.
Nostalgia
Aprendi a ler jornais com o JN: grande demais para o meu tamanho, espalhava-o em cima da mesa de jantar. O meu pai dizia que comprava o Notícias por ser aquele que dizia mais verdades (estávamos longe do 25 de Abril!): para além da necrologia, escapava à censura por se focar na informação regional e local, sobre as suas pessoas e as instituições concretas (incluindo, digo eu, um relato exaustivo dos jogos de futebol, à 2.ª feira, com que me deleitava e, de caminho, aprendia a geografia da região). Obrigado, por profissão, a viajar pela Região, o JN permitia, ao meu pai, manter-se a par do que se ia passando nos seus vários cantos e, assim, poder ser, em cada povoação, como que um deles. Essa capacidade de dar à estampa as situações concretas, vividas, é um fator distintivo do JN, que se mantém e o vende: arrepiou-me saber que a nova administração se preparava para acabar com os verdadeiros “olhos e ouvidos” locais, fatores de tal diferenciação.
No dia em que escrevo, o JN, tal como o DN e O Jogo, não estão nas bancas, corolário da greve, de ontem, no Global Media Group (GMG), dia em que a TSF se limitou a passar música e os sites daqueles jornais não foram atualizados (não sei se o mesmo se passou com o Açoriano Oriental, também pertença do GMG). Enquanto isso, sinal dos tempos, a edição online está, hoje, totalmente ativa.
O GMG atravessa uma situação complicada, refletindo, diz quem sabe, sucessivos erros de gestão, incapaz de antecipar, e responder, aos desafios que a evolução tecnológica e as redes sociais colocam aos media e, em particular, aos jornais. Não nos enganemos: a saída nunca seria fácil; os erros tornam tudo mais difícil.
Não sei se haverá uma solução integrada para o GMG. Não sei o suficiente para dizer se há vantagens em estar tudo agregado num grupo (se haverá economias de escala e de gama, em “economês”). Numa perspetiva regional, talvez se possa escrever direito por linhas tortas: talvez a ameaça do encerramento do JN possa ser o toque a rebate que o Norte precisa para se mobilizar, por esta e outras causas. Quem sabe?!
* Economista,professor universitário
IN "DINHEIRO VIVO" -13/01/24.
Sem comentários:
Enviar um comentário