Saia justa
Neste momento, os dados disponíveis nos EUA e Europa apontam para o sucesso da opção política adotada. A economia cresce a ritmos saudáveis, o mercado de trabalho revela pujança. Apenas a inflação desilude.
No auge da crise financeira, as autoridades monetárias nos EUA e área
do euro, confrontadas com o mau funcionamento do mecanismo de
transmissão da política monetária, decidiram adotar medidas
não-convencionais; concretamente, programas de aquisição de ativos
financeiros. Assim, os bancos centrais concretizaram o seu objetivo de
redução das taxas de juros ao longo do espectro temporal e asseguraram a
repassagem a toda a economia. Segundo o Banco Central Europeu (BCE), o
alargamento do programa de compra de ativos a dívida de empresas
justificou-se pela necessidade de baixar custos de financiamento
imediatamente para as empresas com melhor qualidade creditícia, forçando
o contágio às restantes classes de risco.
Neste momento,
os dados disponíveis nos EUA e Europa apontam para o sucesso da opção
política adotada. A economia cresce a ritmos saudáveis, o mercado de
trabalho revela pujança. Apenas a inflação desilude. A recente subida de
preços afigura-se temporária e as projeções apontam para revisões para
baixo. Com base num enquadramento macroeconómico favorável, a Reserva
Federal (Fed) interrompeu o programa de compras (2014) e iniciou o ciclo
de subida de taxas diretoras (2015), discutindo agora os próximos
passos, os quais poderão incluir a redução do balanço - ou seja,
abandono do reinvestimento dos fundos associados aos reembolsos. Até
agora, o movimento de normalização da política monetária nos EUA, muito
embora tenha conduzido à expetável subida de taxas de juros ao longo das
várias maturidades e redução da inclinação da curva de rendimentos, não
provocou perturbação no mercado.
Na
Europa, o processo de normalização da política monetária está mais
atrasado (também foi inaugurado mais tarde). Por outro lado, a execução
do programa defronta-se com desafios específicos de execução. O BCE
autolimitou as compras por título ao máximo de um terço do saldo vivo.
Em países com menos dívida transacionável ou reduzidas necessidades de
financiamento, esta restrição já se tornou ativa. No caso português, o
BCE parece ter encontrado um equilíbrio estável - realiza compras
mensais que correspondem a cerca de um terço das emissões médias
mensais. As autoridades monetárias inclinam-se para a manutenção do
programa além de 2017, trilhando um caminho caracterizado pela
minimização do fator surpresa. Por conseguinte, o abandono de medidas
não-convencionais antecipa-se como progressivo e bem comunicado. Não
obstante estas preocupações, o BCE confronta-se com desafios
operacionais significativos no caminho da normalização. Com efeito, nos
últimos dois meses emergiram sinais que o limite de compras terá
começado a ser ativo na Alemanha. Doravante, o banco central poderá
debater-se com escassez de títulos também no universo das maiores
economias da área do euro, circunscrevendo a extensão do programa. Outro
desafio relevante consiste em garantir suficiente gradualismo na subida
de taxas, evitando uma apreciação fulgurante do euro, a qual poderá pôr
em perigo a consolidação da recuperação económica. Convém igualmente
não olvidar que o presente sentimento pró-reformista muito beneficia do
sólido crescimento da economia, sendo imprevisíveis as consequências de
um súbito arrefecimento económico nas propostas reformistas em discussão
e implementação.
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
20/07/17
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