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HOJE NO
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No maior departamento de cirurgia do país, toda a gente se chegou à frente
Há uma linha da frente no combate à covid-19 e depois
há todos os outros batalhões, dentro de um hospital, que “perderam”
camas para alargar a resposta direta à pandemia e fazem contas à quebra
nos outros doentes. No departamento de cirurgia do Hospital de Santa
Maria, o maior do país, as operações programadas baixaram para metade em
março. O diretor, João Coutinho, diz que o que custa mais é os doentes
não poderem ter visitas. A maior preocupação? Que nenhum elemento tombe
com o vírus.
No longo corredor no sétimo piso do Hospital de Santa Maria, onde
costumava fervilhar o entra-e-sai dos blocos operatórios, vê-se apenas
uma bata verde. “Só ao domingo é que isto estava assim”, diz João
Coutinho, diretor do departamento de cirurgia do Centro Hospitalar
Lisboa Norte.
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É como se fosse domingo há várias semanas e os balanços
vão-se fazendo, num tempo em que o regresso à normalidade ainda parece
distante, mas há planos para começar a recuperar listas de operações e
consultas que ficaram por fazer nas últimas semanas. Numa das salas de
cirurgia está a ser operada uma doente com cancro da mama, dos casos
inadiáveis. O médico da bata verde é anestesiologista, um dos veteranos
da casa. Como João Coutinho, a um ano da reforma. Continua, como outros
colegas da mesma geração, nesta outra linha da frente da epidemia,
porque há doentes que continuam a ser operados e também pessoas com
diagnóstico positivo de covid-19 a precisar de uma cirurgia.
O departamento de cirurgia do Centro Hospitalar Lisboa Norte é o
maior do país, diz João Coutinho, que fala com orgulho do serviço, antes
da pandemia e agora, apesar das contingências. O departamento
incorporou a cirurgia 1 e 2 do Santa Maria e a cirurgia do Pulido
Valente, dedicada à cirurgia de ambulatório. São 74 cirurgiões, 18
internos de especialidades de cirurgia geral, mais as restantes
especialidades como otorrino, oftalmologia e ginecologia, e internos que
chegam anualmente de Moçambique e de outros países, além das equipas de
enfermagem, auxiliares e técnicos. Não se esquece de elogiar ninguém
agora que, em 36 anos de casa, passaram pela maior transformação de que
tem memória no hospital. “É uma mudança terrível. Mas, vendo bem, foi
uma mudança bem estruturada, com cabeça, houve formação de grupos de
trabalho, e cada um tomou conta da sua área, o que ajuda a explicar o
êxito de Santa Maria em relação à covid-19”.
Os efeitos colaterais na quebra da atividade normal são
incontornáveis, mas a gestão tem procurado ser criteriosa. Tinham 93
camas nas enfermarias e UCI para os doentes em pré e pós-operatório e
“perderam” a grande maioria para as áreas dedicadas à covid. O verbo é
esse, mas a necessidade de que foi preciso concentrar a resposta no
embate contra a pandemia foi consensual. “Custa”, confessa o diretor de
serviço. Ficaram 35 camas na cirurgia 2, no piso 5, o que diminui por si
só a capacidade para internar doentes - logo, também para os chamar
para operação, e essa é uma das dificuldades, além da orientação geral
para que fossem suspensas as cirurgias não urgentes, entretanto
revogada. Em fevereiro, o serviço tinha feito 186 operações programadas
e, em março, caíram para 93 - os números de abril ainda não estão
fechados, mas a recuperação não foi possível nas últimas semanas e havia
a expetativa de que pudesse começar gradualmente nos últimos dias do
mês. Nas consultas, a quebra ainda é maior. “Fazíamos 2046 consultas e
passámos para 500, é um rombo enorme”, diz João Coutinho.
* Como utentes do HSM só temos que dizer bem, não por haver só casos de sucesso mas porque o atendimento profissional versus doente foi sempre bom apesar de alguma morosidade no atendimento em algumas situações. Estamos mesmo muito gratos aos profissionais do hospital.
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