.
.
A crise na habitação e
Habitação. Comecemos pela habitação.
Avanços nas questões da mobilidade
IN "ESQUERDA"
17/01/20
.
.
A crise na habitação e
a mobilidade em Lisboa
Quando fazemos o balanço de dois anos de mandato do Bloco de Esquerda na Câmara Municipal de Lisboa e, por isso, não podíamos deixar de falar dos maiores problemas da cidade: a crise na habitação e a mobilidade.
Habitação. Comecemos pela habitação.
A crise na habitação em Lisboa está descontrolada. O preço médio por
metro quadrado atingiu valores especulativos (3154 €/m2) e, de acordo
com a equipa do investigador João Seixas, a taxa de esforço para compra
de casa na capital entre 2016 e 2018 subiu de 38% para 58%, sendo que no
arrendamento já atinge os 67%.
A crise é o resultado da tempestade perfeita criada pela financeirização
do mercado imobiliário, lei das rendas do CDS-PP, vistos gold, regime
fiscal para residentes não habituais, crescimento desregulado do
alojamento local (AL), benefícios fiscais para habitação, venda do
património público a preços especulativos e total falta de intervenção
do Estado. É um pesadelo liberal que só se resolve com regulação e
habitação pública.
Em 2017 já sabíamos que a crise na habitação era o grande tema do
mandato. Por isso, no acordo que assinámos com o PS para a governação da
cidade impusemos medidas que respondem aos problemas de quem vive em
Lisboa, garantindo um Programa de Renda Acessível Público, que tem em
conta os rendimentos das famílias, garantindo casas que as pessoas podem
pagar. Ao contrário do programa do governo, que deixa de fora mais de
70% da população de Lisboa, e contrariando o programa do PS para Lisboa,
assente no pilar privado, o que é um erro.
Já foram disponibilizadas, em 2019, 120 casas através do Programa de
Renda Acessível Público e estão negociadas muitas outras que têm de
estar prontas já em 2020.
O programa público tem avançado e mantemos a crítica ao Programa de
Renda Acessível Pilar Parceria Pública Privada que o Tribunal de Contas
chumbou por considerar ser uma Parceria Público Privada (PPP), que nem
sequer cumpria as regras das PPP e apresentava "vantagens contratuais”
para os privados e "uma repartição de riscos desfavorável para o ente
público".
A lógica do programa é a seguinte: os privados constroem em terrenos
públicos e ficam com a renda acessível de 70% do prédio. Mais ainda,
ficam com 30% das frações para venderem ao preço que quiserem,
alimentando a especulação imobiliária. Esta PPP é uma dupla renda aos
privados, com prejuízo para o Estado e para todos os lisboetas.
Infelizmente, há mais más notícias. António Costa alterou
recentemente a Lei das PPP para garantir que os novos projetos de
Fernando Medina não são apanhados no crivo do Tribunal de Contas.
Mariana Abrantes de Sousa, uma das mais experientes especialistas
portuguesas em PPP, já veio dizer que “nova lei das PPP facilita o
descontrolo” nas contas públicas. O favor de António Costa a Fernando
Medina vai pagar-se caro e os portugueses têm má memória de várias PPP
ruinosas para o Estado.
A crise de habitação só se resolve com arrendamento público a preços acessíveis
Por isso, devemos ser claros: a crise de habitação só se resolve com arrendamento público a preços acessíveis.
Negociámos muito as questões da habitação e, por isso, Orçamento da
Câmara deste ano tem previstos 99 milhões de euros para as políticas de
habitação do município. São medidas essenciais, como o programa de renda
acessível público, o subsídio municipal de renda, os concursos como o
habitar o centro histórico ou a reabilitação dos bairros municipais.
Mantemos o objetivo do mandato de chegar a 3200 casas para o programa
de renda acessível público e reabilitação de 2800 fogos municipais. E
não aceitamos que Fernando Medina não execute as obras que estão
previstas e orçamentadas.
Já o disse, para controlar a crise na habitação é também necessário
regular o Alojamento Local. Este foi um combate muito duro, dos mais
duros talvez.
O acordo entre Bloco e o PS garantiu que, no primeiro dia em que a
lei o permitiu, foram suspensas as licenças nas zonas que atingiram os
20% de Alojamento Local: Bairro Alto, Bairro da Madragoa, Castelo,
Alfama, Mouraria, Colina de Santana e Graça.
Durante um ano foi feito o trabalho de estudo e preparação do novo
regulamento e o Bloco apresentou a sua posição de princípio: interdição
do aumento do número total de registos de alojamento local na cidade;
suspensão imediata de registos nas zonas do centro mais sobrecarregadas;
Interdição de atribuição de novos registos nas zonas em que mais de 10%
das casas existentes estejam entregues ao turismo; concessão de um
registo numa zona não interdita só quando encerrar um registo na zona
interdita; constituição de um gabinete imparcial de fiscalização do
setor.
O Partido Socialista apresentou uma proposta de regulamento que não
defendia o direito à habitação e, por isso, o Bloco fez uma nova
proposta com duas condições:
-
Tinha de existir um Gabinete de fiscalização e resposta rápida aos
problemas associados a estes estabelecimentos, que protegesse os
munícipes, titulares de licenças e hóspedes de problemas de ruído,
higiene ou licenciamentos.
