22/02/2019

MÁRIO RAMIRES

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 O PS está a encostar-se 
perigosamente

O rei, se não vai nu e ainda não está de tanga, já pelo menos deixou cair o manto

Para um ‘otimista irritante’, dizer que a maioria absoluta ‘é virtualmente impossível’ quando ainda faltam oito meses para as eleições e a oposição não dá sinais de conseguir afirmar-se como alternativa não é propriamente o mais coerente.

António Costa disse-o na sua última entrevista (à SIC), sem qualquer engulho ou sequer espécie de incómodo.

Na verdade, o que António Costa é mesmo é pragmático. E batido. Muito batido.

Costa chegou a meio da legislatura com o BE, o PCP e as centrais sindicais no bolso e, com o PSD enredado nos seus próprios problemas de liderança, a maioria absoluta começou a surgir como possível no horizonte dos socialistas.

Mesmo com a tragédia dos incêndios de junho e de outubro de 2017 e com o escandaloso assalto de Tancos.

Mas muito mais do que com as falhas graves do Estado nas suas funções mais primárias - seja na proteção da vida dos seus cidadãos, seja em matéria de segurança nacional -, Costa perdeu a ilusão da maioria absoluta na segunda metade da legislatura e, particularmente, nos últimos meses.
Porque os portugueses acreditaram nele e na ‘geringonça’ e nas promessas reiteradas do fim da austeridade e de que, aos poucos, porque obviamente não poderia ser tudo de uma vez, recuperariam rendimentos e poder de compra.

Fala-se agora na frustração  das expectativas dos professores, dos enfermeiros, dos funcionários públicos, dos bombeiros, dos magistrados, de uma lista infindável de eleitores naturalmente insatisfeitos por estar a chegar ao fim a legislatura da ‘geringonça’ sem que os efeitos do fim da austeridade se reflitam de facto (isto é, direta e indiretamente) no bolso de quem mais se sacrificou.
Se alguém recuperou alguma coisa - utilizando uma célebre expressão de Costa - foi demasiado poucochinho.

Ora, as condições favoráveis da economia internacional, e europeia, e do próprio desempenho nacional em termos de contas públicas - que, por exemplo, beneficia hoje de taxas de juros na emissão de dívida com mínimos históricos - não deveriam ter permitido que, em 2018, os portugueses tivessem perdido poder de compra e baixado a produtividade. Que, por incrível que pareça, perderam.

E isso paga-se.

Costa e Centeno, com uma habilidade de se lhes tirar o chapéu, já encontraram solução para chegar a setembro de 2019 (mês de campanha eleitoral para as legislativas) com o trunfo de ter invertido este indicador: o poder de compra mede-se pelos bens essenciais num cabaz em que o preço dos transportes é significativo - e a baixa do custo do passe social (que afeta, naturalmente, as grandes áreas de concentração da população) deverá ser bastante para que, chegados a setembro, os números do poder de compra em Portugal, quase que por magia, sejam dos que mais sobem na Europa.

Malabarismo. Puro malabarismo.

Tanto como dizer que estamos a convergir com a Europa. Não estamos. Estamos a perder cada vez mais terreno para os países da nossa dimensão e a crescer menos do que a esmagadora maioria dos países da UE. Isso é factual. Como factual é o ordenado mínimo na nossa vizinha Espanha (900 euros) estar já 50% acima do nosso salário mínimo nacional (600 euros) - quando, por exemplo, do Luxemburgo já vai nos 2500 euros.

Pois é. Apesar do discurso e de continuarmos ‘bons e bem comportados alunos’, a verdade é que estamos cada vez mais na cauda da Europa.

E isso sente-se e é difícil de escamotear. Como é difícil continuar a esconder que os problemas estão longe de ter solução.

António Costa pode tentar disfarçar e contar com a sempre preciosa ajuda do Presidente Marcelo - esse, sim, cada mais otimista, tanto que perante o abrandamento da economia se apressou a dizer que até nem foi mau, porque ele esperava que fosse pior (e isto não é conversa de pessimista).

Mas as promessas incumpridas - ou, se se preferir, as expectativas goradas - e casos como a falta de medicamentos nas farmácias e as ameaças à ADSE (sistema de saúde que chega a ser mais caro para muitos funcionários públicos do que um seguro privado) já são indisfarçáveis.

Ora, é neste cenário - ainda de confiança face ao estado da oposição, mas sem ilusões quanto à impossibilidade de maioria absoluta - que os socialistas reúnem hoje em Convenção Nacional e em secretariado convocado à sorrelfa para aprovar a lista às europeias e a estratégia para o ciclo eleitoral que se avizinha.

E a verdade é que a lista do PS ao Parlamento Europeu é muito fraquinha.

A promoção de Pedro Nuno Santos a ministro pode dar uma certa ideia de compensação entre as hostes socialistas, mas é muito pouco para ninguém no PS ousar levantar a garimpa e dizer que o rei, se não vai nu e ainda não está de tanga, já, pelo menos, deixou cair o manto.

O PS está a encostar-se ao relativo sucesso de uma ‘geringonça’ que, embora tendo sobrevivido a uma legislatura e tendo chegado a dar ideia de solidez, não deixou de ser ‘geringonça’.

E acreditar que a oposição não chega lá por falta ou debilidade de liderança pode ser um erro fatal: o poder, mais do que conquistar-se, perde-se. Não sendo em 2019, pode, desde já, sem maioria absoluta, ficar definitivamente fragilizado.

IN "SOL"
16/02/19

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