Caça aos gambozinos (ou seja,
onde está o raio do Pokémon?!)
Caça aos gambozinos figura como uma expressão altamente atrativa
quando se deseja que alguém, chato até ao tutano, vá passear. Para
longe, preferencialmente. Sobretudo agora que o verão se instalou quente
e de céu taciturno, e para aqueles como eu que ainda não alcançaram o
momento de férias e se sentem atropelados pelo cansaço, a falta de
elasticidade na paciência torna-se comum e sabe tão bem dizer ao pessoal
que tem o nariz demasiado comprido o seguinte: Olha, vai apanhar
gambozinos, pá.
Sabe bem, ou não?
Mas o que é caçar gambozinos? O que são gambozinos? Compra-se cá
disso? Há época de caça estabelecida? O que é?? Vou-vos dizer: não é
nada que detenha existência para além do enunciado. Não, não existe. É
apenas uma figura imaginária inseparável da noção da frase, por que não
existindo semelhante espécie, enviar alguém numa demanda dessas é coisa
para demorar uns bons anos. Que maravilha.
Todavia, parece que o figurativo se tornou real, qual esquizofrenia
social estamos nós a atravessar. Pois então mandar assim alguém para tão
longe à procura de um ser possivelmente mais difícil de encontrar que o
abominável homem das neves é um ato ameaçado… O pessoal anda todo aí de
telemóvel em punho sedento pela captura de seres invisíveis, como o
gambozino inocente que nem existia. Quem são? São os pokémons. É a
loucura, eles dizem que viram um, viram dois!, e ali à frente estavam
cinco!, há ainda zonas ricas em concentração de pokémons, é
impressionante!, embora nunca ninguém os verdadeiramente veja fora dos
ecrãs da aplicação. São como os fantasmas, há pessoas a insistir que lá
estão e que os viram e que arranjaram um qualquer dispositivo manhoso
para os detetar, no entanto na crua realidade não está lá nada.
Ao menos a premissa deste jogo está esclarecida desde o início, sem
dissimulações nem subterfúgios. É uma brincadeira, diverte quem
participa e todos estão claramente conscientes da verdade. É uma loucura
sincera. Não dá jeito para mandar alguém para longe sonhava de início,
numa de: Vai apanhar pokémons, ó…; pois dada a invasão prolífica das
criaturas, o afastamento do chato não vai propiciar um alívio assim tão
acentuado, ou duradouro. Por outro lado, é isenta de – por exemplo -
promessas e campanhas vazias tão apelativas à compaixão de quem não se
sabe ser verdadeiramente capaz dela, está livre de previsões místicas
vãs e infundadas, ou tratamentos aguados (pouco) alternativos sem teor
algum de veracidade. Face a isto, é bastante mais agradável apanhar
pokémons ou gambozinos- existam ou não - e deixar para trás o que
efetivamente não interessa.
IN "AÇORIANO ORIENTAL"
02/08/16
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