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A questão é desde logo complexa, primeiro porque a abordagem às origens da conflitualidade é particularmente densa; e segundo, a existência de deslizes semânticos que ao relacionar o termo “resolução” com outros como a “prevenção” ou a “gestão” de conflitos, levou a que se tivesse perdido a sua especificidade operacional. Mas para facilmente percebermos como estas questões vão ganhado forma e também para fugir a fundamentações teóricas pelo que disse anteriormente em relação a alguns círculos académicos, olhemos apenas para a natureza humana. A primeira ideia é termos presente que estamos na presença de uma relação entre duas ou mais entidades, num dado contexto conjuntural complexo, que não sendo de cooperação, é seguramente de competição ou de acomodação. A outra ideia é que havendo competição, podem se gerar tensões, constatando-se assim que o fenómeno da conflitualidade pressupõe uma dinâmica evolutiva dessas tensões.
Muitas ideias, teses e pontos de vista monopolizam o espaço de opinião, na escrita, no croché televisivo, nos podcasts radiofónicos, ou nos três ao mesmo tempo, e a todo o tempo para se apurar os motivos que levam a um conflito. Sem a pretensão de esgotar esse espaço mediático, vejo o fenómeno da conflitualidade, sobretudo violenta, como resultante de uma conjugação de múltiplos fatores intimamente interligados, onde se destacam, entre outros, o acesso e controlo de recursos vitais estratégicos, a luta pelo poder, questões identitárias, dogmas religiosos extremistas, ou ainda a manutenção de um determinado “status quo”, que em regra, se intensificam na razão inversa do desenvolvimento e da prosperidade económica vivida em diversas regiões do mundo. Este é um diagnóstico que está presente em muitas abordagens ao fenómeno da conflitualidade violenta, ora de forma mais explicita, ora de forma mais dissimulada.
Um diagnóstico similar tem sido feito ao papel da ONU. Por parecer talvez evidente, não vou insistir na caracterização da racionalidade política desta Organização Internacional, até porque, seguramente carrega consigo o fardo de Atlas. Vou outrossim aqui romantizar o seu papel, porque apesar das críticas que lhe são dirigidas, continua a ser uma peça central na arquitetura da paz mundial. Ela oferece uma plataforma universal para negociações diplomáticas, provê assistência humanitária onde os Estados falham, e organiza e implementa missões no terreno associadas à prevenção de conflitos, ao “peacemaking”, “peacekeeping” e na fase de reconstrução pós-conflito, o “peacebuilding”, com o objetivo de cessar as hostilidades e levar as partes em confronto a aceitar a paz.
Infelizmente a ONU não é um Leviatã tal como Hobbes viu ser necessário existir para acabar com a conflitualidade no mundo, porque depende muito da colaboração de todos os membros permanentes do Conselho de Segurança. Temos assistido, como as disputas de poder entre esses membros podem paralisar a ação diplomática da organização, como quando há veto a resoluções, como ocorreu em questões relacionadas à Ucrânia, com a Rússia a vetar sanções e medidas da ONU, ou os EUA em relação ao papel de Israel na Faixa de Gaza.
Deve, por fim, notar-se, que os conflitos que proliferam regionalmente no mundo, não apresentam uma nova geografia, mas movem-se por uma geopolítica e geoestratégia inovadora, que lhe conferem características próprias de intensidade e prevalência, alterando consequentemente a forma de encarar a sua abordagem.
* Doutorado em Relações Internacionais com especialização em Política Internacional e Resolução de Conflitos.
IN "NOVO" - 20/10/24..
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