20/06/2010

ASSEMBLEIA CONSTITUINTE

Assembleia Constituinte foi a designação dada à assembleia parlamentar com funções constituintes prevista na Lei n.º 3/74, de 14 de Maio, a qual foi eleita por sufrágio universal directo em eleições realizadas a 25 de Abril de 1975, com o objectivo específico de elaborar uma nova constituição para a República Portuguesa após a queda do Estado Novo em resultado da revolução de 25 de Abril de 1974. A Assembleia Constituinte concluiu a discussão da nova Constituição a 31 de Março de 1976, tendo a mesma sido aprovada em votação final global a 2 de Abril do mesmo ano. Promulgada naquele mesmo dia, passou a vigorar como a Constituição da República Portuguesa de 1976. A Assembleia Constituinte, terminados os seus trabalhos, dissolveu-se naquela data, nos termos do n.º 3 do artigo 3.º da Lei que a criou.

Enquadramento jurídico

Pela Lei n.º 2/74, de 14 de Maio, assinada pelo general António de Spínola, presidente da Junta de Salvação Nacional saída da Revolução dos Cravos, foram extintas a Assembleia Nacional e a Câmara Corporativa do Estado Novo. Nesse mesmo dia, pela Lei n.º 3/74, de 14 de Maio, também emanada da Junta de Salvação Nacional, era definida a estrutura constitucional transitória que vigoraria até à entrada em vigor da nova Constituição.

Por aquela Lei, a Junta de salvação Nacional, além de publicar em anexo o Programa do Movimento das Forças Armadas Portuguesas, fixava os órgãos que governariam Portugal no período de transição e criava (pelo artigo 3.º da Lei) uma Assembleia Constituinte à qual caberia elaborar e aprovar a nova Constituição Política.

A Assembleia Constituinte deveria aprovar a Constituição no prazo de noventa dias, contados a partir da data da verificação dos poderes dos seus membros, podendo, contudo, esse prazo ser prorrogado por igual período pelo Presidente da República, ouvido o Conselho de Estado. A Assembleia Constituinte dissolvia-se automaticamente uma vez aprovada a Constituição ou decorrido que fosse aquele prazo, devendo, neste segundo caso, ser eleita nova Assembleia Constituinte no prazo de sessenta dias.

A Assembleia Constituinte deveria ser eleita por sufrágio universal, directo e secreto. O número de membros da Assembleia, os requisitos de elegibilidade dos Deputados, a organização dos círculos eleitorais e o processo de eleição seriam determinados pela lei eleitoral.

Cabia ao Governo Provisório nomear, no prazo de quinze dias, a contar da sua instalação, uma comissão para elaborar o projecto de lei eleitoral e elaborar, com base no projecto da comissão referida, uma proposta de lei eleitoral a submeter à aprovação do Conselho de Estado, de modo a estar publicada até 15 de Novembro de 1974.

As eleições para Deputados à Assembleia Constituinte deveriam realizar-se até 31 de Março de 1975, em data a fixar pelo Presidente da República, sendo a Assembleia Constituinte convocada dentro de quinze dias após a sua eleição.

A Lei n.º 3/74, de 14 de Maio, determinava assim um prazo de 90 dias para que a Assembleia Constituinte aprovar a Constituição, prevendo a possibilidade da sua prorrogação pelo Presidente da República, ouvido o Conselho de Estado. Tal prazo veio a ser prorrogado por três vezes: pelos Decretos n.º 463-A/75, de 27 de Agosto, e n.º 666-A/75, de 22 de Novembro, por períodos de mais 90 dias, e pelo Decreto n.º 160-A/76, de 26 de Fevereiro, por um período de mais 30 dias.

Aprovada a Constituição, a Assembleia Constituinte dissolveu-se automaticamente a 2 de Abril de 1976.

Lei Eleitoral e eleição da Assembleia Constituinte

Nos termos previstos na Lei n.º 3/74, de 14 de Maio, foi criada por Resolução do Conselho de Ministros de 24 de Maio de 1974 uma comissão visando o estabelecimento de uma lei eleitoral para a Assembleia Constituinte. A Comissão levou a cabo os seus trabalhos entre 3 de Junho e 15 de Novembro de 1974.

Dos trabalhos da Comissão, e da discussão política que se seguiu, resultou a publicação dos seguintes diplomas:

