25/02/2020

DUARTE MARQUES

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Os bónus da TAP 
deixaram a reversão 
com o rabo de fora

Este governo já nos habituou a gritar muito uma coisa e a fazer o seu contrário. A estridência do anúncio tem sido, aliás, um sintoma de que o governo vai fazer o oposto do que anuncia. O “fim da austeridade”, que se traduz agora na maior carga fiscal de sempre. O “combate à obsessão pelo défice”, que se traduz agora em superavit à custa da qualidade do SNS, dos transportes, e do definhamento generalizado do Estado Social por causa do corte cego no investimento público.

Ou a “nacionalização” da TAP, que, de acordo com António Costa, na altura, “não foi ideológica, mas uma questão de soberania nacional porque, haja o que houver com os privados, manteremos a companhia” para agora o governo reconhecer publicamente que o Estado não tem qualquer intervenção na gestão da TAP (como ficou demonstrado na questão dos prémios), no seu controlo (uma vez que a UTAM não acompanha a empresa) nem na sua estratégia (a mudança de acionistas privados, que controlam a gestão e definem a estratégia da empresa, parece estar a ser negociada sem qualquer intervenção do Estado, mas sendo certo que o Estado continuará a assumir 50% dos prejuízos).

À semelhança do que aconteceu com o modelo de venda do Novo Banco, a reversão da TAP foi um péssimo negócio para os contribuintes, pois apenas aumentou a responsabilidade do Estado sobre os prejuízos. A polémica em torno dos bónus na TAP veio revelar que o Estado não manda nada na companhia aérea e se dúvidas houvesse sobre isso eu recomendava aos leitores do Expresso que procurassem no site da UTAM – Unidade Técnica de Acompanhamento e Monitorização do Sector Público Empresarial (http://www.utam.pt/) os relatórios já feitos sobre a TAP.

Recordo que à UTAM, que integra o Ministério das Finanças, compete auditar e monitorizar a gestão das empresas públicas onde o Estado tem uma participação dominante (normalmente 50% ou mais). 

Como já tiveram oportunidade de verificar não há qualquer relatório no site da UTAM sobre a TAP. Sim, há lá Relatórios sobre a Estamo, EPAL, Adp Energia, STCP, Mobi-E, CGD, Empordef, entre outras, mas não há nada sobre a TAP que, segundo o Governo, teria voltado a ser maioritariamente pública.

Isto revela apenas que a reversão anunciada pelo Governo não passou de uma grande TANGA. Aliás, para concretizar a “reversão”, “a bem ou a mal”, como anunciou na altura António Costa, o Estado assumiu uma maior quota parte dos prejuízos a troco de… nada! Foi quase como disse António Costa… foi “a bem” para os privados e “a mal” para o Estado. O Estado, no fundo, comporta-se como se tivesse feito uma “concessão” da companhia aérea, com a diferença de que não recebe nada pelo “aluguer” e ainda assume os prejuízos gerados pelos privados.

Com esta suposta reversão, o Estado comprou parte do capital do social da TAP, tem maior percentagem que os privados, mas assinou um acordo Parassocial que dá total responsabilidade de gestão aos investidores privados. Ora, como tem agora mais capital social o Estado assume também uma maior responsabilidade nos prejuízos (pelos vistos isso não foi acautelado no “acordo parassocial”.

A brilhante reversão de Centeno, Costa, Pedro Marques e Lacerda Machado apenas aumentou a responsabilidade do Estado (dos contribuintes) sobre os prejuízos e não sobre a gestão ou sobre as prioridades. Que empresário não quereria um Estado amigo como este? Tal como na China, são agora os privados que lucram com as empresas públicas.

Poucos terão reparado, mas, mais uma vez, o Tribunal de Contas criticou a reversão da TAP operada por António Costa dizendo que esta “não é eficiente” lembrando que o Estado “assume mais riscos do que o privado”.

Importa aqui recordar que o modelo de venda do Novo Banco foi também uma fraude política de Mário Centeno e António Costa que, para fazerem “boa figura” com um cheque chorudo, deram garantias leoninas aos compradores que graças a isso têm exigido ao Fundo de Resolução cerca de mil milhões de euros/ano. Se tivessem tido o bom senso de vender por menos, mas com menos garantias, estariam assim a proteger os contribuintes e não os acionistas americanos. Mas parece que a prioridade foi anunciar um bom “número de venda” em conferência de imprensa. Mais uma vez parece um negócio da China para os empresários que lucram com as “empresas públicas”.

São exemplos simples que revelam manipulação da realidade por parte do governo e que confirma que o preconceito ideológico prejudica os contribuintes. O Estado substituiu os privados e estes vêem os seus prejuízos assumidos pelo Estado. Maravilha.

IN "EXPRESSO"
25/02/20

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