Porque é que dar
gadgets a crianças
pode ser uma má ideia
A App Store da Apple tem dezenas de aplicações para iPad que
ensinam as crianças a ler. Os novos tablets da Samsung têm um modo só
para crianças porque, diz a marca, os filhos são os segundos maiores
utilizadores dos gadgets dos pais. Quem quiser comprar um tablet
específico para crianças, tem diversas opções à escolha.
Os
miúdos mexem naquilo como se fosse um livro de colorir, sem qualquer
dificuldade. É extraordinário e garante entretenimento e jogos
educativos durante horas. Convenhamos, uma ama-seca bem melhor que
deixar os miúdos à frente da televisão durante o tempo que quiserem.
É
tudo fantástico, e tal, mas ultimamente deixou-me a pensar nos impactos
de longo prazo. Tenho visto cada vez mais miúdos pequenos a brincar com
um desses tablets baratos, que corre a Android, enquanto os pais tentam
almoçar. Ou fazer compras. Ou receber amigos em casa mantendo os
"terroristas" entretidos.
Porque é que isto levanta dúvidas, se -
à partida - os benefícios educativos são tremendos? Biologia. E
desenvolvimento de outras áreas do cérebro. O primeiro efeito negativo é
o dano potencial aos olhos das crianças, e o seu envelhecimento
precoce. Os médicos estão preocupados, e os pediatras do Royal College
of Paediatrics and Child
Health(Reino Unido) recomendam
que crianças com idade inferior a três anos não sejam expostas a ecrãs.
Televisão, computadores, consolas, tudo incluído.Isto porque a fase
crítica de desenvolvimento do cérebro ocorre até aos três anos, e é
vital a interacção directa olhos nos olhos - não olhos para ecrã.
Nos Estados Unidos, este estudo avisa para os efeitos negativos da utilização destes meios por crianças com menos de dois anos. Os canadianos dizem que nenhuma criança com menos de dois anos deve ter exposição a ecrãs de qualquer espécie. E depois há esta nova tendência, a de crianças bastante pequenas desenvolverem secura nos olhos.
Não
bastassem estes avisos, que de resto já estão a ser feitos de forma
consistente há alguns anos, há o facto de cada vez mais se substituir a
escrita à mão pelo teclado, físico ou virtual. Podia ser, mas o problema
não é saudosismo: é o facto de a escrita manual ser importante para o desenvolvimento cognitivo, em particular no treino do cérebro em especialização funcional. Além de ajudar a treinar a memória.
E
sem esquecer que esta nossa adicção aos ecrãs contribui para um estilo
de vida mais sentado ou parado. Uma pessoa senta-se no sofá com o tablet
no colo e de repente está ali há uma hora, absorta nos milhares de
links que se seguiram àquela consulta breve do Twitter. A inactividade é
má para os adultos e para as crianças. Ainda é um fenómeno recente,
pelo que pedir estudos de impactos a longo prazo é inútil. E não se
trata de culpar a tecnologia pela aquisição de maus hábitos; trata-se de
reconhecer essa propensão, e fazer algo por isso.
IN "DINHEIRO VIVO"
08/07/14
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