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Cansados de blogs bem comportados feitos por gente simples, amante da natureza e blá,blá,blá, decidimos parir este blog do non sense.Excluíremos sempre a grosseria e a calúnia, o calão a preceito, o picante serão ingredientes da criatividade. O resto... é um regalo
19/01/2021
RUI TAVARES GUEDES
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O que foi que não vimos?
Como sabemos, as mentiras duram mais tempo do que o mentiroso. Trump pode desaparecer, mas o trumpismo vai continuar
Há mais de 100 anos, H. G. Wells, o autor britânico que gostava de tentar adivinhar o futuro e olhava para o exercício da profecia com um espírito científico, escreveu algo que merece, mais do que nunca, ser lembrado nos dias de hoje: “Tudo o que vai acontecer já está à vista – desde que se tenha olhos para o ver.” Sabendo que seria impossível prever tudo o que possa ocorrer, o homem que, mesmo assim, visionou a existência da televisão, do laser e da engenharia genética, entre outros avanços tecnológicos, deixou um alerta para quando nos sentimos surpreendidos com algo com que não contávamos: “Em vez de perguntar ‘quem poderia ter pensado nisso?’, temos antes de nos questionar sobre ‘o que foi que não vimos?’”
Quando, no dia 6 de janeiro, perante a invasão do Capitólio por parte dos apoiantes de Trump, muitos ficaram surpreendidos com o estado a que chegou a democracia americana, é a essa pergunta de H. G. Wells que deviam ter recorrido, em primeiro lugar: o que foi que não vimos? Mas não só. Também poderiam ter questionado o que foi que não leram, o que foi que não ouviram, por que razão, apesar de tantos avisos, se recusaram a acreditar no que estava mesmo a ocorrer à frente dos seus olhos, insistindo em olhar para o lado.
A verdade é que, durante quase quatro anos, foram muitos os que cederam à tentação de “normalizar” Donald Trump, aceitar todos os seus ataques à democracia como se fossem simples retórica e acreditar que a sua insistência na descredibilização das instituições era apenas produto de um espírito maníaco e egocêntrico – mas cujo perigo terminava aí, sem consequências mais graves.
A partir de certa altura, em muitos outros países, houve também quem começasse a ganhar notoriedade por seguir, exatamente, as pisadas do homem instalado na Casa Branca, replicando, com o mesmo grau de mentiras, copiando a mesma ânsia de ir contra o “sistema” e a mesma escolha de “inimigos”. Sempre com o objetivo de provocar divisões, estimular a raiva e abalar o próprio conceito de verdade, como se todos os números e evidências que alguém apresentasse – fosse ele um eminente académico, um especialista reconhecido ou uma instituição insuspeita – fossem fruto de uma qualquer cabala ou de uma conspiração oculta e terrível perpetrada por mentes obscuras.
No entanto, apesar de tudo o que foi ocorrendo – e tantas vezes denunciado por jornalistas e organismos independentes –, no dia em que, após semanas a gritar que lhe tinham roubado as eleições, Donald Trump fez ouvir a sua voz para incitar à invasão do Capitólio, ainda houve muitos a fazer a “outra” pergunta de H. G. Wells: “Quem é que poderia ter pensado numa coisa destas?”
Quando existem dezenas de milhões de americanos que continuam a concordar com a invasão do Capitólio, porque acreditam que as eleições foram “roubadas”, é porque o grau de alienação e de crença em verdades-alternativas já ultrapassou todos os limites. Significa acreditar, por exemplo, que milhares de funcionários, dirigentes administrativos, líderes políticos de vários partidos e juízes conspiraram entre si, num país com 50 estados, para viciar os resultados de uma eleição.
Como sabemos, as mentiras duram mais tempo do que o mentiroso. Trump pode desaparecer, mas o trumpismo vai continuar. Basta olhar à nossa volta para o perceber…
IN "VISÃO" -14/01/21
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MIGUEL CARVALHO |
A história não contada de Ventura
em Bragança e o vídeo do
cigano que, afinal, não o é
Foi na noite de sábado, 16, que o Chega ensaiou o seu momento “não racista” de campanha eleitoral. Na sede de candidatura em Bragança, loja emprestada ao partido pelo empresário e apoiante Norberto Garcia, André Ventura anunciou a presença de elementos da etnia cigana como “exemplo” da abertura da formação política que lidera.
