Em defesa da estátua
Oxford, onde há uma polémica estátua de
Cecil Rhodes, é uma das melhores universidades do mundo. E gente do
mundo inteiro quer lá estudar. Mas, para o bem e para o mal, a
excelência académica conquistada em mil anos de tradição é resultado da
história da Grã-Bretanha, e essa tem tanto de construção democrática
como de afirmação imperialista. Sobre isto, sabem-no bem os mais de 50
países suas ex--colónias e, no entanto, mandam alunos para lá.
Então
porquê um movimento, organizado por estudantes da própria Oxford, para
retirar do campus a estátua de Rhodes? O argumento é que o fundador da
De Beers foi um imperialista, sem escrúpulos na hora de explorar os
africanos nas minas. Terá feito o trabalho tão bem que os contemporâneos
brancos batizaram de Rodésia dois territórios, que mal se tornaram
independentes preferiram outro nome, Zâmbia e Zimbabwe, o que faz todo o
sentido.
Mas uma coisa é derrotar os
colonizadores e tentar construir um país a partir das velhas raízes (não
esquecendo o novo legado), outra é apagar a história. Mais uma vez para
o bem e para o mal, foi gente como Rhodes que encheu o Museu Britânico,
tão admirado e visitado. Os gregos ainda hoje tentam recuperar os
frisos do Parthenon que um tal de Lord Elgin levou para Londres. E foi
também gente como Rhodes que inspirou milhares de estudantes a querer
saber mais do mundo. Mesmo depois da morte continuou a fazê-lo, graças a
uma doação que pagou já bolsas a jovens tão brilhantes como Bill
Clinton.
É sobretudo injusto avaliar
alguém do passado à luz dos valores atuais. Augusto tolerava que a
mulher envenenasse os rivais, Vasco da Gama mandava cortar narizes e
orelhas, George Washington teve escravos até ao fim da vida, o imperador
Qianlong mandou exterminar os dzungares. Deixemos a estátua de Rhodes
em paz, senão quantas estátuas teríamos de derrubar mundo fora?
Estudemos antes o que fez, como era o seu mundo, para aprendermos.
Afinal é esse espírito que é suposto Oxford promover.
Devemos
admirar quem foi contra a corrente do seu tempo, como frei Bartolomeu
de Las Casas, que denunciou a escravatura no século XVI. Os outros foram
o que foram, mas não vamos destruir o que deixaram de bom. Sabe aquelas
escolas Conde de Ferreira espalhadas por Portugal? Foram obra de um
benemérito que fez fortuna no Brasil a traficar escravos.
Significa
isto que devemos ser complacentes com os abusos do passado? Não. Há
ditadores que têm de ser julgados, estátuas questionáveis, avenidas que a
justiça e a decência obrigam a renomear. Mas para não tornar o debate
absurdo, que tal a regra dos cem anos? Rhodes morreu em 1902, deixemos a
estátua onde está e que as bolsas continuem a ser atribuídas.
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
01/02/16
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