.
Hoje trago-vos uma partilha que me inquieta há muito. Certamente concordarão que as nossas crenças e ambições nos servem de impulso e farol para concretizarmos o que queremos e, sobretudo, o que acreditamos. Neste ano que se despede, sinto que fiz isso incessantemente e ávida por obter sucessos...
Posso dizer, preservando modéstias, que me acompanharam acontecimentos maravilhosos: estreias de representação nacional na modalidade paralímpica que pratico; sentimentos de concretização de âmbito profissional; relações de amizade e familiares extraordinárias que se cultivaram e mantêm... Que cenário de privilégio, este. Bem o sei. Olhando para o ano como um todo, o cenário é positivo!
Mas nem só de coisas positivas a vida é feita e por isso é preciso ver a realidade. Ou melhor, o outro lado da realidade. Lado esse em que aquilo em que acreditamos e sonhamos se desvanece e não há forma alguma de o manter... Falo-vos de perdas. A perda de quem acrescentou muito de positivo àquilo que somos. Por quem se nutre um carinho inexplicável e indescritível... E que sabemos que habitará sempre em nós! Mas que já não estará perto (ou pelo menos, não tão perto). Está a ser e será duro, bem duro. Resta aprender a gerir a saudade (aquela dolorosa, sabem?) e o total desapontamento... Assumindo que isso também é fazer caminho.
Caminho no sentido do fortalecimento interior. No sentido de retirar aprendizagens de todas as experiências que nos acontecem. Compreender que nem sempre aquilo que acreditamos e sonhamos se vai concretizar (pelo menos na forma em que o desenhamos). Aceitar, que nem só de sucesso e inspiração se faz a nossa jornada. Faz-se também de dor, rejeição, inquietação, negação e saudade... Também são parte dos mundos que construímos. Tal como o são as pausas e os silêncios (apenas recentemente aprendi a sua importância), ainda que por vezes difíceis por tudo o que nos desvendam.
A par desta realidade que não desenhamos, impera a necessidade de estarmos abertos a novos ciclos, a novos acontecimentos, a novos modos de ser, estar e apreender. Confesso-vos que me assusta a forma como enfrentarei este outro lado da realidade. Será um novo ano cheio de renovações e esforços. Muitos esforços para aceitar o não desenhado e me reinventar.
Acredito que em algum momento, tu que lês esta crónica, sentirás que temos desafios semelhantes. E que isto nada mais é do que viver a vida no sentido mais amplo e intenso da expressão!
Que nos espere um 2023 que além das clássicas concretizações e sonhos realizados traga também uma boa estrutura para acolher as realidades não desenhadas!
* Licenciada e mestre em Sociologia pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto com interesse particular na problemática da deficiência. Foi doutoranda na mesma escola e área disciplinar, num projeto de investigação que versa sobre as políticas para a deficiência em Portugal e na Europa e que dá enfoque à filosofia da Vida Independente e que ainda não foi finalizado.
IN "gerador.eu" - 31/12/22.
Sem comentários:
Enviar um comentário