01/07/2021

RICARDO SIMÕES FERREIRA

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A mamã dá licença? 

Sim, mas quero-te em casa

 às 11 da noite!*

* Uma vez que as vacinas não evitam o contágio, apenas a doença grave, achar que vamos erradicar a covid em poucos meses é no mínimo ridículo. Se não é nisto que o governo acredita, pelo menos parece.

Não é apenas o ar maternal e bem-intencionado da ministra Mariana Vieira da Silva, nas conferências de imprensa após as reuniões do Conselho de Ministros, que sugere o título. É mesmo o jogo que o governo está fazer com os portugueses nos últimos meses em nome da nossa saúde.

A cada duas semanas a governante vem dizer-nos que afinal vamos ficar mais um bocadinho confinados, ou que o comércio vai fechar mais um bocadinho, ou que temos de ir mais cedo para casa.... Qual prepotente "mamã" do recreio que mandava dar dois passos à caranguejo e punha o contrariado miúdo a andar para trás, deixando-o mais longe da linha final.

Entretanto, o comércio e todos nós assim vamos ficando... mais longe de qualquer possibilidade de recuperarmos de uma crise que vai tomando proporções astronómicas.

É indesmentível que o número de infetados está a aumentar, mas se calhar convém (muito) olhar para o número de casos graves e (essencialmente) para o número de mortes.

É preciso aprender a viver com a covid, porque a cura ou erradicação não se divisa no horizonte. Se é um facto que vacinação não impede o contágio, apenas a doença grave (por isso o PM foi mandado ficar em isolamento apesar de estar "duplamente vacinado"), então mude-se o chip.

Relativamente ao comércio, sim, imponha-se distanciamento e medidas de proteção, fiscalize-se lotações máximas mas, por favor, deixe-se os negócios trabalhar nos seus horários plenos.

O que está em causa é a vida de pessoas que apenas querem, precisam, de trabalhar para viver. Que precisam de ganhar o seu sustento.

E por falar em sustento -- e isto não é nada de novo, mas convém referir uma e outra vez -- que esta fiscalização chegue também aos transportes, pois o governo está sempre tão preocupado em mandar fechar os espaços privados, mas pouco ou nada faz para resolver os problemas dos comboios e autocarros (a maioria públicos) que andam sobrelotados por quem não pode, simplesmente, fazer o "obrigatório" teletrabalho.

Curiosamente, a partir desta sexta-feira às 11 da noite, o automóvel privado com uma única pessoa lá dentro -- do tipo que só quer dar uma volta para espairecer a tola por estar enclausurado -- está proibido de circular, enquanto o comboio da linha de Sintra empacotado das 6h30 já não tem qualquer problema...

Mas claro que está tudo certo. Assim é tudo mais simples: andamo-nos a vacinar e, no fim, ficamos todos de portas fechadas e em recolhimento obrigatório à mesma.

Isto faz algum sentido?

* Jornalista

IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS" -  01/07/21

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