O amparo pesa menos
Da mesma forma como o presidente do Novo
Banco, Stock da Cunha, não sabe quanto vale o banco que todos os dias
avalia, também eu não sei quanto vale o Benfica deste ano, já o tendo
visto jogar bem mais do que 24 vezes. A questão futebolística não se
prende só com números financeiros ou com a incompetência, claro. Pelo
contrário. Prende-se com pontos e com competência. Por isso mesmo, quase
todos os que vêem futebol tentando manter alguma equidistância - amando
os seus clubes mas não deixando que a falta de sensatez lhes tolde a
razão - desconhecem verdadeiramente quanto vale este Benfica, tendo algo
como certo: o Benfica não vale os 62 pontos que a classificação indica à
24ª jornada.
Alguns adeptos alimentam a ideia de que quem
tece críticas às arbitragens nesta Liga é um antibenfiquista primário.
Acontece que o antibenfiquismo primário é uma ilusão de grandeza. É uma
ideia de estatura que acompanha décadas e décadas de grandes conquistas,
percebo. Mas é uma ilusão de grandeza atroz no momento actual. Como é
qualquer forma de acoplar a palavra "anti" a algo primário no desporto.
Não pode ser assim tão importante. Quem exerce o direito de opinião,
apontando os sucessivos erros que beneficiaram o Benfica este ano ao
ponto de não haver já tempo ou dimensão para o equilíbrio que costuma
nivelar os fins de época (é verdade, as coisas acabam normalmente por
ficar equiparadas no fim e em benefício dos três denominados "grandes"
clubes) não é portador de uma voz solitária. Dos comentadores mais
díspares, das mais diversas origens, proveniências ou percursos de
solidariedade ou afecto clubista surgem vozes unânimes. Este ano,
aqueles que desmentem - a todo o custo - que o Benfica tem sido
beneficiado por erros de arbitragem sistemáticos, tentam comprar uma
parte da realidade que não existe. E a realidade, desculpem, não está à
venda.
E como a realidade não está à venda, então
imagine-se! Imagine-se que isto se estava a passar exactamente ao
contrário. Que era o F. C. Porto que tinha sido beneficiado directamente
com pontos nos jogos com o Boavista no Bessa, com o Estoril no António
Coimbra da Mota, com o Nacional na Choupana, com o Rio Ave e o Gil
Vicente na Luz. Sim, nem me refiro à Académica ou ao Moreirense nos seus
redutos. Apenas e só aos resultados "amarradinhos" por um golo de
diferença. Imagine-se! O que se diria, o que se escreveria, os pedidos
de audiência às mais altas instâncias políticas e desportivas, o
regabofe ao quadrado, as capas dos jornais e as insinuações, os livros e
os filmes, o circo sem palhaços. Na corrida de fundo por mais uma Taça
da Liga, o Benfica faz da conquista do bicampeonato a razão maior da sua
existência desportiva esta época. E faz muitíssimo bem. Há 30 épocas
que não ganha dois campeonatos consecutivos e, tendo sido este ano
eliminado das competições europeias enquanto o Sol nascia, não pode
alegar a maldição de Béla Guttmann que o "impede" de conquistar qualquer
título internacional há 53 anos. Aposta tudo, distribui jogo e as
coisas vão sucedendo das mais diversas formas mas sempre com o bom
feitio, bonomia e complacência da maioria porque em relação ao Benfica
continuamos num país de "brandos costumes". A maioria.
Para
além dos pontos referidos que caíram ao colo (entre 8 a 10 pontos, com
alguma benevolência), à 24.ª jornada o Benfica teve 16 jogadores de
adversários castigados na jornada anterior e, como tal, impedidos de
jogar (não contabilizando 4 outros casos "estranhos" com impedimentos
físicos que, convenhamos, já aconteceram com todos os clubes); 2 casos
"nada estranhos" de Deyverson e Miguel Rosa...; 10 jogadores adversários
expulsos em confronto directo; 4 golos limpos anulados a adversários
(Boavista, V. Setúbal, Rio Ave, Nacional); 3 expulsões mal assinaladas a
seu favor (Estoril, Penafiel, Arouca); 7 golos precedidos de
irregularidades (Académica, Estoril, Gil, V. Setúbal, Boavista,
Belenenses, Moreirense); 3 penalties mal marcados que o favoreceram
(Belenenses, Paços, Moreirense), 8 penalties por marcar a favor dos
adversários (V. Setúbal nos dois jogos, Estoril, Arouca, Braga x2 no
Axa, Paços, Boavista). Viu serem perdoadas 3 expulsões a jogadores seus
nos primeiros 50 minutos de jogo (Moreirense, Marítimo, Estoril) em
jogos apertados. Felizmente que não sofreu qualquer golo ferido por
qualquer irregularidade. Podem achar que estou a exagerar. Então cortem
os números para metade. Continua a ser impressionante, não?
Como
adepto do F. C. Porto, já nem refiro erros que nos penalizaram em
Guimarães e no Estoril. E não venham com o ladainha de Penafiel, onde
nos dois primeiros golos o passe é realizado para trás ou, no mínimo e
com honestidade intelectual, sempre subsistirão dúvidas. Futebolês? Não.
Essa é uma linguagem própria que o futebol apresenta dentro das quatro
linhas. Como é evidente que todos os clubes em diferentes épocas já
foram prejudicados e beneficiados, não é isso que está em causa. Como
não estão em causa 41 anos de futebol no Estado Novo e pouco mais de 41
anos de futebol em democracia. Como não estão em causa escutas ilegais
que geograficamente pararam cirurgicamente no centro do país. Como se,
na realidade, fosse relevante se o ano passado foi assim ou assado ou se
há dois anos tenha sido diferente ou igual... Falemos claro, é deste
ano que falamos! Branqueamento, não. Este campeonato está poluído de
erros, demasiados erros. E é por isso que afirmo que é mais possível
(não escrevo a palavra "fácil") ganhar a Liga dos Campeões do que a Liga
nacional. Parabéns a Jorge Jesus que tem feito o que deve e até mais do
que suporia poder fazer. Onde estaria ele, fora da Europa do futebol e
da Taça de Portugal, sem os erros a que temos assistido jornada após
jornada? Que contestação enfrentaria, neste momento, Luís Filipe Vieira?
Em que encruzilhada estariam fora da luta pela Liga portuguesa? Seria
um caminho em curto-circuito. Até o jornal espanhol "As" se refere aos
erros da arbitragem desta Liga, reconhecidos como crassos. Em Portugal,
brandos costumes, como no antigamente. Assim vai o amparo, já que o
andor nem pesa.
10/03/15
.
Sem comentários:
Enviar um comentário