Um recuo que
é uma derrota
Para consumo interno, foi posta a circular a tese de que Mário Centeno não desistiu da corrida ao Fundo Monetário Internacional (FMI), mas ao anunciar que se retirava da votação de ontem fez um mero "recuo estratégico". Ou seja, o Governo estaria convicto de que não seria possível obter já um consenso e, preservando o nome do ministro português do desgaste do processo de escolha, estaria a prepará-lo para um momento posterior de negociação e consensualização política.
O anúncio de Kristalina Georgieva como a senhora que se segue a Lagarde (graças ao acordo tácito que desde a criação do FMI entrega a um europeu a sua liderança) deita por terra a alegada estratégia. É inevitável admitir que Centeno antevia o cenário de uma votação pouco expressiva entre os pares, o que penalizaria a sua posição no Eurogrupo. Justificações estratégicas haverá as que o Governo quiser transmitir. Objetivamente, o atual presidente do Eurogrupo saiu derrotado numa candidatura em que assumiu ter interesse, sem sequer ter corrido o risco de ir a jogo.
Resta a António Costa um consolo. O cargo traria prestígio internacional, mas uma eventual saída de Mário Centeno seria uma das maiores perdas dos socialistas na campanha que se aproxima. Apesar das discussões sobre a elevada carga fiscal, sobre as famosas cativações e a falta de investimento público que tornam o Ronaldo das Finanças tão criticado dentro de portas, é inegável a sua imagem de seriedade, competência e credibilidade.
Depois do desastre socialista que conduziu Portugal ao resgate financeiro, o diabo anunciado pela Direita foi, afinal, substituído por contas certas. Numa altura em que o primeiro-ministro se vê minado por polémicas e casos duvidosos que suscitam tentadoras comparações com José Sócrates, ter argumentos para se distanciar do antecessor e invocar o rigor da legislatura não é coisa pouca.
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"03/08/19
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