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Que má sorte tem Medina
Trazer mais famílias da classe média para a cidade, requalificar os
transportes públicos, resolver o problema do estacionamento, garantir
rendas acessíveis... Todos os slogans são bons para Fernando Medina, o
presidente da Câmara com tempo de antena semanal garantido num canal de
televisão e numa rádio. Mas tem pouca sorte, o senhor autarca, que
parece que não há coisa que lhe corra bem.
Nem sequer falo da
modificação que fez de Lisboa uma cidade mais bonita aos olhos dos
turistas - sim, tornou-se quase impossível para quem cá vive, mas todos
queremos mais estrangeiros a visitar-nos e isso é que é prioritário.
Quem cá está sempre, adapta-se, ora bolas. E já basta o trauma que os
pobres desgraçados têm de passar num aeroporto a rebentar pelas
costuras, que felizmente não é preocupação que Medina tenha de incluir
na sua agenda - afinal, o que é que o presidente da Câmara tem que ver
com o que se passa no local onde desembarcam 80% dos estrangeiros que
vêm experimentar Portugal?
Também não me refiro ao caso da semana
que deixou em fúria os lisboetas automobilizados que têm pesadelos
recorrentes não só com o trânsito mas também com o estacionamento -
entendo perfeitamente que nem todos podem ter estatuto de popstar que
lhes garanta lugar à porta e com desconto de 25%. Não vi nenhum
alfacinha sentido por não ter recebido em casa os cumprimentos do senhor
presidente da Câmara depois de ter ido ao Ritz dar as boas vindas a
Madonna, porque hão de reclamar agora esse tipo de atenção? Não se pode
andar por aí a dar borlas a quem simplesmente vive na cidade - o que
seria! -, que a EMEL tem muitos salários para pagar e precisa de
financiar a tinta para marcar os lugares que ainda ontem eram para todos
e garantir a manutenção dos parquímetros.
Mas Medina tem pouca sorte. Por exemplo, aquele concurso pela
publicidade de Lisboa nos próximos 15 anos podia ter corrido sem
espinhas, apesar de ter arrancado com um atraso de mais de um ano. Mas
uma simples mudança de opinião e é ver os ingratos vencidos a correr
para o tribunal com gritos de "ilegalidade e falta de transparência"
para contestar a forma como a câmara liderou o processo.
E houve
aquela obra urgente e inadiável da Segunda Circular com jardim ao meio
que teve de ser metida na gaveta à espera de melhor oportunidade só
porque surgiram umas suspeitas de conflito de interesses. Claro que
agora, que Medina passou esta pasta das obras em Lisboa para uma empresa
municipal com o arquiteto Manuel Salgado à cabeça, já deve avançar tudo
sem mais problemas, que as decisões da Sociedade de Reabilitação Urbana
dispensam discussão e escrutínio dos vereadores eleitos pelos
lisboetas...
Mas dizia eu que parece que Fernando Medina anda com
olho gordo em cima. Basta recordar aquele caso do leilão de casas em que
os preços triplicaram e não eram de rendas controladas, mas deviam ter
sido, e que foi preciso anular mas não se podia, e acabou numa
embrulhada tão grande que até deu origem a uma Associação de Lesados de
Medina com o advogado Sá Fernandes a juntar-se à causa dos que achavam
que iam ter uma casa - porque até tinham ganho a licitação - mas afinal
não tiveram.
É que não há tolerância nenhuma... Veja-se o que
aconteceu com a Taxa de Proteção Civil. É certo que os lisboetas se
revoltaram com aquilo e até houve vários avisos de que a coisa tinha
contornos bastante irregulares - que não era taxa, era imposto, e a
esses a autarquia não pode recorrer para se financiar. Mas foi azar
obrigarem Fernando Medina a devolver os 58,6 milhões de euros aos
munícipes, que já deviam estar prontinhos para ser usados num projeto
útil para a cidade como aquele jardim maior do que o da Estrela que a
câmara quer fazer em plena Praça de Espanha.
Com tantas e tamanhas trapalhadas, quero acreditar que só pode ser uma grande dose de má sorte...
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
05/07/18
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