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Naturalmente religioso
Depois da “inteligencia sentiente” , de Xavier
Zubiri e da “inteligência emocional”, de autores vários, acrescento uma
outra frase (conhecidíssima, aliás): “a alma é naturalmente religiosa”
que me parece tão científica como as duas anteriores. Quando pode
dizer-se que um conhecimento é científico? A resposta mais simples (sem
ter de remontar a Bachelard, Althusser, Foucault, Piaget, Thomas Kuhn,
Karl Popper, Paul Feyerabend e outros mais) parece-me esta: é científico
o que pode controlar-se, experimentar-se, através de factos e a
comunidade científica sustenta a sua cientificidade. Ora, parece-me
poder adiantar-se (os factos assim o atestam) que é religioso o
comportamento de muitos adeptos do futebol diante dos seus ídolos.
Depois de Marx, Nietzsche e Freud, os “mestres da suspeita”, são também
muitos os que neles encontram a força bastante para declarar que são
ateus.
Alguns apresentam mesmo de modo solene, formal e meticuloso a sua crença: “Sou ateu, graças a Deus!”. No entanto, embora o seu ateismo, os adeptos apaixonados do futebol são verdadeiros apelos veementes de Deus, quando celebram as vitórias dos seus clubes ou dos seus países, quando invocam os nomes dos seus atletas preferidos e os cantam e rezam, como justificação última de uma grande alegria, de um prazer inenarrável. Ou seja, o ateismo, no futebol-espetáculo, esconde um conhecimento obscuro, digamos mesmo: inconsciente, de Deus, pois que não nomeia, com verdade, o que se sente e o que vive. O Pelé ou o Maradona, o Eusébio ou o Cruyff, o Cristiano Ronaldo ou o Messi, o Rui Patrício ou o Griezmann, o Renato Sanches ou o Neymar não são deuses, mas homens. De facto, superdotados à prática do futebol, mas homens tão-só! Homens que cantam, que gritam, que amam, que pensam, que sofrem, como seres humanos que são! Homens que, nos momentos mais dolorosos das suas vidas, também agradecem uma palavra amiga que lhes recorde que, para além de todo o sofrimento, há uma esperança, para além de todas as dificuldades, há uma fé, para além de toda a escuridão, há uma luz, para além da miséria humana, Deus existe!
“A página oficial das seleções de Portugal, no Facebook, registou um aumento de 46,2% de seguidores informou ontem a Federação Portuguesa de Futebol, citada pela Agência Lusa. De acordo com este organismo, o desempenho de Portugal, no Europeu levou a que 747 internautas começassem a seguir a página das seleções, que ontem somava quase 2,4 milhões de gostos. Impressiona ainda olhar ao número de pessoas alcançadas pelas publicações desta página, que ultrapassou os 375,6 milhões de utilizadores, os quais deixaram 196,6 milhões de gostos e mais de 500 mil comentários, referiu a FPF. A publicação que contabilizou maior número de interações e alcance foi a que incluiu uma foto de Cristiano Ronaldo e Ricardo Quaresma, com a Taça Henry Delaunay, ainda no Stade de France, a qual gerou 604 mil interações” (A Bola, 2016/7/13). Números impressionantes que (quase) dão bem a medida da popularidade desta modalidade desportiva e dos seus principais intérpretes. Mas é certo que tudo passa, só Deus não passa. O Miguel Torga, que se dizia ateu, escreveu um inolvidável poema, a este propósito, no seu livro Câmara Ardente: “Desfecho Não tenho mais palavras Gastei-as a negar-te (Só a a negar-te eu pude combater O terror de te ver Em toda a parte). Fosse qual fosse o chão da caminhada Era certa a meu lado A divina presença impertinente Do teu vulto calado E paciente... E lutei como luta um solitário Quando alguém lhe perturba a solidão. Fechado num ouriço de recusas, Soltei a voz, arma que tu não usas, Sempre silencioso na agressão. Mas o tempo moeu na sua mó O joio amargo do que te dizia... Agora somos dois obstinados, Mudos e malogrados, Que apenas vão a par na teimosia”.
Há, de facto, dentro de cada um de nós, um permanente desassossego entre o pouco que somos e o muito que desejamos ser, como exclamou, um dia, Santo Agostinho, “grande nas coisas grandes e máximo nas coisas mínimas”. Por isso, no meu modesto entender, é possível abstrair de Deus, negá-Lo parece-me difícil. “A divina presença impertinente” não cessa de nos fazer sentir que o Absoluto está sempre por alcançar. E este anseio de “ser mais” todos o sentimos: escritores e filósofos notáveis; cientistas e técnicos de justificado prestígio; artistas e atletas de retumbante fama, na Comunicação Social. E, diante de todos nós, uma bifurcação se ergue: a vida ou é um absurdo, ou é um mistério. Sem a ideia de Deus, a vida parece-me francamente um absurdo, “uma paixão inútil”, como Sartre o acentuava. Com Deus, a vida surge-me, de facto, como um mistério, mas em que a esperança não morre. Como nunca morreu, no engenheiro Fernando Santos, selecionador nacional de futebol. Porque acredita em Deus! Porque é, e não esconde, naturalmente religioso. E, por isso, com o aprumo e a galhardia de quem nunca perdeu a esperança. Em despeito de ventos e marés, quando as críticas não deixavam de fustigar as exibições medíocres da “equipa de todos nós”, ele permaneceu imperturbável, não se deixando submergir, nem deixando submergir os que o rodeavam.