“O Chega quer é que todos tenham de cumprir a lei da mesma forma, por isso este apoio é particularmente importante”, explicou, rodeado de Fátima Gomes, dona de uma roulotte de comida rápida na capital do nordeste transmontano, e do sobrinho Natanael André. “Temos elementos da comunidade cigana que nos apoiam e compreendem a importância da nossa mensagem. É um orgulho muito grande que façam parte da equipa distrital”. Nas redes sociais, o candidato partilhou até um tweet onde relevou “o apoio de dois membros da comunidade cigana local porque trabalham, pagam impostos e não se revêem no comportamento genérico da comunidade”.
Na ocasião, Fátima Gomes demarcou-se dos comportamentos que atribui aos próprios ciganos: “Não sigo os ideais da etnia, eu sou completamente diferente. Embora seja da etnia, não me revejo nalgumas coisas da cultura e da vida deles”, adiantou. Exemplos? “Não trabalhar, a falta de higiene, viver em barracas”. Para ela, as tradições não servem para governar a vida, embora critique a sociedade quando impede a integração dos ciganos. Ao seu lado, Natanael concordou que era preciso “todos trabalharem para o País andar para a frente”.
A tia e o sobrinho, entretanto, já se arrependeram do breve momento de fama.
Fátima Gomes publicou nas redes sociais um pedido de desculpas pelas ofensas involuntárias, considerando ter existido “um mal-entendido”.
O caso de Natanael é mais bicudo: num vídeo pessoal gravado horas depois do sucedido – embora circule uma versão curta, a VISÃO acedeu à versão completa, de cinco minutos – confessa, afinal, que não é cigano e garante que “em nenhum momento” se identificou como tal. Nascido em Portugal e criado em Madrid, Natanael garante ter sido convidado a aparecer na sede quando “já estava na cama”. E relata: “O segurança do senhor Ventura agarrou-me pelo braço e meteu-me lá dentro (…) Entrei porque me agarraram”. Depois, sim, manteve-se no local “de livre vontade”. Pedindo desculpa aos ciganos por toda a polémica criada, confessa ter muitos amigos daquela etnia, alguns dos quais, admite, até já estiveram com ele na cadeia. “Não quero ofender nenhum tipo de etnia”, garante, depois de ter recebido mensagens ameaçadoras. “Não sou esse género de pessoa, para mim somos todos iguais”. Confessando-se distante da política, Natanael André admite: “O que gosto é de fumar um porro [charro] de erva e estar com os amigos tranquilamente”. No vídeo, assume não ter recebido qualquer contrapartida financeira para aparecer ao lado de André Ventura. “Oxalá me tivessem pagado”, admite. “Se soubesse antes que ia ter mil pessoas a ameaçarem-me no Facebook, teria pedido cinco mil euros…”.
O “patrão” das discotecas
A sede de candidatura de André Ventura em Bragança, onde ocorreu o polémico momento “cigano”, tem, contudo, outra curiosidade.
A loja foi emprestada ao partido pelo empresário do imobiliário Norberto Lopes Garcia, apoiante do Chega e amigo do líder da distrital do partido, José Júlio Vaz Pires, antigo presidente de junta de freguesia do PSD em Bragança, e pelo filho Telmo Garcia, dono das três discotecas da cidade: Mercado Club, Moda Café e Club Havana. “A loja estava vazia há bastante tempo, os dirigentes do Chega comprometeram-se a limpar aquilo tudo e cedemos o espaço por um mês, sem custos. Foi bom para todos. Mas se fossem mais meses, já não dava. Não há almoços grátis”, assume Telmo Garcia à VISÃO.
MIGUEL CARVALHO-GRANDE REPÓRTER
IN "VISÃO" 18/01/21
* Hitler foi eleito com o voto dos descontentes, esse voto provocou 60 milhões de mortos.
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* Este episódio tem alguns defeitos de sonorização.
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𝑆𝐼𝑁𝑂𝑃𝑆𝐸: