Portuguese branding.
J’adore.
Foi bonito ouvir o discurso de Carlos do Carmo
aquando da recepção do prémio Grammy que lhe foi atribuído. Não só pelo
seu conteúdo e pelo que representa para a música portuguesa, mas
porque Carlos do Carmo escolheu fazê-lo em português. Um gesto que
deveria ser natural e comum mas que, pela forma enfática como foi
reportado por todos os meios de comunicação, parece apresentar–se como
uma escolha mais rara do que aquilo que se suporia.
Discursar na língua materna perante uma audiência
que não a domina parece dividir opiniões. Por um lado, dificulta a vida
dos que não a compreendem, por outro, afigura-se como forma de enaltecer
a cultura que lhe deu forma. Para o primeiro problema há sempre
resolução. Chama-se tradução simultânea e constitui-se como uma das
melhores formas de entendimento entre discursantes de diferentes
nacionalidades. Para o segundo, ou, melhor dizendo, para quem não
considere que a utilização da língua materna num discurso oficial possa
servir para representar toda uma cultura, não há entendimento possível,
apenas a certeza do recurso a línguas mais universais.
Ao que parece, a norma tem sido a escolha da segunda
via, ou seja, a escolha de discursar noutra língua que não a materna,
de forma a facilitar a vida aos outros e, porventura, mostrar os dotes
de poliglotismo do orador.
O que poderia ser apenas sinal de vaidade de alguns
revela porém algo mais insidioso. Para ilustrar o que pretendo dizer,
conto o que observei aqui há uns dias no metro de Lisboa. Algures na
paragem de metro que agora se intitula Blue Station estava um carrinho a
vender pastelaria típica de Portugal. A música que se ouvia era
portuguesa, o que foi uma óptima surpresa porque, muitas vezes, por mais
português que seja o produto, poucas vezes o mesmo é apresentado com
recurso à produção musical portuguesa.
Curiosa, procurei o nome para esta ideia que pretendia vender sabores portugueses. E, pontaria das pontarias, na Blue Station vende-se «portuguese flavours»*. O que é óptimo saber-se, principalmente para os que falam inglês.
Eu falo inglês. Aliás, gosto tanto da língua
inglesa, que a estudei a fundo. Também gosto muito da língua
portuguesa, que estudei igualmente a fundo. Além disso, mantenho uma
relação afectiva muito forte com a língua a que chamo de «mãe» e que me
serve de medida para tudo o que pretendo exprimir e pensar na vida. Por
isso, tento falar e escrever no melhor português que sei e recorrer às
suas expressões antes de as pedir emprestadas a outras línguas.
Se existe correspondente ao que quero dizer na minha língua, procuro utilizá-lo. Não adiro ao lifestyle se posso converter-me a um estilo de vida mais idiomático. Nem estendo a red carpet
a estrangeirismos quando posso estender a passadeira vermelha a
expressões portuguesas. Para mim, Estação Azul é incomensuravelmente
mais bonito do que Blue Station, mas não sei se não estarei em minoria.
Dada a profusão de estrangeirismos que encontro no dia-a-dia será, com
certeza, mais esquisitice minha do que algo que interesse ou preocupe a
sociedade portuguesa. Mesmo assim, mantenho o que disse.
O marketing português pode achar que uma
marca em inglês é mais apetecível e mais fácil de internacionalizar do
que uma marca em português. Eu acho que mais apetecível do que tudo isso
é uma cultura que não tem vergonha de se mostrar nem medo de se impor.
*O nome da marca foi alterado porque o que se pretende não é
menorizar o seu produto, mas sim apontar uma tendência generalizada.
IN "NOTÍCIAS MAGAZINE"
30/11/14
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