09/01/2014

ANTÓNIO CLUNY

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Direitos humanos,
dignidade e austeridade

Todos sabemos o desprezo a que a vertente humanitária dos documentos internacionais tem sido votada pelos responsáveis da moderna vaga de "políticas de austeridade"

No dia 4 de Dezembro, o Comissário para os Direitos Humanos do Conselho da Europa, Nils Muiznieks, publicou um relevante e circunstanciado relatório sobre as políticas de austeridade e as suas consequências para os direitos humanos. 
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Aí se focam, em pormenor, as políticas de austeridade desenvolvidas no seio da União Europeia, pela troika e pelos governos nacionais.
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Significativamente, depois de descrever e abordar os funestos resultados que tais políticas têm sobre os direitos sociais e culturais, este documento analisa também as suas consequências no domínio dos direitos civis e das liberdades. 
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O relatório alcança por isso uma coerência que raramente se consegue descortinar noutros documentos de organizações internacionais. Esmiúça e expõe as próprias conexões que a restrição de alguns dos mais importantes direitos sociais têm na esfera dos direitos civis, conseguindo realçar assim os dois lados da mesma moeda: os custos sociais e os democráticos de tais políticas. 
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Por exemplo, logra correlacionar o direito à habitação - ou a sua perda - com a violação do direito à privacidade dos cidadãos e das famílias, com a dignidade que deve ser reconhecida a toda e qualquer pessoa. 
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Invoca, também, por outro lado, numa perspectiva dos direitos civis e das liberdades, o problema da redução das pensões a níveis que degradam a dignidade da pessoa humana e relembra a esse propósito a jurisprudência do próprio TEDH (Larioshina vs. Russia, application No. 56869/00, decision of 23 April 2002). 
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Todos sabemos hoje o desprezo a que a vertente humanitária dos documentos internacionais tem sido votada pelos responsáveis pela moderna vaga de "políticas de austeridade". 
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Isso não significa, porém, que não devamos insistir em divulgar todas as tomadas de posição que, fundando-se nas cartas internacionais ou europeias de direitos, permitem questionar a legitimidade democrática ou pelo menos condicionar o alcance mais abrasivo de tais políticas. 
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Essa consciencialização é tão mais importante quanto, em muitos casos, tais políticas não são encaradas, já e apenas, como um mal necessário, e como tal provisório, mas sim como um passo definitivo na reordenação social, política e económica dos países, da Europa e do mundo. 
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Na verdade, depois de apresentadas como meras medidas pontuais e transitórias, tais políticas começam a ser já - mesmo que disfarçadamente - assumidas como um desígnio final e uma "solução justa" para a vida futura das nossas sociedades. 
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Importa, por conseguinte, contrapor-lhes todo o acquis civilizacional que, designadamente na Europa, a humanidade foi capaz de introduzir, desde meados do século xx, na edificação de sociedades fundadas no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. 
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Este princípio, que também funda e legitima o próprio tratado da União Europeia, tem, com efeito, de ser a bitola permanente de aferição da justeza ou da ilegitimidade das leis que pretendem servir de base ao reajustamento social por muitos ambicionado. 
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É partindo pois deste princípio essencial das democracias modernas que o comissário para os Direitos Humanos do Conselho da Europa, Nils Muiznieks, desenvolve toda a sua base analítica e a crítica que tece às políticas de austeridade. 


Jurista e presidente da MEDEL 


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07/01/14

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