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Assédio sexual
O chamado "assédio sexual" é um conceito muito amplo, que abrange
condutas que vão desde a mera sedução excessiva e não correspondida até à
verdadeira importunação de outras pessoas. A dificuldade de traçar a
fronteira entre o que é tolerável e o que afeta a liberdade alheia torna
discutível uma incriminação, por razões de previsibilidade e segurança.
O assédio sexual torna-se insuportável quando implica
a redução da liberdade da vítima, comprimindo o seu espaço de decisão.
Na reforma penal de 1998, foram introduzidas novas modalidades de coação
sexual e de violação, relativamente a atos sexuais extorquidos com
abuso da autoridade, resultante, por exemplo, de dependência familiar,
laboral ou hierárquica.
Há, porém, uma área
difícil de caracterizar, que engloba condutas que não atingem esta
gravidade objetiva, embora possam molestar subjetivamente uma pessoa. O
Direito Penal não deve intervir nessa área nebulosa, sob risco de se
confundir com a Moral, imiscuindo-se em relações privadas e íntimas que
podem ser geridas sem recurso aos tribunais.
Essa
área relevante para a Moral (e para a Religião) pode ser debatida em
público em relação a casos concretos como o que recentemente foi
suscitado quanto a um alto dignitário da Igreja? A confusão apressada
entre a perspetiva moral e o Direito pode afetar profundamente as
pessoas visadas, expondo--as à humilhação pública e provocando danos
irreparáveis.
Assim, antes de se formular uma
acusação de assédio sexual, deverá ter--se em conta que é necessário
preservar um território penalmente neutral, respeitante à esfera de
intimidade das pessoas. A penetração nesse terreno movediço dificilmente
promoverá a liberdade, veiculando apenas moralismos atávicos, ainda que
ao serviço de justas críticas institucionais.
Perante
relações sexuais entre adultos, devemos deixar a Deus o que é de Deus e
oferecer a César o que lhe pertence. Devem ser denunciadas as
importunações sexuais que, objetivamente, constituam uma restrição da
liberdade sexual ou de determinação sexual dos ofendidos, mas devem ser
preservados da exposição mediática quaisquer outros relacionamentos.
Tal
como escreveu Stuart Mill, em 1859, no seu célebre ensaio ‘Sobre a
liberdade’, cada indivíduo tem o direito de agir como quiser, desde que
as suas ações não prejudiquem outras pessoas. Se uma ação só afeta
diretamente quem a pratica, a sociedade não tem o direito de intervir:
"Sobre si mesmo, sobre o seu próprio corpo e mente, o indivíduo é
soberano."
Professora Catedrática de Direito Penal
IN "CORREIO DA MANHÃ"
24/02/13
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