.
Um elevador social muito desigual
Os dados do último relatório único do Observatório do Emprego revelam, novamente, as desigualdades salariais entre mulheres e homens nos Açores, com as mulheres a auferirem uma remuneração média inferior à dos homens que varia entre 92,43€ e 706,60€, no caso dos quadros superiores.
Comparando dois funcionários licenciados, um homem e uma mulher, a remuneração desta última é inferior em 413,82€, uma situação injustificável e que perdura há demasiado tempo.
Se a educação é realmente um elevador social, não podemos aceitar este cenário em que as mulheres partem do -3 e os homens do piso 0. É preciso equilibrar este elevador e tornar o caminho de ambos justo.
Para além disso, existem apenas 35% de mulheres nos Açores a exercer cargos dirigentes, diretores e gestores executivos. E curiosamente a participação das mulheres, em Portugal, nestes tipos de cargos e mesmo na política está sempre na casa dos 30%. No parlamento dos Açores temos apenas 33% de mulheres (deputadas), na Assembleia da República temos apenas 37% (deputadas), no entanto a população açoriana e portuguesa é constituída por 51% e 52% de mulheres, respetivamente. Ou seja, há claramente um caminho a ter de ser feito para diminuir esta diferença e encurtar o caminho que nos separa dos homens nestes cargos.
E porque é que isto é importante? Em primeiro lugar para garantir que as mulheres tenham uma voz ativa na sociedade e para travar possíveis retrocessos legislativos que coloquem em causa os direitos até agora adquiridos.
Em 2022, o Supremo Tribunal do Estados Unidos da América decidiu acabar com o direito ao aborto, acabando com meio século de proteções constitucionais. Este tribunal, dominado por conservadores, passou a colocar nas mãos de cada estado a decisão sobre o corpo de cada mulher e o seu direito a interromper a gravidez. Mas o eco em Portugal não tardou, com a tentativa de se criar um sistema de avaliação médica que prejudicava os médicos cujas utentes decidiam realizar a interrupção voluntária da gravidez (IVG), por considerarem ser um erro no acompanhamento do seu planeamento familiar.
Por isso, precisamos de mulheres que lutem na sociedade e na política para não haver retrocessos e para que sejam conquistados mais direitos para garantir um caminho de igualdade.
No ano passado, em Portugal, 1400 mulheres grávidas ou a amamentar ficaram sem contrato por falta de renovação, foram dispensadas em média 3 trabalhadoras por dia nestas condições.
São estes números que mostram claramente que são as mulheres as mais penalizadas no mercado de trabalho e que têm de decidir entre o seu sustento ou adiar sucessivamente a maternidade. Quantas mulheres adiaram a maternidade para ter uma carreira ou uma situação laboral estável?
Os Açores são a região mais desigual do país e a segunda com o maior risco de pobreza. As mulheres são as que mais sofrem para sair deste ciclo. Falar em independência económica é falar em auto-motivação e capacidade de decisão sobre a sua vida. Precisamos de todos nesta luta, de homens e mulheres. Não baixem os braços e não permaneçam em silêncio.
* Enfermeira e presidente da VegAçores-Associação Vegana dos Açores.
IN "ESQUERDA" -07/04/23.
Sem comentários:
Enviar um comentário