  1. Lei Eleitoral Relativa ao Recenseamento (Decreto-Lei n.º 621-A/74, de 15 de Novembro) — Esta Lei determina a realização do recenseamento eleitoral e fixou como cidadãos com capacidade eleitoral activa (logo no artigo 1.º) os cidadãos portugueses de ambos os sexos, maiores de 18 anos, completados até 28 de Fevereiro de 1975, residentes no território eleitoral ou nos territórios ultramarinos ainda sob administração portuguesa, assim como os aí não residentes indicados no presente diploma, considerando-se como território eleitoral o território do continente e ilhas adjacentes. A capacidade passiva (artigos 5.º a 8.º) estava reservada a todos os cidadãos eleitores maiores de 21 anos, excluindo, contudo, quem que não tivesse a cidadania portuguesa há pelo menos quinze anos, não soubesse ler e escrever português, não residisse no território eleitoral ou nos territórios ultramarinos ainda sob administração portuguesa há pelo menos seis meses, contados em relação à data da marcação das eleições, salvo os que se encontrem fora dele em virtude de missão de Estado ou de serviço público, reconhecido como tal pela autoridade competente, os magistrados judiciais ou do Ministério Público e os militares, enquanto prestarem serviço activo e ainda aqueles a que a lei o impedisse por incapacidades cívicas determinadas pelo exercício de certas funções públicas ou pela participação em organizações antidemocráticas antes de 25 de Abril de 1974. O texto foi sucessivamente alterado pelos seguintes diplomas:
  2. #Declaração de Rectificação n.º 293/74, de 17 de Dezembro;
  3. #Decreto-Lei n.º 3/75, de 7 de Janeiro;
  4. #Decreto-Lei n.º 5/75, de 7 de Janeiro;
  5. #Decreto-Lei n.º 38-B/75, de 31 de Janeiro;
  6. #Decreto-Lei n.º 86/75, de 27 de Fevereiro.
  7. Lei das incapacidades cívicas (Decreto-Lei n.º 621-B/74, de 15 de Novembro) — Determina quais os indivíduos que, por funções exercidas anteriormente a 25 de Abril de 1974, não podem ser eleitores da Assembleia Constituinte ou eleitos para a mesma Assembleia. Estabelece que não teriam capacidade eleitoral activa ou passiva na eleição da Assembleia Constituinte os titulares dos órgãos de soberania e os altos funcionários do Estado Novo. Este diploma foi alterado pelo:
  8. #Decreto-Lei n.º 4/75, de 7 de Janeiro — Alargou a incapacidade cívica aos altos magistrados judiciais.
  9. Lei Eleitoral (2.ª parte - Organização do processo eleitoral) (Decreto-Lei n.º 621-C/74, de 15 de Novembro) — Esta Lei determina a forma de eleição dos deputados à Assembleia Constituinte, fixando que os círculos eleitorais eram distritais, elegendo cada círculo um deputado por cada 25 000 eleitores ou fracção superior a 12 500, que as candidaturas seriam em lista, com os mandatos a serem distribuídos de acordo com o método de Hondt. Esta Lei cria a Comissão Nacional de Eleições e regula todo o processo eleitoral, incluindo a propaganda e outras matérias de carácter logístico e procedimental. Foi alterada pelos seguintes diplomas:
  10. #Decreto-Lei n.º 86/75, de 27 de Fevereiro.
  11. #Decreto-Lei n.º 101-A/75, de 3 de Março.
  12. #Decreto-Lei n.º 109/75, de 7 de Março.
  13. #Decreto-Lei n.º 137-C/75, de 17 de Março.
  14. #Decreto-Lei n.º 137-D/75, de 17 de Março.
  15. #Decreto-Lei n.º 141-B/75, de 19 de Março.
  16. #Decreto-Lei n.º 141-C/75, de 19 de Março.

Para além da legislação de enquadramento atrás apontada, o Governo Provisório e o Conselho da Revolução foram produzindo legislação avulsa sobre matéria eleitoral, entre a qual se destaca:

