ESTA SEMANA NA
"VISÃO"
Cientistas portugueses descobrem
.forma de travar metástases cerebrais
Proteina do feijão pode transformar-se num medicamento para mulheres com cancro da mama avançado. Investigação foi financiada pela associação Laço
Tudo começou com uma desilusão. A partir de 2008, um estudo atrás do
outro vieram provar que a aposta em rastreio ao cancro da mama, através
de mamografia, não estava a dar os resultados esperados. Os cancros
verdadeiramente agressivos, que se espalham a outros órgãos e acabam por
matar, continuavam a fazer vítimas.
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Num dos estudos,
feito no Canadá, concluiu-se que a probabilidade de uma mulher que
cumpre a mamografia anual morrer de cancro da mama é igual à de uma
mulher que não segue a recomendação. Face a estes resultados, Lynne
Archibald, fundadora da associação de apoio a mulheres com cancro da
mama Laço, promoveu um debate na organização e acabou por ficar decidido
mudar completamente a estratégia da instituição. Em vez de apoiar o
rastreio, como tinha sido a tónica desde a sua fundação, o foco passou a
estar no apoio à investigação. "O cancro da mama metastático não está a
diminuir, as mulheres continuam a morrer e percebemos que a forma de
mudar isto é apoiar a ciência", conta. "Porque quando há dinheiro as
coisas acontecem."
Diana Gaspar, investigadora do Instituto de
Medicina Molecular (IMM) João Lobo Antunes, foi uma das beneficiárias
das bolsas financiadas pela associação. Agora, três anos depois de ter
iniciado o projeto, saíram os primeiros resultados. Em laboratório, a
cientista verificou que uma proteína extraída do feijão, a PvD1,
consegue travar a invasão do cérebro pelas células tumorais. "Um grupo
no Brasil já conhecia as propriedades antifúngicas da PvD1. Nós quisemos
verificar as suas capacidades antitumorais", explica Diana Gaspar.
É
o grande terror de uma mulher diagnosticada com cancro da mama: que
este se espalhe e chegue ao cérebro. Apesar de não haver dados exatos,
estima-se que existam em Portugal cinco mil mulheres com cancro da mama
metastático, para quem há poucas opções terapêuticas e ainda um forte estigma.
Com o financiamento da Laço, Diana Gaspar foi capaz de verificar que
esta pequena proteína interfere com a capacidade de as células tumorais,
transportadas pela corrente sanguínea, se fixarem à barreira
hemato-encefálica, que protege o cérebro - mas que deixa escapar alguns
invasores. "A proteína diminui a viabilidade das células tumorais que,
mesmo escapando para a corrente sanguínea, chegam à barreira com as
propriedades alteradas."
O trabalho, publicado na revista científica Nanoscale,
dependeu do uso de um equipamento ultrassofisticado, o microscópio de
força atómica, que permite observar ao nível do átomo. Todos os
consumíveis gastos no projeto foram suportados pela bolsa da Laço, a
associação que acabou por se transformar no Fundo iMM-Laço e está, desde
o início de 2018, sedeado no próprio IMM. "Foi uma tristeza para todos
constatar que a deteção precoce não evitava as mortes por cancro da mama
avançado. Mas acreditamos na Ciência", sublinha Lynne Archibald.
Fã
confessa de feijoada, Diana Gaspar esclarece, no entanto, que não é por
se comer feijão que se conseguirá ter qualquer efeito na prevenção do
cancro da mama. "Seria preciso comer muitos quilos de feijão de uma só
vez."
O caminho agora será prosseguir a investigação, testando o
efeito da proteína do feijão em ratinho. É possível que, no futuro,
fique disponível um concentrado de feijão num comprimido.
* Não percam tempo.
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