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"DIÁRIO DE NOTÍCIAS
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Glenn Greenwald:
"Noutro país seria impensável
Sergio Moro não se demitir"
O jornalista norte-americano, apesar das ameaças de morte e pressões governamentais "comparáveis às sofridas no Caso Snowden", aceitou falar ao DN através de mensagens do aplicativo Whatsapp sobre a "Vaza-Jato". Garante que tem "muito mais material para divulgar" e acusa Bolsonaro de não se importar "nem um pouco com corrupção"
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O Brasil foi abalado nos últimos dias pela divulgação na imprensa de
mensagens trocadas entre Sergio Moro e os procuradores da Lava-Jato,
recolhidas por um hacker, que provam a existência de conluio entre o
juiz da Lava-Jato e a acusação contra investigados da operação,
nomeadamente o entretanto condenado - pelo ex-juiz e agora ministro da
Justiça - Lula da Silva.
Pelo teor das mensagens, cuja divulgação
ganhou o epíteto "Vaza Jato", ficou a saber-se, por exemplo, que os
procuradores achavam as provas contra o antigo presidente frágeis e que o
juiz Moro, a quem seria exigida equidistância, não só ajudava como
nalguns momentos até comandava a investigação.
Além de juízes do
Supremo Tribunal Federal simpáticos à Lava-Jato também serem envolvidos
na estratégia, Moro fala, a determinada altura, em usar a imprensa a
favor da operação e, portanto, contra Lula, que acabaria preso e
impedido de concorrer às eleições de 2018, ganhas por Jair Bolsonaro.
O presidente da República, que entretanto convidou Moro para o seu
governo, vem defendendo o seu ministro da justiça enfaticamente. Mas a
oposição quer levar o ex-juiz a uma Comissão Parlamentar de Inquérito,
os editorialistas dos principais jornais brasileiros exigem a sua
demissão imediata e pesquisas de opinião indicam que a popularidade de
Moro foi manchada.
No centro da "Vaza Jato", está a versão brasileira do site americano The Intercept,
fundado por Glenn Greenwald, o vencedor do prémio Pulitzer, a mais alta
distinção jornalística nos Estados Unidos, depois de divulgar o caso em
torno das fugas de informação do ex-agente da CIA Edward Snowden, que
abalou as estruturas da Casa Branca e de Downing Street de 2013 até
hoje. O próprio Greenwald co-assina as reportagens sobre aquilo a que
ele chama de "corrupção dentro da Lava-Jato" protagonizada por Moro.
O
jornalista norte-americano, apesar das ameaças de morte e pressões
governamentais "comparáveis às sofridas no Caso Snowden", aceitou falar
ao DN através de mensagens do aplicativo Whatsapp sobre a "Vaza-Jato". E
garantiu que vem mais por aí.
Como acha que as divulgações do The Intercept Brasil refletem na imagem do ministro Sergio Moro?
Acho que a perceção da população sobre o Moro já mudou. Nos seis dias
que passaram desde que começámos a divulgar as reportagens, duas
pesquisas mostraram, com números relativamente parecidos, que a
popularidade e a aprovação dele já caíram dez pontos percentuais, mas,
como é óbvio, como ele ficou durante os últimos cinco anos, com a ajuda
dos grandes órgãos de comunicação social, a construir a sua imagem nada
vai mudar radicalmente numa semana.
Mas ainda vem aí mais material potencialmente danoso para Moro?
Além de nós termos muito mais material que vamos publicar sobre ele, já
estamos vendo os aliados dele na grande comunicação social brasileira a
abandoná-lo - como a [revista] Veja, que disse muito claramente que ele
violou a lei, ou o Estadão [jornal O Estado de S. Paulo], que disse que
ele deveria renunciar. Isso é muito significativo porque são veículos de
centro-direita que o apoiaram por muitos anos e que estão a chegar à
conclusão que ele fez coisas totalmente erradas. A população mais
desligada da política vai demorar um pouco mais tempo a ter a mesma
perceção mas acabará por tê-la.
O seu marido [David Miranda, deputado do PSOL, partido de esquerda] afirmou ter recebido ameaças.
Sim, nós recebemos muitas ameaças. O meu marido já denunciou uma,
particularmente feia, ameaçando os nossos filhos, a nossa família, e eu,
o tempo todo, estou a sofrer ameaças pelo meu e-mail, assim como o meu
marido.
