as exigências do Tratado Orçamental, a rutura com os
parceiros à esquerda... as eleições antecipadas. Sim, era isso! Eleições
antecipadas podia ser a ressurreição ao terceiro dia! Só tinha que
garantir que 2016 fosse um ano dedicado a medidas populares, folgando as
costas do povo antes da volta do pau!
António Costa voltou a
adormecer e, dessa vez, teve sonhos da cor da sua área política. Tudo o
que precisava era de fazer alguns milagres. Afinal, há dois mil anos, o
outro Messias também recorrera ao mesmo truque. E ainda hoje é venerado.
IN "VISÃO"
17/12/15
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