Tiro ao Álvaro
A vida não está fácil para Álvaro Santos Pereira e nem outra coisa seria de esperar. Está em causa um ministro que é responsável pela pasta da Economia, numa economia que está em recessão e que não vai conseguir sair dela nos tempos mais próximos.
Quando tomou posse, o ministro pediu que o tratassem por Álvaro. Entre a oposição, e até no interior dos partidos que integram a coligação de Governo, a mensagem foi entendida de outra forma. Pela contestação e descrença que se vão manifestando em seu redor, dir-se-ia que Santos Pereira teria solicitado que o tratassem, simplesmente, como um alvo.
Numa economia que não cresce, nem aparece, o ministro respectivo precisaria de ser capaz de operar milagres para não ser visto e tratado como o elo fraco do Governo. A orgânica do Executivo é a primeira responsável pela situação. Constrangido pela promessa de constituir uma equipa pequena, poupada e eficiente com o objectivo de dar o exemplo em época de exigência de sacrifícios, Pedro Passos Coelho criou um mastodonte difícil de gerir. E a demagogia paga-se.
Da legislação laboral à Estradas de Portugal, do estado de ruína das empresas de transportes públicos às SCUT, o que não falta no Ministério da Economia são cargas pesadas para serem suportados por um só responsável político. É como pedir a um bombeiro que combata, em simultâneo, um incêndio em Trás-os-Montes e outro no Algarve. Algum vai ficar por apagar.
A este equívoco na formação do Governo, somam-se erros quase infantis como o que proporcionou o espectáculo a que se assistiu na Assembleia da República, quando Álvaro Santos Pereira foi apresentar um plano de reestruturação dos transportes públicos a deputados que desconheciam semelhante documento. Perante a visível surpresa e embaraço do ministro, a oposição desfrutou o petisco. A política não é cenário em que, por hábito, se poupem os deslizes dos adversários. Lançado aos leões, Santos Pereira foi devorado. Sem contemplações.
Era suposto que entre os partidos que apoiam o Governo surgissem palavras de apoio. Afinal de contas, é consensual que o país precisa de mais crescimento económico e que este será essencial para acrescentar sustentabilidade ao desendividamento dos sectores público e privado. Mas quem tenha esperado que Álvaro Santos Pereira pegaria numa varinha mágica e, em menos de quatro meses, colocaria Portugal a crescer a um ritmo chinês só pode ter sido vítima de ilusões delirantes.
Há tropeções em que tem inegáveis direitos de autor, mas os problemas de fundo do ministro da Economia são outros. O CDS ambicionava a pasta e, de forma mais subtil ou mais explícita, tem interesse em expor os defeitos, reais ou fantasiados, e roer os alicerces que sustentam Álvaro Santos Pereira. Entre os dois partidos, pede-se mais cuidado com as relações públicas. Muito bem. O ministro deve falar com quem está na economia real e conhece os seus problemas. Acontece que os empresários que costumam ter acesso ao Governo, seja qual for a sua cor, apreciam conversar com o ministro do momento se este tiver um subsídio no bolso do casaco para rematar o bate-papo de forma feliz.
A má notícia é que Álvaro Santos Pereira não tem cheques para distribuir, o que, numa economia dependente do Estado, o coloca em xeque. Sucede, também, que o Governo tem de fazer um profundo trabalho de reforma do Estado e da sua forma de estar na economia. Quem acreditar que a retoma surgirá dos cofres públicos estará enganado sobre a natureza dos problemas que levaram o país a pedir apoio externo. Preferirá agravar a doença e evitar as dores da cura.
As empresas enfrentam problemas de liquidez, apertadas pelas restrições ao crédito. É uma dificuldade grave, que passa pelos bancos, e que o Ministério das Finanças e o Banco de Portugal têm que ajudar a superar. Se isto faz do ministro da Economia uma figura decorativa, é uma questão de opinião. O que parece mais certo é que quem, por estes dias, se entretém a praticar tiro ao Álvaro, anda a apontar ao alvo errado.
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
10/10/11
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