O embuste como norma
nestes tempos sombrios
Começámos a habituar-nos à mentira como suporte do
poder. E o pior é que há, espalhados pelos jornais e pelas televisões,
nefelibatas ao serviço de quem manda, que não desmontam o edifício de
embustes com que este Governo nos encharca.
Com a irrevogável leviandade que
constitui a marca d'água do seu excitado carácter, Paulo Portas afirmou,
na terça-feira, que "há aves agoirentas que gostam de ver Portugal
puxado para baixo". Não é só insólita, a afirmação é embusteira, o que
não surpreende, dado o seu autor. Começámos a habituar-nos à mentira
como suporte do poder. E o pior é que há, espalhados pelos jornais e
pelas televisões, nefelibatas ao serviço de quem manda, que não
desconstroem e desmontam o edifício de embustes e de dados viciados com
que este Governo nos encharca.
Os comentadores são sempre os
mesmos e minuciosamente escolhidos. A credibilidade da imprensa e das
televisões perde-se num confuso emaranhado de palavras. Cronistas
incómodos são mandados embora (sei muito bem do que falo, por
experiência própria) e substituídos por uma miuçalha sem grandeza nem
decência. Claro que há excepções, mas são tão raras, tão raras…
Uma
dessas raridades ocorreu na manhã de terça-feira, nos programas
"Discurso Directo", da TVI; e "Opinião Pública", da SIC. Devo dizer que
não os perco, como antídoto à enxúndia de manipulações desavergonhadas.
Ambos aqueles programas constituíram um desfile de verdades contra as
aldrabices do Governo, e contra as despudoradas declarações do Portas.
Dezenas de desempregados e outros denunciaram, em ambos os programas
(conduzidos por duas excelentes profissionais, que respeito e admiro),
as manobras usadas por este Governo para fazer crer que tudo vai no "bom
rumo." Não vai. E basta ouvir esta gente para cauterizar o Executivo
como um grupo de mentirosos. Um professor catedrático, na SIC, exerceu o
seu dever, esclarecendo, através da pedagogia dos factos, o que nos é
ocultado.
O escândalo assume proporções que nenhuma razão
justifica. Nestes quarenta anos de democracia não assisti a nada de
semelhante, nem, sequer, aquela sórdida história do "queijo limiano",
urdida pelo católico António Guterres e pelo deputado do CDS, dito
Campelo, atinge a altura do desmando actual.
Quando o Portas fala
em "aves agoirentas" está a falar em todos aqueles que criticam a
mentira organizada como um todo, que tem estruturado a acção política
deste malfadado Executivo. Estamos em plena república do faz-de-conta,
ante uma monstruosa manipulação de factos que tem desgraçado Portugal e
encaminhado a pátria para um beco sem saída, cuja tragédia o próximo
Governo terá de enfrentar. Espero é que, desta feita, os responsáveis
por este crime nacional sejam levados à justiça e punidos com a
severidade exigida.
As quadras da nossa satisfação
José
Correia Tavares, um dos nossos intelectuais mais lúcidos, e cuja obra
poética marca um destino incomum, "especializou-se", digamos assim, na
técnica da quadra, dos géneros mais difíceis da lírica portuguesa. Acaba
de publicar, com a chancela da Húmus, uma nova selecção, com o título
"Livre do Desassossego", cuja ironia encerra a ternura e a compaixão que
o poeta nutre pelo povo. É um regalo para o espírito ler este livro,
cujas quadras são tudo menos inócuas ou imparciais. Correia Tavares sabe
muito bem o papel que o escritor deve desempenhar, e a sua importante
obra encaminha-nos, também, para uma lúdica reflexão. Uma boa, grande
leitura, que nos anima nestes tempos sombrios.
IN "JORNAL DE NEGÓCIOS
05/06715
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