Direitos humanos,
dignidade e austeridade
Todos sabemos o desprezo a que a vertente humanitária dos documentos internacionais tem sido votada pelos responsáveis da moderna vaga de "políticas de austeridade"
No dia 4 de Dezembro, o Comissário para os Direitos Humanos do
Conselho da Europa, Nils Muiznieks, publicou um relevante e
circunstanciado relatório sobre as políticas de austeridade e as suas
consequências para os direitos humanos.
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Aí se focam, em pormenor, as políticas de austeridade desenvolvidas
no seio da União Europeia, pela troika e pelos governos nacionais.
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Significativamente, depois de descrever e abordar os funestos
resultados que tais políticas têm sobre os direitos sociais e culturais,
este documento analisa também as suas consequências no domínio dos
direitos civis e das liberdades.
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O relatório alcança por isso uma coerência que raramente se consegue
descortinar noutros documentos de organizações internacionais. Esmiúça e
expõe as próprias conexões que a restrição de alguns dos mais
importantes direitos sociais têm na esfera dos direitos civis,
conseguindo realçar assim os dois lados da mesma moeda: os custos
sociais e os democráticos de tais políticas.
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Por exemplo, logra correlacionar o direito à habitação - ou a sua
perda - com a violação do direito à privacidade dos cidadãos e das
famílias, com a dignidade que deve ser reconhecida a toda e qualquer
pessoa.
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Invoca, também, por outro lado, numa perspectiva dos direitos civis e
das liberdades, o problema da redução das pensões a níveis que degradam
a dignidade da pessoa humana e relembra a esse propósito a
jurisprudência do próprio TEDH (Larioshina vs. Russia, application No. 56869/00, decision of 23 April 2002).
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Todos sabemos hoje o desprezo a que a vertente humanitária dos
documentos internacionais tem sido votada pelos responsáveis pela
moderna vaga de "políticas de austeridade".
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Isso não significa, porém, que não devamos insistir em divulgar todas
as tomadas de posição que, fundando-se nas cartas internacionais ou
europeias de direitos, permitem questionar a legitimidade democrática ou
pelo menos condicionar o alcance mais abrasivo de tais políticas.
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Essa consciencialização é tão mais importante quanto, em muitos
casos, tais políticas não são encaradas, já e apenas, como um mal
necessário, e como tal provisório, mas sim como um passo definitivo na
reordenação social, política e económica dos países, da Europa e do
mundo.
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Na verdade, depois de apresentadas como meras medidas pontuais e
transitórias, tais políticas começam a ser já - mesmo que
disfarçadamente - assumidas como um desígnio final e uma "solução justa"
para a vida futura das nossas sociedades.
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Importa, por conseguinte, contrapor-lhes todo o acquis civilizacional
que, designadamente na Europa, a humanidade foi capaz de introduzir,
desde meados do século xx, na edificação de sociedades fundadas no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
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Este princípio, que também funda e legitima o próprio tratado da
União Europeia, tem, com efeito, de ser a bitola permanente de aferição
da justeza ou da ilegitimidade das leis que pretendem servir de base ao
reajustamento social por muitos ambicionado.
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É partindo pois deste princípio essencial das democracias modernas
que o comissário para os Direitos Humanos do Conselho da Europa, Nils
Muiznieks, desenvolve toda a sua base analítica e a crítica que tece às
políticas de austeridade.
Vale a pena consultá-lo na íntegra: http://www.coe.int/fr/web/commissioner/-/austerity-measures-cross-europe....
Jurista e presidente da MEDEL
IN "i"
07/01/14
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