Pokémon Go é mais
que uma brincadeira
Suspira-se pelos jogos de rua de antigamente, como a sirumba e o mata, como se o Pokémon Go fosse uma regressão.
No meio da loucura instalada com o Pokémon
Go, que chegou a Portugal no final da semana passada, muitas pessoas
manifestaram a sua perplexidade com o sucesso do jogo.
Há quem goze com a amálgama de gente que se tem juntado ao pé de
“ginásios” e PokéStops um pouco por todo o lado. Há quem questione
porque é que adultos andam de cara no smartphone, à procura das pequenas
criaturas que foram criadas nos anos noventa e eram coisa reservada à
miudagem. O papel afixado algures no Canadá por alguém que diz aos
jogadores para irem fazer qualquer coisa da vida tornou-se viral.
Suspira-se pelos jogos de rua de antigamente, como a sirumba e o mata,
como se o Pokémon Go fosse uma regressão.
Mas eis porque não é: este jogo para
smartphones é muito mais que um jogo para smartphones. A componente de realidade aumentada é a verdadeira
chave para o impacto que já está a ter no mercado – a capacidade de
sobrepor elementos digitais no mundo real. Vemos os Pokémon a surgirem
no meio de um jardim que existe, é palpável, através do ecrã do
telemóvel. Somos levados a andar quilómetros até uma PokéStop para ir
buscar mais bolas de ataque aos monstrinhos ou outros “bens”, como
poções e ovos, porque o telemóvel tem GPS.
É certo que nada disto é novo. Em 2007, a YDreams já implementava
projetos de realidade aumentada dentro e fora de Portugal. E nem é
particularmente fascinante, pelo menos quando comparado com óculos de
realidade virtual ou com os óculos de 3000 dólares que a Microsoft está a
desenvolver para realidade aumentada “a sério”, os HoloLens.
No entanto, nunca houve uma experiência tão
coletiva, popular e barata como esta. O jogo é quase secundário. A
experiência é que conta: ter de andar de um lado para o outro,
socializar com outros jogadores, pertencer a uma equipa e desenvolver
estratégias para vencer as batalhas. Melhor, ficar com o gostinho de uma
forma de interagir que se vai espalhar como fogo.
Há qualquer coisa no sucesso que cria
anti-corpos nas pessoas – se toda a gente vê Guerra dos Tronos, vou ser
aquele que nunca tocou num episódio. Se agora há dezenas de milhões de
jogadores de Pokémon Go a tentarem “apanhá-los a todos”, vou lamentar ao
que isto chegou e fazer umas piadas com esses tontos.
Mas se formos ver a casa de muitos críticos, se calhar há lá uma consola
por baixo da televisão. Ou o Candy Crush instalado no telemóvel. Não se
fala tanto de gamificação na educação e nas estratégias empresariais?
Alguns jogos são melhores que outros; este é simplesmente diferente.
Pensemos no Pokémon Go em versão visita de estudo para descobrir poetas
portugueses ou estilos de arquitetura. Pensemos além deste jogo
específico.
É que realidade aumentada é a forma como
vamos interagir com aplicações e outros gadgets no futuro – e próximo.
Não é à toa que se fala do mundo pós-apps e pós-smartphones, mas ninguém
sabe bem como isso se vai processar. Será pela invasão de wearables?
Será com hologramas? Ambos? O certo é que estamos cada vez mais próximos
de viver numa realidade em que o físico e o digital se misturam. E o
Pokémon Go é um vislumbre disso.
IN "DINHEIRO VIVO"
19/07/16
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