-
Fim da mega zona excecionada às regras existentes - quando esta já
atingia os 32% de alojamento local - nas zonas da Baixa, Avenida da
Liberdade e Avenida Almirante Reis.
Assim, Lisboa foi o primeiro município do país a regular o Alojamento
Local para proteger o direito à habitação. Mantemos que é preciso
monitorizar o que se está a passar na cidade e ir mais longe nas
restrições, mas viabilizámos a proposta porque ela significava um avanço
muito importante.
De novo, este foi um debate que se fez entre o Bloco e o Partido Socialista, como todos os grandes debates da cidade.
Avanços nas questões da mobilidade
Finalmente, quero falar-vos dos avanços nas questões da mobilidade.
A Direita sempre foi contra transportes públicos. Em 2015 o governo
PSD/CDS desinvestiu na oferta pública do Metro, da Carris e da CP,
operou uma das maiores subidas do preço dos passes e preparou as
empresas de transportes para serem privatizadas, num velho esquema de
todos conhecido: desinvestir e destruir capacidade para justificar a
privatização.
Sérgio Monteiro, o Secretário de Estado dos Transportes de então, que
depois foi contratado por meio milhão de euros para vender o Novo
Banco, chegou a confirmar que o grupo espanhol Avanza ia ficar com o
Metro e com a Carris, numa tentativa de as vender mesmo no final da
legislatura.
Foi com o caminho aberto com a legislatura passada que se conseguiu
parar as privatizações quase finalizadas e fazer retornar a CARRIS ao
município. Também abriu o caminho para uma das medidas que mais
revolucionou a mobilidade no país, o Programa de Apoio à Redução
Tarifária, que permitiu devolver rendimentos às famílias e se insere
numa lógica necessária de fomento do transporte público coletivo.
Em Lisboa, foi o acordo entre o Bloco e o PS de 2017 que permitiu
medidas de reforço da CARRIS que são o contrário do que queria a
Direita. Neste momento a CARRIS tem mais motoristas, já há 150 novos
autocarros a circular, outros 200 em compra, 15 elétricos articulados em
concurso, novas 18 carreiras, reabertura dos elétricos 24 e 18, para
além do Plano de Mobilidade para a Zona Ocidental.
Estamos conscientes que nestes avanços tem faltado o Metro. O Bloco
defendeu sempre que a prioridade da expansão do metro deveria ser para
Campo de Ourique, Alcântara, Ajuda e Belém, levando a linha amarela do
Rato até às freguesias da zona ocidental, onde vivem 150 mil lisboetas.
Além disso, criando um interface de transportes com a Linha de Cascais,
podiamos descongestionar o sobrecarregado Cais do Sodré.
Mas, já sabem, o PS tem sido totalmente intransigente na defesa
defesa da linha circular, com esforços conjuntos entre Fernando Medina e
António Costa para avançar rapidamente no afundar de mais de 200
milhões de euros num projeto que encerra a linha num carrossel e esquece
a necessária expansão da rede.
Por isso, estabelecemos no acordo de governação para a Câmara:
“Renegociação com o Governo sobre a expansão da rede de Metropolitano,
incluindo a extensão da linha para a zona ocidental de Lisboa como
prioridade a par da linha circular.”
Em julho de 2019, com a votação de um projeto que previa a suspensão
do projeto da linha circular, percebemos que nem mesmo o PS foi capaz de
defender a linha circular. Foi um consenso importante que o PS no
governo não quer ouvir nem fazer cumprir o aprovado.
Acreditamos, como tal, que é necessário voltar a discutir as
prioridades para o metro de Lisboa, sem tabus, ouvindo as populações. É
esse o caminho que estamos a fazer, conhecendo as dificuldades. Mas não é
por dificuldades que desistimos de qualquer luta.
Como veem, não vos trouxe propriamente novidades ou informações que
já não tenhamos vindo a debater, conjuntamente, ao longo de todo este
tempo, porque também é assim que temos por hábito fazer política.
Mas continua a ser importante falar daquilo que é mais relevante para
as populações: habitação e transportes. Desde há muito que temos estas
duas matérias como prioridades, mesmo quando tantos e tantas achavam que
não havia problema nenhum. Fizemo-lo porque acreditávamos que era
possível responder aos problemas antes de eles serem uma crise social.
Defendemos estas soluções tanto no parlamento, como na Câmara
Municipal, como na Assembleia Municipal, onde temos tido uma atuação
condizente com o que temos defendido na Câmara, onde temos mantido a
pressão alta sobre o executivo do PS, porque é essa a nossa obrigação e
porque toda a pressão é necessária.
Fazemo-lo agora porque acreditamos que há soluções. Essas soluções
implicam coragem, é certo. Implicam fazer frente a grandes interesses
imobiliários especulativos e implicam alterar o chip e aumentar o
investimento público em transportes.
Sabemos disso e por isso nunca desistimos de luta nenhuma! Se em 2
anos de mandato conseguimos criar formas de avançar, mesmo que de forma
limitada, então continuemos por mais 2 anos, para fazer a diferença no
que falta, sem desistir de nada!
Intervenção na sessão do Bloco de Esquerda realizada na passada quinta-feira, 16 de janeiro de 2020, no Fórum Lisboa.
* Deputada e dirigente do Bloco de Esquerda. Licenciada em Ciências
Políticas e Relações Internacionais e mestranda em Ciências Políticas.
IN "ESQUERDA"
17/01/20
.
Sem comentários:
Enviar um comentário