12/05/2011

JOSÉ FERREIRA MACHADO

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Que Lata!



Estamos em campanha eleitoral aberta. Todas as campanhas são propícias a exageros, demagogias e mesmo inverdades. Devemos estar preparados para isso e saber perdoar. Mas, mesmo assim, tenho ficado impressionado com os níveis de desfaçatez dos spin doctors governamentais.
Na minha ingenuidade, esperaria algum decoro por parte de quem conduziu os destinos do país num trajecto que desembocou na mais grave crise da nossa memória colectiva. Não esperaria um mea culpa generalizado. Mas não ouvir a mais modesta autocrítica, a mais breve menção de um – um só que fosse! – erro de avaliação, ou o mais ténue sinal de que, podendo voltar atrás, se teria feito algo diferente, roça o domínio patológico. A decência mandaria que, mesmo alijando a culpa, se assumisse a responsabilidade. Mas não, tanto a culpa como a responsabilidade são de terceiros: os especuladores, a conjuntura internacional, os alemães, os patrões, os inimigos do Estado-Social, o PSD e, também, o Presidente. É o comandante do Titanic atribuindo todas as culpas ao iceberg.
A mais evidente prova da incapacidade de aprender com o passado recente é o programa eleitoral do PS. É um documento que poderia perfeitamente ter sido escrito para as eleições de 2009. Um documento que persiste na defesa de um Estado-Social já em grande medida inexistente e inviável nos seus contornos mais generosos. Um documento que insiste no mito de uma modernidade gerada pela ciência e pelo empreendedorismo. Um documento que ignora completamente a experiência dos últimos dois anos. Um documento que propõe políticas como se não existisse um acordo a ser assinado com a troika. O programa eleitoral do PS está tão desligado da realidade que refere que o défice orçamental em 2010 foi 6,8% do PIB, 2,5 pontos abaixo do valor real.
Não aprender com as insuficiências e os erros é grave, pois significa que os voltariam a repetir no futuro. Só por isto é razoável dar oportunidade a outros timoneiros.
PS: A lata (e falta de sentido de Estado) atingiu os píncaros na passada terça-feira: o primeiro ministro, ladeado por um muito encavacado ministro das Finanças, anunciou durante o intervalo de um jogo de futebol aquilo que o acordo com a UE/BCE/FMI não era. A orquestra toca, os passageiros jantam e o comandante do Titanic anuncia que, afinal, não embateram num rochedo. 

IN "SOL"
09/05/11

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