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O Banco Central Europeu (BCE) subiu as suas taxas de juro para o maior valor da história da zona euro, sabendo que a recessão na Europa pode estar ao virar da esquina. É caso para perguntar: que contas faz o BCE?
Portugal não será a única economia da zona euro onde as famílias, tendo perdido poder de compra, estão ainda a braços com a subida dos juros dos empréstimos à habitação. As empresas portuguesas não serão também inimitáveis por financiarem a sua atividade corrente através de crédito, agora mais caro.
É claro que o BCE considera que a inflação na zona euro, que rondava os 10,6% antes das primeiras intervenções de política monetária, tem respondido lentamente às suas investidas, ficando os 5,3% de agosto muito para além dos ainda almejados 2%. Só que a cada subida das taxas de juro, as suas previsões de crescimento são revistas em baixa, tendo as últimas ficado situado em 0,7% para 2023 e em 1% para 2024.
Para Christine Lagarde esta é, no entanto, apenas uma desaceleração temporária da economia da zona euro – resultará a sua leitura dos valores estáveis do desemprego? – e insiste mesmo com os governos para que retirem os seus apoios diretos às famílias.
E sabe que a subida do preço do petróleo que se verifica desde junho, a expansão da procura por esta matéria-prima e o anúncio pela Arábia Saudita e pela Rússia que irão prolongar os seus cortes de produção, fazem adivinhar novas surpresas para a inflação. Lagarde pode receá-las, mas também antevê que a sua política será impotente para contrariar estes movimentos. E, entretanto, o euro desvalorizou em relação ao dólar, contrariando as suas expectativas relativamente aos efeitos da subida da taxa de juro.
Mas as ameaças ao desempenho da economia europeia não se esgotam aqui. Se a desaceleração económica da China deve atormentar a economia alemã, onde a indústria não tem andado particularmente famosa, a competitividade chinesa é que parece ser o derradeiro desafio europeu. No seu discurso sobre o Estado da União Europeia, Ursula von der Leyen referiu-se a mercados globais inundados por veículos elétricos chineses e prometeu investigar práticas de comércio desleais por parte deste país, procurando desmascarar possíveis subsídios estatais à produção.
Enquanto este furacão assola a Europa, o sector bancário mantém-se invariavelmente silencioso. Provavelmente porque a taxa de depósito que é paga sobre os depósitos dos bancos comerciais, que agora subiu de 3,75% para 4%, há pouco mais de um ano apresentava um valor negativo de -0,5%. Afinal o BCE faz bem as suas contas, sofre apenas de uma velha miopia.
* Economista, Professora do ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa
IN "O JORNAL ECONÓMICO" - 22/09/23.
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