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Zeca no Panteão?
Tenham juízo!
Talvez
seja apenas um efeito colateral do estado de silly season permanente
que tomou conta do mundo nos últimos anos, mas a moda do momento parece
ser mandar ilustres portugueses falecidos para o Panteão Nacional.
Depois de Amália e Eusébio e Sophia, agora há quem queira empandeirar
para a triste igreja de Santa Engrácia os restos mortais de José Afonso.
Nunca percebi qual a utilidade prática de um mamarracho como o
Panteão Nacional. Aquilo não é esteticamente apelativo; é uma casa fria e
cinzenta e feia; não tem sequer o encanto nostálgico que existe em
alguns cemitérios. Não serve para nada, a não ser para jantares da Web
Summit e para umas altas figuras do Estado se pavonearem, de tempos a
tempos, a pretexto de mais uma transladação.
A verdade é que os livros de Aquilino ou de Sophia não passaram a ser
mais lidos em virtude da distinção, e dos locatários mais antigos é o
que se sabe: se Almeida Garrett ainda diz alguma coisa às pessoas (mais
que não seja pelo tantos anos obrigatório Frei Luís de Sousa) serão hoje
muito poucos os que alguma vez leram um texto de Guerra Junqueiro ou
João de Deus – e é pena, porque não sabem o que perdem.
IN "RTP"
22/08/18
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O Panteão não enobrece, nem apouca, apenas – quanto muito – pode
reconhecer o valor de alguns dos nossos excelsos antepassados. Aliás, o
plano delineado por Passos Manuel no século XIX, de reunir num mesmo
espaço grandes figuras da História, só faria (algum) sentido se fosse
mesmo assim. Mas para isso era preciso que lhe fosse dado tempo, à
História, para decidir, serena e desapaixonadamente.
Em vez disso, o Panteão tornou-se (ou foi sempre) mais um palco para a
exibição de protagonismos vários, por vezes sem outro sentido que não o
simples interesse imediato, político ou outro qualquer. Só assim se
entende a pressa que houve em lá colocar Amália ou Eusébio. Ou a freima
que há por aí em fazer o mesmo com Mário Soares.
Não discuto a grandeza de qualquer dos «eleitos» (estes ou outros), nem
os critérios de escolha, nem tão-pouco a justeza do acto. E sei que o
espectáculo proporcionado pelas transferências inter-cemitérios anima
sempre o povo. Mas acredito que há maneiras mais úteis de ocupar o
tempo. E de honrar os mortos.
A mais recente candidatura ao mausoléu pretende apadrinhar a
transferência para Santa Engrácia do criador de «Grândola, Vila Morena».
Uma proposta porventura bem-intencionada, mas absurda. Não só porque se
trata do tipo de distinção que Zeca sempre repeliu – ele até recusou
receber uma mais do que merecida Ordem da Liberdade, lembram-se? – como,
sobretudo, porque resultaria numa institucionalização inaceitável do
homem que foi e da obra ímpar que nos deixou. A antítese de tudo aquilo
por que lutou o artista e cidadão José Afonso.
E não adianta argumentar que o Panteão vale como lugar simbólico de
reconhecimento nacional. Porque, enquanto tal, a simbologia em
perspectiva perante a sugerida entrada de Zeca no redondel de Santa
Engrácia não podia ser pior: convenhamos que colocar o autor da
canção-senha da Revolução dos Cravos ao lado de Carmona (e de Cavaco,
que daqui por uns anos terá lá com certeza uma assoalhada), era uma
condenação a título perpétuo.
O Panteão está muito bem como sala-de-eventos, e dizem os números que é
um dos lugares muito visitados pelos turistas. Óptimo, sempre ajuda no
combate ao défice. Mas José Afonso repousa na terra que escolheu para
viver e morrer. Junto do povo – esse que, há 31 anos, dele se despediu
transformando Setúbal num mar de gente viva – e do mundo, como deve ser.
Como só pode ser. Zeca merece, e nós também.
IN "RTP"
22/08/18
NR: Com todo o respeito que temos por VIRIATO TELES e pela família do ZECA não temos a mesma opinião. Hoje ainda existe muita gente que participou ou assistiu a espectáculos de JOSÉ AFONSO, talvez os mais novos ainda consigam transmitir a hombridade e classe do intérprete durante mais 50 anos, a cibernáutica ajudará mas pouco.
O Panteão poderá a vir ser no futuro, gerido por novas gentes com mais amor pelos grandes portugueses, numa casa de maior respeito e proximidade com o povo, por isso desejaríamos ver o ZECA ali.
O fim dos cemitérios tal qual são hoje está próximo, um dia uma retro-escavadora reduzirá a pó e anonimato o que resta de pessoas que sempre pautaram as suas vidas com nobreza de carácter, não queremos isso para JOSÉ AFONSO.
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