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Cansados de blogs bem comportados feitos por gente simples, amante da natureza e blá,blá,blá, decidimos parir este blog do non sense.Excluíremos sempre a grosseria e a calúnia, o calão a preceito, o picante serão ingredientes da criatividade. O resto... é um regalo
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Quando, há dias, o primeiro-ministro pediu aos cientistas um “esforço de consensualização”, obteve-o imediatamente. Foi consensual entre os cientistas que o pedido era meio palerma. Em princípio, e como é habitual, os cientistas chegaram a este consenso através da aplicação do método científico: fizeram uma observação, formularam uma hipótese, realizaram uma experiência controlada, analisaram os resultados e retiraram uma conclusão. Significa isto que podemos afirmar, com rigor científico, que o primeiro-ministro fez um pedido meio palerma. Não é todos os dias que temos esta sorte. Incapaz, infelizmente, de aplicar o método científico, peço licença para aplicar o método humorístico (que é parecido) às declarações de António Costa, para ver se chego a uma conclusão semelhante.
Primeiro, começamos igualmente pela observação. Neste caso, observamos que talvez tenha graça ser um homem que ocupa cargos políticos há quase 40 anos a pedir a profissionais de outro ramo que se entendam. É possível que não pertença à classe profissional com mais autoridade para lamentar: “Mas porque é que vocês não conseguem concordar?”
Em segundo lugar, formulamos uma hipótese: será que o primeiro-ministro deseja, na verdade, ter alguém a quem responsabilizar pelas suas próprias opções, um bode expiatório que possa arcar com as culpas se as coisas não correrem bem? A seguir, fazemos uma experiência. Experimentamos pesquisar no Google se, quando as coisas corriam bem, o Governo atribuía algum mérito à ajuda inestimável dos cientistas, e ao seu útil consenso. Feita a experiência, concluímos que é difícil, em ciência, falar de consenso, uma vez que se trata de uma forma de conhecimento que se verifica a si própria, se vai colocando em causa e, por isso, consensos de ontem vão sendo substituídos por consensos de hoje, à medida que dados novos vão sendo conhecidos – e é assim que se vai avançando. Além disso, numa situação como esta, estão em causa várias áreas do conhecimento, e é natural que, quando a manta tapa a cabeça dos epidemiologistas, destape os pés dos economistas e, quando cobre os pés dos sociólogos, descubra a cabeça dos intensivistas. E, portanto, podemos concluir que, de facto, o pedido era meio palerma. E ainda, e talvez mais importante, que conhecimento científico e conhecimento humorístico são áreas do saber de prestígio equivalente. Fico a aguardar o meu PhD.
IN "VISÃO" - 02/03/21
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