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IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
25/02/19
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A cabeça caída do Papa
Para
quem ainda lambe feridas que não saram com o tempo, as palavras
proferidas ontem pelo Papa Francisco, no encerramento da cimeira mundial
sobre abusos sexuais na Igreja Católica, foram meros paliativos
espirituais.
As vítimas
queriam sangue para derramar sobre as memórias. Mas ficaram de coração
mirrado. Compreende-se que não se contentem com retóricas recicladas.
Mas a Igreja, que se ajoelhou em penitência perante o Mundo, já tinha
avisado ao que (não) vinha. Expiar a culpa é uma coisa, encetar uma
revolução interna ao fim de quatro dias de reflexão é outra. É, por
isso, igualmente compreensível que os mais distintos eclesiásticos
tenham refreado as expectativas de crentes e não crentes ainda antes de o
aggiornamento despontar. De resto, basta lermos os princípios
orientadores difundidos pelo Papa para concluirmos que podiam ter sido
arquitetados antes do encontro. Mas ninguém com um conhecimento
rudimentar do que tem sido o comportamento da Igreja na gestão mediática
destes crimes repugnantes sobre os mais frágeis pode revelar-se
surpreendido perante tamanha vacuidade.
Não
devemos, porém, reduzir a uma simples coreografia calculista o enorme
avanço que representa para o Vaticano esta convocatória global. A cabeça
caída do Papa Francisco, há dias, quando escutava o testemunho das
vítimas, é uma poderosa evidência da dimensão da "cratera do vulcão",
como o definiu Ratzinger. Porque traduz não apenas a crise de identidade
e credibilidade que grassa na instituição, como simboliza de certa
forma o fim do ideário que a alcandorou a referência moral do Mundo.
A
Igreja já chorou. A Igreja já mostrou arrependimento. Agora, tem de
empreender reformas profundas. Entre outros gestos de boa fé, promovendo
o fim do celibato e abrindo o sacerdócio às mulheres. Exorcizar de
peito aberto os dias sombrios do passado é um caminho palpável na
direção da luz. Mas para que a cabeça de Francisco possa levantar-se de
novo é urgente que em cada paróquia por esse mundo fora se comece a
projetar o futuro com olhos menos turvos. A revolução nos corações
preconizada pelo Papa tem de começar nas mentalidades.
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
25/02/19
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