São pressões comparáveis às que recebeu durante o Caso Snowden?
Sim, as pressões parecem-se muito com o Caso Snowden, quando o governo
norte-americano e o do Reino Unido estavam a toda a hora afirmando que
nós éramos criminosos, simplesmente porque estávamos informando graças a
uma fonte que eles achavam que roubara documentos. Agora, passa-se a
mesma coisa com o ministro Moro, a chamar-nos constantemente de aliados
de hackers. São muitas ameaças, em suma: ameaças de morte,
principalmente anónimas, mas também ameaças do governo, tentando
pressionar-nos e espalhando que nós somos criminosos só porque estamos a
fazer jornalismo.
A Lava-Jato não é positiva para o Brasil? É contrário à operação?
Ninguém pode levantar essa acusação de que sou contra a Operação
Lava-Jato porque em 2017 eu fui como palestrante a um evento no
estrangeiro que atribui 100 mil dólares a pessoas que lutam contra a
corrupção e entre os três finalistas estava a task force da
Lava-Jato. Nessa altura, a esquerda em geral e os petistas [apoiantes do
PT, partido de Lula da Silva ou Dilma Rousseff] em particular
pressionaram-me a boicotar o evento mas eu fui mesmo assim e defendi e
elogiei a operação.
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O procurador Deltan [Dellagnol] e outros três ou
quatro membros da Lava-Jato viajaram também, acabando por não ganhar - a
vitória foi para um jornalista do Azerbaijão. Mas o que quero destacar é
que ele, o Deltan, publicou nas suas redes sociais o meu discurso e
disse que "o renomado jornalista Glenn Greenwald fez um discurso muito
importante sobre o nosso trabalho na Lava-Jato".
Então, considera-se a favor dela?
Também ninguém pode dizer que eu sou contra a Lava-Jato porque sou de
esquerda, etc., até porque eu já apoiei muitas pessoas de direita
também. O que eu acho é que nós estamos fortalecendo a Lava-Jato e a
luta contra a corrupção porque estamos revelando a corrupção dentro da
própria Lava-Jato. Esse lado da operação precisa ser limpo para, dessa
forma, o processo da Lava-Jato vir a ter mais integridade e
credibilidade.
Nos Estados Unidos, o seu país de origem,
acreditam que um juiz que toma partido num processo desta sensibilidade
seria obrigado a demitir-se?
É impensável noutros países que qualquer juiz apanhado a fazer as coisas
que Moro fez consiga manter-se em qualquer cargo público, muito menos
um cargo público com tanta importância como o de ministro da justiça,
mas obviamente o [presidente Jair] Bolsonaro não se importa nem um pouco
com corrupção, ele e a família dele são bem ligados a milicianos, já
temos muitas provas sobre isso. E, mais ainda, o Moro é muito importante
para a legitimidade do governo Bolsonaro.
Ainda acredita na demissão de Moro?
Vamos ver o que vai acontecer depois de divulgarmos mais coisas de tudo o
que Moro fez, se ele pode sobreviver, mantendo-se num cargo público. A
grande comunicação social brasileira, que ficou cinco anos aplaudindo-o,
festejando-o, homenageando-o, agora virou, isso mostra que o futuro
dele não é muito otimista e que a imagem dele já foi muito manchada com
as divulgações já conhecidas.
BI
Glenn Edward Greenwald
Nasceu há 52 anos em Nova Iorque
Notabilizou-se
por ter liderado, a partir de 2013, a série de reportagens do Caso
Snowden, que abalou a NSA, agência de segurança norte-americana, em
colaboração com o jornal britânico The Guardian e o jornal americano The Washington Post
Venceu, na sequência, os prémios Pulitzer e George Polk, os mais prestigiados dos Estados Unidos
Foi personagem do filme "Snowden", de Oliver Stone
Mora no Rio de Janeiro
É
casado desde 2005 com David Miranda, deputado do PSOL em substituição
de Jean Wyllys, que abdicou do mandato por ameaças. O casal adotou dois
filhos
* Talvez se venha a provar que Moro merece mais estar na prisão do que Lula da Silva, ficaría mos satisfeitas.
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