Em contraste com o nosso meio informativo, aqui e além, tão ebuliente mas com tanta flacidez e inconsistência, o selecionador nacional de futebol denotou uma vontade sólida e bem vertebrada. Sentia, de certo, Deus ao seu lado. A fé é uma forma de conhecimento, ao lado das demais. E o engenheiro Fernando Santos despiu-se das ideias feitas, das convenções entronizadas e dos pensares que toda a gente pensa. Não foi integrista, nem ultramontano, nem cruzadista. E mostrou que pensava bem e sabia muito. E que o futebol é mais, muito mais que futebol!
Alguns apresentam mesmo de modo solene, formal e meticuloso a sua crença: “Sou ateu, graças a Deus!”. No entanto, embora o seu ateismo, os adeptos apaixonados do futebol são verdadeiros apelos veementes de Deus, quando celebram as vitórias dos seus clubes ou dos seus países, quando invocam os nomes dos seus atletas preferidos e os cantam e rezam, como justificação última de uma grande alegria, de um prazer inenarrável. Ou seja, o ateismo, no futebol-espetáculo, esconde um conhecimento obscuro, digamos mesmo: inconsciente, de Deus, pois que não nomeia, com verdade, o que se sente e o que vive. O Pelé ou o Maradona, o Eusébio ou o Cruyff, o Cristiano Ronaldo ou o Messi, o Rui Patrício ou o Griezmann, o Renato Sanches ou o Neymar não são deuses, mas homens. De facto, superdotados à prática do futebol, mas homens tão-só! Homens que cantam, que gritam, que amam, que pensam, que sofrem, como seres humanos que são! Homens que, nos momentos mais dolorosos das suas vidas, também agradecem uma palavra amiga que lhes recorde que, para além de todo o sofrimento, há uma esperança, para além de todas as dificuldades, há uma fé, para além de toda a escuridão, há uma luz, para além da miséria humana, Deus existe!
“A página oficial das seleções de Portugal, no Facebook, registou um aumento de 46,2% de seguidores informou ontem a Federação Portuguesa de Futebol, citada pela Agência Lusa. De acordo com este organismo, o desempenho de Portugal, no Europeu levou a que 747 internautas começassem a seguir a página das seleções, que ontem somava quase 2,4 milhões de gostos. Impressiona ainda olhar ao número de pessoas alcançadas pelas publicações desta página, que ultrapassou os 375,6 milhões de utilizadores, os quais deixaram 196,6 milhões de gostos e mais de 500 mil comentários, referiu a FPF. A publicação que contabilizou maior número de interações e alcance foi a que incluiu uma foto de Cristiano Ronaldo e Ricardo Quaresma, com a Taça Henry Delaunay, ainda no Stade de France, a qual gerou 604 mil interações” (A Bola, 2016/7/13). Números impressionantes que (quase) dão bem a medida da popularidade desta modalidade desportiva e dos seus principais intérpretes. Mas é certo que tudo passa, só Deus não passa. O Miguel Torga, que se dizia ateu, escreveu um inolvidável poema, a este propósito, no seu livro Câmara Ardente: “Desfecho Não tenho mais palavras Gastei-as a negar-te (Só a a negar-te eu pude combater O terror de te ver Em toda a parte). Fosse qual fosse o chão da caminhada Era certa a meu lado A divina presença impertinente Do teu vulto calado E paciente... E lutei como luta um solitário Quando alguém lhe perturba a solidão. Fechado num ouriço de recusas, Soltei a voz, arma que tu não usas, Sempre silencioso na agressão. Mas o tempo moeu na sua mó O joio amargo do que te dizia... Agora somos dois obstinados, Mudos e malogrados, Que apenas vão a par na teimosia”.
Há, de facto, dentro de cada um de nós, um permanente desassossego entre o pouco que somos e o muito que desejamos ser, como exclamou, um dia, Santo Agostinho, “grande nas coisas grandes e máximo nas coisas mínimas”. Por isso, no meu modesto entender, é possível abstrair de Deus, negá-Lo parece-me difícil. “A divina presença impertinente” não cessa de nos fazer sentir que o Absoluto está sempre por alcançar. E este anseio de “ser mais” todos o sentimos: escritores e filósofos notáveis; cientistas e técnicos de justificado prestígio; artistas e atletas de retumbante fama, na Comunicação Social. E, diante de todos nós, uma bifurcação se ergue: a vida ou é um absurdo, ou é um mistério. Sem a ideia de Deus, a vida parece-me francamente um absurdo, “uma paixão inútil”, como Sartre o acentuava. Com Deus, a vida surge-me, de facto, como um mistério, mas em que a esperança não morre. Como nunca morreu, no engenheiro Fernando Santos, selecionador nacional de futebol. Porque acredita em Deus! Porque é, e não esconde, naturalmente religioso. E, por isso, com o aprumo e a galhardia de quem nunca perdeu a esperança. Em despeito de ventos e marés, quando as críticas não deixavam de fustigar as exibições medíocres da “equipa de todos nós”, ele permaneceu imperturbável, não se deixando submergir, nem deixando submergir os que o rodeavam.
Em contraste com o nosso meio informativo, aqui e além, tão ebuliente mas com tanta flacidez e inconsistência, o selecionador nacional de futebol denotou uma vontade sólida e bem vertebrada. Sentia, de certo, Deus ao seu lado. A fé é uma forma de conhecimento, ao lado das demais. E o engenheiro Fernando Santos despiu-se das ideias feitas, das convenções entronizadas e dos pensares que toda a gente pensa. Não foi integrista, nem ultramontano, nem cruzadista. E mostrou que pensava bem e sabia muito. E que o futebol é mais, muito mais que futebol!
Professor catedrático da Faculdade de Motricidade Humana e Provedor para a Ética no Desporto
IN "A BOLA"
16/07/16
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