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IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
28/07/19
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As raízes de Coentrão
Fábio Coentrão foi a figura da semana. Nem quando se descobriu que tinha pago quatro mil euros pela carta de condução foi tão falado como agora.
Os portugueses, de maneira geral, dão mais valor ao futebol do que a
infrações rodoviárias. O que explica tanto a sinistralidade nas estradas
nacionais como as audiências de programas sobre nada, durante todo o
defeso.
Os comentadores descansam muito menos do
que os futebolistas. É injusto, porque especular também é um desporto de
alta competição e uma profissão atreita a lesões (veja-se o que
aconteceu a Rui Santos, em tempos, à porta dos estúdios da SIC).
Coentrão foi colocado na órbita do F. C. Porto e os adeptos mostraram
logo a sua vontade de o enviar numa expedição para Marte, ou, em
alternativa, para o planeta vermelho da Segunda Circular. É certo que aí
também teria vida difícil: os benfiquistas não lhe perdoam que, depois
de tantas juras de amor, tenha revelado que era do Sporting desde
sempre. É a vontade de agradar que trama Fábio. Todos conhecemos alguém
assim. É aquela amiga que só nos diz o que queremos ouvir: "O Tiago não
te merecia, fizeste bem em acabar tudo com aquele porco". Semana
seguinte, após reatamento: "Ainda bem que voltaste para o Tiago, fazem
um casal lindo". As amigas que são para guardar são as sinceras, as que
nos avisam quando temos espinafres nos dentes. Coentrão é o equivalente
àquele colega da Primária que jurava ser o nosso melhor amigo, e depois
vínhamos a descobrir que era só para copiar no teste de matemática. E se
o Fábio devia precisar de copiar! O homem tem de pagar para passar
naquele exame sobre os sinais de trânsito, imaginem frações e raízes
quadradas! As únicas raízes que Coentrão domina são as do cabelo, já que
consegue aquele degradé de tons só ao alcance dos melhores
cabeleireiros. Descrito assim, Fábio parece ser um interesseiro, mas
isso não é necessariamente mau. Ter interesses é bom, afinal de contas
perguntam-nos por isso até nas entrevistas de emprego. "Que outros
interesses tem, além do trabalho?" E nós lá dizemos: ler, ir ao cinema,
correr... Normalmente omitimos o "ganhar dinheiro, muito dinheiro", mas é
um desejo comum a todos (a não ser a uma ou outra carmelita descalça
que possa estar a ler). Assim, não me choca nem que Coentrão sonhasse
alinhar pelos três grandes (é como um consultor querer percorrer as
maiores multinacionais), nem que se declare apaixonado por cada um dos
emblemas. Também há tipos que chegam à Deloitte e dizem "isto realmente é
muito melhor que a PwC... aposto que aqui nunca trocariam o envelope
dos Oscars, como aqueles amadores!". Lambe-botas há em todas as
profissões, o pior é quando se conjuga essa "qualidade" com um defeito
que adoro, a irascibilidade. Adoro eu e adora o Sérgio Conceição, daí,
provavelmente, identificar-se com o lateral ex-Benfica, ex-Sporting,
ex-Real, ex-Rio Ave... é que uma pessoa irascível vai deixando marca por
onde passa... nomeadamente no banco de suplentes que certo dia
esmurrou... ou no Marega, que insultou... ou nos adeptos do F. C. Porto,
que insultou... ou no Samaris, a quem baixou os calções (os irascíveis
costumam ser infantis, faz parte!). Coentrão é uma daquelas personagens
que amamos odiar.
E sempre quis ser
personagem principal, por isso não consegue agora passar despercebido e
introduzir-se discretamente entre os figurantes, ao pé de um Marcano
qualquer. Eu habituei-me a odiar (um ódio saudável, conceito novo que
gostaria de introduzir) João Vieira Pinto, como os benfiquistas se
habituaram a odiar Jorge Costa, ou os sportinguistas Simão Sabrosa. Não
queiram, de repente, trocar-nos as voltas.
O
adepto vai ao futebol para sentir, não para pensar. Imaginem o que
seria, ao ver Fábio Coentrão de azul e branco, ter de racionalizar:
"calma, não é para assobiar!" Há jogadores que são apenas jogadores - e
este "apenas" não é redutor, podem ser até os mais talentosos - e depois
há os outros, que são símbolos, para o bem e para o mal. Fábio Coentrão
simboliza tudo o que não é o F. C. Porto. Teria de fazer uma operação
plástica mais extensa que a do Herrera para podermos vê-lo com outros
olhos. Enfiar Coentrão no F. C. Porto a poucos dias de começar a época
era como transferir Rui Rio para o PS durante a campanha eleitoral. Não
nos confundam, por favor. E joguem à bola.
20 VALORES
Para a Proteção Civil, que entregou milhares de golas antifumo,
fabricadas com material inflamável, às populações do interior, no kit de
emergência "Aldeia Segura". O fabricante dos kits, Foxtrot (nome giro,
pois parece estar a dar baile) diz que não percebeu que as golas eram
para usar em cenário de fogo. Talvez tenham achado que era para ir a um
festival de verão. Dizem que pensavam tratar-se de merchandising. Eu sei
que a Proteção Civil podia usar o slogan do Rock in Rio, "por um Mundo
melhor", mas não faria muito sentido distribuir brindes em Pedrógão.
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28/07/19
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