  1. Decreto-Lei n.º 137-E/75, de 17 de Março — Impede a participação nas eleições para a Assembleia Constituinte dos seguintes partidos: Partido da Democracia Cristã, Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado e Aliança Operária Camponesa.
  2. Decreto-Lei n.º 147-A/75, de 21 de Março — Insere várias disposições relativas à apresentação de novas listas de candidaturas por parte do Centro Democrático Social (CDS) para as eleições para a Assembleia Constituinte em todos os círculos em que as haja apresentado em frente eleitoral com o Partido da Democracia Cristã (PDC).
  3. Lei eleitoral para os territórios ultramarinos (Decreto-Lei n.º 73-A/75, de 20 de Fevereiro) — Fixa as normas a que devia obedecer a eleição de deputados à Assembleia Constituinte pelos cidadãos residentes nos territórios ultramarinos então sob administração portuguesa. Este diploma foi complementado e alterado pelos seguintes:
  4. #Decreto-Lei n.º 93-A/75, de 28 de Fevereiro — Define as normas a que deve obedecer o exercício do direito de voto para a eleição dos Deputados à Assembleia Constituinte por parte dos militares portugueses que se encontram a prestar serviço nos territórios ultramarinos ainda sob administração portuguesa.
  5. #Decreto-Lei n.º 93-B/75, de 28 de Fevereiro — Define as normas a que deve obedecer a participação no processo para a eleição de Deputados à Assembleia Constituinte dos cidadãos eleitores não militares recenseados no círculo eleitoral de Moçambique.
  6. #Decreto-Lei n.º 101-B/75, de 3 de Março.
  7. #Despacho conjunto regulamentar de 17 de Março de 1975 — Determina que a inscrição no recenseamento efectuada no território eleitoral por militares que, à data da eleição de Deputados à Assembleia Constituinte, se encontrem a prestar serviço nos territórios ultramarinos ainda sob a administração portuguesa deve ser transferida para esses territórios para efeitos do cumprimento do Decreto-Lei n.º 93-A/75. Mais determina que é o mesmo regime extensivo aos cônjuges, não separados de facto ou judicialmente, dos militares acima referidos e que naqueles territórios se encontrem, em virtude da prestação de serviço dos seus familiares.
  8. Decreto-Lei n.º 85-D/75, de 26 de Fevereiro — Estabelece normas sobre o tratamento jornalístico que deve ser dado pelas publicações noticiosas diárias, ou não diárias de periodicidade inferior a quinze dias, às diversas candidaturas à Assembleia Constituinte.
  9. Decreto-Lei n.º 93-C/75, de 28 de Fevereiro — Esclarece quais os documentos que devem instruir os processos de candidatura a deputado à Assembleia Constituinte.
  10. Decreto-Lei n.º 114-A/75, de 7 de Março — Fixa as normas a que deve obedecer a participação na eleição para a Assembleia Constituinte por parte dos eleitores residentes no estrangeiro.
  11. Decreto-Lei n.º 137-B/75, de 17 de Março — Estabelece as condições em que podem exercer o seu direito de voto os cidadãos portugueses devidamente recenseados que, à data da eleição dos Deputados à Assembleia Constituinte, presumivelmente se encontrem embarcados.
  12. Decreto-Lei n.º 163-A/75, de 27 de Março — Estabelece penas para quem perturbasse a eleição para a Assembleia Constituinte.

Nos termos do n.º 4 do artigo 4.º da Lei n.º 3/74, de 14 de Maio, as eleições para a Assembleia Constituinte deveriam ocorrer até 31 de Março de 1975. Contudo, face aos atrasos na elaboração do recenseamento eleitoral e à instabilidade política que se vivia, pela Lei n.º 2/75, de 31 de Janeiro, foi alterado o prazo para realização das eleições, fixando-se então como data limite o dia 25 de Abril de 1975.

Concluído o recenseamento eleitoral, pelo Decreto n.º 53-A/75, de 11 de Fevereiro, foi marcado o dia 12 de Abril de 1975 como data de eleição dos Deputados à Assembleia Constituinte.

Contudo, aquela data foi alterada para 25 de Abril de 1975 pelo Decreto n.º 141-A/75, de 19 de Março, o qual invoca como razão a necessidade de dirimir conflitos provocados por identidades ou semelhanças de denominações, siglas ou símbolos de partidos existentes, e que alguns já invocaram, consigna prazos que levantam obstáculos impeditivos, por razões de ordem técnica, do cumprimento da data inicialmente decretada para o dia da eleição.

Eleita a Assembleia, pelo Decreto n.º 222-A/75, de 10 de Maio, foi a mesma convocada para reunir em sessão instaladora a 2 de Junho, com o fim de elaborar e aprovar a nova Constituição Política da República Portuguesa.

Resultados eleitorais e deputados eleitos

No acto eleitoral realizado a 25 de Abril de 1975, para o qual existiam 6.231.372 eleitores inscritos, votaram 5.711.829 (91,66%), tendo-se abstido apenas 519.543 (8,34%). Concorreram 14 partidos e movimentos cívicos, obtendo os seguintes resultados:

Partido votos %
e mandatos
Associação de
Defesa dos Interesses
de Macau (ADIM)
1622


0,03%
1
Centro Democrático
de Macau (CDM)
1030


0,02%
0
Centro Democrático
Social (CDS)
434.879


7,61%
16
Frente Eleitoral
de Comunistas
(Marxistas-Leninistas) - FEC(m-l)
33.185


0,58%
0
Frente Socialista
Popular (FSP)
66.307


1,16%
0
Liga Comunista
Internacionalista (LCI)
10.835


0,19%
0
Movimento Democrático
Português (MDP/CDE)
236.318


4,14%
5
Movimento de Esquerda
Socialista (MES)
58.248


1,02%
0
Partido Comunista
Português (PCP)
711.935


12,46%
30
Partido Popular
Democrático (PPD)
1.507.282


26,39%
81
Partido Socialista (PS) 2.162.972


37,87%
116
Partido Popular
Monárquico (PPM)
32.526


0,57%
0
Partido de
Unidade Popular (PUP)
13.138


0,23%
0
União Democrática
Popular (UDP)
44.877


0,79%
1

Nos termos do Decreto-Lei n.º 137-E/75, de 17 de Março, foi impedida a participação nas eleições para a Assembleia Constituinte dos seguintes partidos: Partido da Democracia Cristã (PDC), Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado (MRPP) e Aliança Operária Camponesa (AOC).

wikipédia

Sem comentários: