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IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
06/06719
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O Robin dos Bosques do século XXI
Num Estado de Direito Democrático existem direitos fundamentais dos cidadãos, tais como o direito à reserva da vida privada, do domicílio e da correspondência.
Desde a detenção de Rui Pinto muito se tem falado sobre ele e as
opiniões dividem-se: há quem o veja como um "criminoso", há quem o veja
como um "herói nacional", tendo-se já levantado muitas vozes, incluindo
de figuras públicas, que afirmam que Rui Pinto apenas serviu o interesse
público, pondo a descoberto casos de corrupção no futebol.
Serão
os atos, alegadamente praticados por Rui Pinto, menos graves ou mesmo
dignos de louvor, por, supostamente, darem a conhecer a prática de
eventuais crimes de corrupção no mundo do futebol? Muito sinceramente,
considero que não.
Num Estado de Direito Democrático existem
direitos fundamentais dos cidadãos, tais como o direito à reserva da
vida privada, do domicílio e da correspondência, existindo igualmente
regras próprias no âmbito do processo penal para a recolha e obtenção de
prova quando essa recolha e obtenção possa colidir com direitos
fundamentais, como é o caso das buscas e apreensões e das escutas
telefónicas.
Estas regras, porque defensoras dos direitos
fundamentais dos cidadãos, não podem ser "atropeladas" com a
justificação de se trazer a público o conteúdo de determinados
documentos e comunicações que, alegadamente põem a "nu" a prática de
determinados crimes. Admitir que um cidadão, ao arrepio de todas as
regras e violando direitos de terceiros, divulgue publicamente o
conteúdo de documentos e comunicações é fazer "tábua rasa" de todos os
direitos e regras que visam a proteção dos cidadãos e o direito a um
processo justo e equitativo, pondo igualmente em causa o princípio da
presunção de inocência, dado que conduz a um verdadeiro "julgamento em
praça pública".
Este tipo de atuação serve o interesse na realização da justiça? Não.
Primeiro
porque os documentos e comunicações divulgados com recurso à pirataria
informática, porque obtidos de forma ilegal, não podem ser utilizados
como prova em eventuais processos-crime. Nos termos da lei, não podem
ser utilizadas em processos-crime provas obtidas mediante intromissão na
vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações
sem a autorização do seu titular, salvo os casos excecionais previstos.
Estes casos excecionais são as conhecidas buscas, apreensões e escutas
telefónicas, nestas últimas incluindo-se o correio eletrónico, sendo que
todos eles têm regras próprias, tais como terem de ser, regra geral,
autorizados por um juiz, têm de estar em causa determinados tipos de
crime e o primeiro contacto com o seu conteúdo é reservado a
determinadas pessoas que têm o dever de escrutinar os elementos que
podem ter relevância para o processo, sendo destruídos os demais.
Segundo,
porque, a partir do momento em que a informação é divulgada
publicamente, muito dificilmente as autoridades conseguirão,
posteriormente, chegar a essa informação de forma lícita e seguindo os
procedimentos previstos na lei, uma vez que, com toda a probabilidade,
já terá sido completamente apagada. Isto leva a que a Justiça, tantas
vezes criticada, não consiga, de facto, fazer o seu trabalho, não porque
a "máquina judicial" não está devidamente oleada, mas porque cidadãos
comuns decidem chamar a si funções que não lhes pertencem.
Igualmente
grave é o facto de se chamar à colação a liberdade de imprensa e o
jornalismo de interesse público, colocando-os no mesmo patamar de sites e
"blogs" que se limitam a divulgar publicamente documentos e
comunicações eletrónicas sem qualquer tipo de análise critica. O
verdadeiro jornalismo de investigação recorre a fontes de informação,
confirmadas e reconfirmadas, devendo utilizar meios legais para a
obtenção de informações, imagens ou documentos, nos quais não se incluiu
a pirataria informática.
A conclusão a retirar de casos como o
de Rui Pinto é a de que servem apenas o julgamento público e não o
verdadeiro julgamento, que deve ter lugar nos tribunais, onde são
respeitados os direitos fundamentais e onde é garantido um processo
justo e equitativo. A César o que é de César!
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
06/06719
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