HOJE NO
"JORNAL DE NEGÓCIOS"
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Recusar licenciaturas de Bolonha
pode ser inconstitucional
O Parlamento abriu 23 vagas, mas proíbe candidatos
que tenham licenciaturas atribuídas ao abrigo do processo de Bolonha.
Vários especialistas defendem que essa distinção é inconstitucional e
discriminatória, pelo que o concurso do Parlamento pode ser ilegal.
Inconstitucional,
discriminatório e violador do direito comunitário. A recusa do Parlamento em aceitar candidatos que apenas possuam licenciatura de Bolonha
viola o princípio da igualdade, defendem três constitucionalistas
ouvidos pelo Negócios. A Assembleia da República abriu na semana passada
23 vagas, mas só aceita candidatos que tenham licenciatura pré-Bolonha
ou mestrado. Só que isso é um "atestado de menorização completo" a quem
tem licenciaturas de Bolonha, resume o constitucionalista Rodrigo
Esteves de Oliveira.
"O que o Parlamento está a fazer é a distinguir pessoas, e só é
possível fazê-lo se houver um motivo constitucional relevante que
permita essa diferença. A mim parece-me óbvio que, neste caso, esse
motivo não existe", afirma o também constitucionalista Paulo Veiga e
Moura. "Primeiro, porque foi a própria Assembleia da República que fez
uma lei que diz que os graus académicos são licenciatura, mestrado e
doutoramento", e essa lei "não distingue licenciaturas pré-Bolonha ou
Bolonha".
"É óbvio que não há nenhum motivo constitucionalmente relevante. O
motivo que existe é a AR achar que a licenciatura de Bolonha é uma
porcaria, que não atribui conhecimento suficiente; vem dizer que antes
de Bolonha são os bons, depois são os maus, a não ser que tenham
mestrado", prossegue. Só que este órgão "não pode fazê-lo". "Não pode
esquecer a lei que fez e dizer que só aceita uns e não outros".
Em suma: "viola o princípio constitucional da igualdade, e tenho
muitas dúvidas que não viole o direito comunitário", uma vez que o
processo de Bolonha é uma iniciativa europeia.
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Recorde-se que, para justificar a proibição de admissão de
licenciados em Bolonha, o gabinete do secretário-geral da Assembleia da
República disse que "a carreira de assessor parlamentar é uma carreira
especial, que requer elevadíssima exigência".
"Atestado de menorização completo"
O constitucionalista Rodrigo Esteves de Oliveira tem uma opinião
muito semelhante. "Excluir pura e simplesmente os licenciados em Bolonha
parece-me inconstitucional", sustenta. "É não só uma violação do
princípio da igualdade como é um pouco mais do que isso, porque envolve
um acto discriminatório", detalha. "É uma menorização pouco compatível"
com a atribuição de títulos académicos, concretiza.
"Eu admitiria que houvesse uma diferença na pontuação pelo facto de a
licenciatura ser diferente, mas a proibição de acesso vai longe
demais". "Existe uma discriminação e esse é um aspecto particularmente
sensível para o Tribunal Constitucional", prossegue Rodrigo Esteves de
Oliveira. "É um atestado de menorização completo a quem tem uma
licenciatura de Bolonha, que me parece incompatível com ter uma
licenciatura reconhecida pelo próprio Estado. Se o Estado considera
licenciado, não pode ser para umas coisas e para outras não".
Também para Alexandre Sousa Pinheiro, especialista na Lei
Fundamental, trata-se de "uma restrição a direitos, liberdades e
garantias que não respeita a Constituição". "E digo-o sem grande risco",
acrescenta. Para se fazer uma distinção entre licenciatura pré-Bolonha e
Bolonha, "tem que haver algum motivo proporcional". Mas "se os cursos
de Bolonha são os que agora se ministram, são aceites pelo Estado, não
percebo como o Estado não aceita pessoas com uma licenciatura de acordo
com a lei".
No caso das 23 vagas abertas pelo Parlamento, os 10 avisos publicados em Diário da República que lançam o concurso baseiam-se no Estatuto dos Funcionários Parlamentares
– e o estatuto já prevê, ele próprio, que só possam ser aceites
licenciados pré-Bolonha ou candidatos com mestrado. Portanto, o que
defendem os três constitucionalistas já referidos é que a questão é de
substância, e que esta norma do estatuto é inconstitucional. Por
arrasto, o concurso aberto pelo Parlamento também é ilegal.
Um critério racional
O assunto não é, contudo, consensual. O constitucionalista Tiago
Duarte tem um entendimento distinto, focando-se no aspecto formal:
"seria ilegal se o aviso fizesse uma discriminação que a lei não prevê.
Como o estatuto prevê essa distinção, não me parece que seja
inconstitucional". Por outro lado, "o critério para a distinção, se é
antes ou depois de Bolonha, é um critério racional e objectivo, porque
as formações são diferentes".
Também o constitucionalista Jorge Bacelar Gouveia considera que o
facto de a distinção já estar na lei que contém o Estatuto dos
Funcionários Parlamentares torna o aviso de concurso legal. Porém,
admite que a lei em si seja inconstitucional. "Os candidatos que forem
excluídos podem impugnar a norma que serve de base ao concurso", sugere.
O Negócios confrontou o gabinete do secretário-geral Albino de
Azevedo Soares com esta eventual inconstitucionalidade, mas ainda não
foi possível obter uma resposta.
* Estranho comportamento administrativo do parlamento. O processo de Bolonha é legislação da União Europeia, adoptada pelos países comunitários, os estudantes universitários não têm alternativa, cumprem as formalidades do seu curso têm de estar em pé de igualdade para concursos públicos. É absurdo que a A.R. exclua das candidaturas cidadãos que apenas cumpriram a lei que os deputados aprovaram em plenário.
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